sábado, 25 de dezembro de 2021

NATAL 2021 - DE NOVO O CONVÍVIO CERCEADO

Este é o 2º Natal que vivemos de convívio restrito e resumido ao resguardo do lar de cada um por via desta terrível pandemia Covid 19 que teima em nos incomodar e que, alastrada por todo o globo terrestre, traz doença, sofrimento e morte.

Foi mais uma quadra natalícia em que cada um viveu no recato de suas casas e onde naturalmente eu e minha família mais chegada nos incluímos. 

Longe vão os tempos das grandes reuniões e convívios familiares quando nos juntávamos em vasto número com avós, pais, filhos e netos, num fraterno e amigo ambiente…


Hoje, novamente e pelo 2º ano, aqui ficamos por casa resumidos a 3 elementos e se isso já foi triste, mais triste ainda se nos apresentam os tempos futuros dado que não se vê, nem de perto, nem de longe, o término desta malfadada epidemia.

Ainda assim e como é de tradição fizemos os doces, os fritos, o bacalhau na Consoada e o Cabrito no Almoço de Natal e, também e para finalizar, como é nosso hábito, ao jantar degustamos a Açorda, dos restos do pão, das couves e do bacalhau. 

Esta Açorda, cuja foto do tachinho de hoje ao jantar aí fica, é um hábito que vem desde os tempos de minha sogra na Beira Alta e cai sempre muitíssimo bem. Saborosa e desenjoativa a Açorda de pão, couves e bacalhau, é sempre uma maravilha!

E pronto, agora resta esperar pelo fim destes tempos complicados e demasiado difíceis que atravessamos mas que temo demorem muito, muito tempo a ver o seu término. 

A não ser, segundo o meu modestíssimo ponto de vista, que os grandes dirigentes mundiais se consciencializem que o fim da pandemia só será possível acontecer, em tempo ainda que demorado, quando se tornar obrigatória a nível mundial a vacinação nos países ditos modernos e, não olhando a despesas, se vacine todo o continente africano, de norte a sul, fazendo igual tratamento nos países pobres da América Latina e do Oriente.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

17 DE DEZEMBRO DE 1969 - ÚNICO E INOLVIDÁVEL!


Penso que os homens, tal como as nações que, afinal, são constituídas por homens, durante as suas vidas e a sua história, vivem e muito bem comemorando datas marcantes da sua existência mas, em contrapartida, olvidam outras ou, se quisermos melhor, deixam esquecidas no tempo datas porventura não tão importantes mas ainda assim bem relevantes de suas vidas.

E, assim, se na realidade do caso das nações temos por exemplo o esquecimento a que foi votada em Portugal a data de 25 de Novembro de 1975 que, depois da desordem e bagunça no percurso verificado entre o 25 de Abril de 1974 e essa data fez recolher os militares aos quartéis, evitando uma provável guerra civil e colocou o país nos carris da democracia, também eu, pessoalmente, embora sempre todos os anos lembre quão importante foi na minha vida o dia já tão distante de 17 de Dezembro de 1969, a verdade é que não o comemoro minimamente que seja.


Nessa muito importante data, vindo de Angola, após 26 meses de dura e temível guerra que, somados a mais ano e meio de serviço militar obrigatório antes da mobilização dá um total de quase 4 anos roubados à mocidade de um pacato e inofensivo rapaz de vinte anos de idade, desembarquei no Cais da Rocha, em Lisboa e vi-me livre para todo o sempre das fardas, da disciplina e ordem militares, dos temores da guerra e das mil privações resultante duma agressiva e mortífera guerra subversiva em terras e ambientes estranhos e hostis, quando não fatais.

Ver-me livre de tudo aquilo, já o escrevi mais vezes, constituiu para mim o dia mais feliz da minha vida! E já casei, fui pai e avô!… Tudo datas muitíssimo importantes e felizes mas, como a daquele dia, em que pus pé em terra e vi-me livre daquele imenso inferno, não conseguiram ser mais.

E, se este facto já seria sobejamente importante para assim considerar esse desembarque e esse dia, quis as circunstâncias da vida que ao desembarque ainda se associasse ocorrência igualmente da maior relevância na minha vida e que foi o dia do conhecimento pessoal daquela que viria a ser a minha fiel e dedicada esposa, a mãe de meus filhos e a companheira para os restantes dias da minha vida!

Julgo que é uma história interessante, curiosa, bonita mesmo e bem verdadeira que aqui deixo, narrada para o fim dos tempos:
Na guerra, no distante e inóspito leste angolano, a milhares de kms de Portugal e quase sem comunicações (as cartas demoravam vários dias e até semanas a chegar) e após o término de um namoro na então chamada Metrópole, este jovem rapazinho pensou em arranjar uma “Madrinha de Guerra”. (Assim eram tituladas as moças que ficavam em Portugal e que pelos mais diversos motivos aceitavam trocar correspondência com os militares em combate nas diversas frentes de guerra africana.)

Em conversa com um soldado foi-me dado o endereço de uma jovem da sua aldeia que, segundo ele, tinha feito alguns estudos secundários e seria suposto estar indicada para comigo travarmos correspondência e debatermos ideias.

Chamava-se Rosa e, como ele e a grande maioria dos soldados que me acompanhavam, vivia numa pequena aldeia no nosso Minho. Trocamos meia dúzia de cartas mas, coitada, a pequena era muito limitada em português tendo por isso alguma dificuldade de expressão e, por via disso, tinha muito poucas ideias e argumentação… “No domingo fui a Braga à festa, que estava muito animada”; “No sábado fui à feira em Barcelos, que estava muito boa”. E abordar ou discutir para além disso: zero.

Nem me recordo como e quem terminou as correspondências… Não obstante a simpatia da moça, não dava...

É então que, no decorrer de uma das diversas conversas de camarata em grupo de furriéis, com brincadeiras e piadas que toda a rapaziada nova sempre usava, eu pergunto a um deles, totalmente na brincadeira, se não tinha nenhuma irmã que eventualmente quisesse ser minha “madrinha de guerra” e tive como resposta:
- Por acaso até tenho.
- E estudou, claro…
- Sim. Tem o 5º ano.
- Ó pá, escreve-lhe a perguntar se me podes dar o seu endereço, pode ser?

E foi a partir daí que, desde a 1ª troca de correspondência, tudo foi acontecendo muito naturalmente. Extensas cartas de parte a parte; muitos debates de ideias; muitos pontos em comum; trocas de fotografias; a aproximação sentimental em aumento progressivo e… o namoro iniciou-se. Naturalmente ele surgiu...

Decorrido ano e meio faltava então o conhecimento pessoal que aconteceu no dia do desembarque e essa situação também regista um episódio bem curioso: No barco, em alto-mar, recebi um telegrama da também ansiosa namorada que me informava: ”Meu dístico será balão.” e, eu, ia todo feliz pensando que seria fácil localizá-la.

Bem me enganei!... Eram às centenas os balões exibidos pelos milhares de pessoas que aguardavam no terraço do edifício e no piso térreo do cais o desembarque dos militares. Brancos, amarelos, vermelhos, azuis, verdes, etc todos de igual formato redondo tradicional dos balões e, aí, este ansioso rapaz ficou às aranhas sem saber onde encontrar a sua amada…

Resolvi então procurar o dístico previamente acordado com meu pai com a palavra “Chouto”, nome da minha aldeia e que indicava a localização da família e amigos e, é bem reparando que vejo, ali pertinho deles, um balão diferente de todos os outros… Não era redondo, não. Era comprido, verde e em formato de… lagarta!…

Só podia ser a minha apaixonada, não tinha dúvidas e não mais tirei os olhos daquela lagarta e daquela imagem que ainda hoje guardo bem viva na memória! (Pena sinto que, talvez como consequência das emoções na hora sentidas, não tenha clicado bem as fotos que aqui deixo mas que, mesmo assim, apesar de tão má qualidade, merecem ficar para a minha história de vida.)

E, depois, foi o que se imagina,,, A felicidade imensa e inenarrável de, livre pisar terra firme e ao fim de mais de 2 anos de sofrimentos, incertezas, receios e medos, abraçar e beijar os que me eram queridos e os amigos que marcaram presença no cais, foi inimaginável!

E, assim, pelos factos narrados, dá para avaliar a enorme importância na minha vida do dia 17 de Dezembro de 1969.

Uma data que, reconheço, deveria celebrar condignamente todos os anos mas que, vá lá saber porquê, ficou esquecida no tempo, sendo verdade que anualmente bem a recordo ainda que não a festeje publicamente. Porquê? Nem sei explicar.
Mas foi um dia único! Um dia inolvidável! Um dia que jamais se repetirá!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

A V "RECAUCHUTAGEM" E OS AVANÇOS DA MEDICINA

Nestas minhas crónicas ao longo dos tempos, relativamente aos tratamentos ao doente fígado de que tenho beneficiado, tenho vindo aqui a salientar o quanto verifico os avanços da ciência e, neste caso da medicina, de tal forma me tenho admirado com os métodos e eficiência desses modernos procedimentos.

Foi assim com a Laparoscopia e as Quimioembolizações e foi agora com a Alcoolização, método que, como os outros me admirou sobremaneira.

Foi seu executante um jovem médico de 33 anos, cujo nome não divulgo por motivos óbvios, muito dialogante e simpático e que, antes e na hora, teve a amabilidade de elucidar-me sobre o método e a forma com iria ser processado.


Assim, enquanto a Quimioembolização consiste em depositar no tumor a químio necessária e que é levada até lá por um finíssimo cateter introduzido na virilha na artéria adequada, a Alcoolização é feita com mais precisão com uma fina e comprida agulha entrada na pele abaixo das costelas e que vai direitinha ao tumor onde deposita álcool para a sua queima e consequente eliminação.

Informou-me antes do procedimento o jovem doutor que só sentiria uma leve dor na picada da agulha e sua introdução levando ali a necessária anestesia local e que, depois, para a deposição do álcool, porque então aí uma acão bem mais dolorosa, “pomo-lo a dormir”, no dizer das suas amáveis palavras.

E foi exactamente o que aconteceu: no procedimento mais doloroso fui sedado por alguns minutos, nada senti e, quando o efeito da sedação se foi, da mesma forma nada senti, de tal forma que, passadas 24 horas, saía do hospital pelo meu pé e retornaria à minha residência. 

Considero um espanto estes métodos de tratamento de maleitas tão graves e penso que se os nossas antepassados, que já cá não estão, vissem a evolução da ciência e da medicina, custar-lhes-ia acreditar com tal foi possível em tão curto espaço de tempo.

Um doente entrar num hospital para sofrer a eliminação de um tumor no fígado, num procedimento que não levou uma hora, ter 22 horas de repouso e sair, pelo seu pé, sem dores, 46 horas passadas de transpor a porta de entrada, acho que é motivo de pasmo, de regozijo e agradecimento muito grande aos homens e mulheres – eles sim, doutores, como tenho escrito – que queimaram horas e horas, dias e noites de estudos e experiências para que outros homens vivam cada vez com mais saúde, melhor bem-estar e, sobretudo, mais anos de vida.

Bem-hajam!

Bem-hajam os senhores doutores que nos curam e nos salvam!


NOTA FINAL – Ao contrário de alguns que dizem mal do SNS, este escriba, como já o fez anteriormente, continua a não ter razão de queixa (e pelo que vê e ouve à sua volta nos internamentos, outros assim também pensam) e, dos médicos à enfermagem (que se farta de trabalhar!) e até aos Auxiliares todos são incansáveis, atenciosos e educados! Na foto uma simpática Auxiliar de Enfermagem que me acompanhou até à porta de saída do Hospital Curry Cabral (Lisboa) onde fui, mais uma vez bem, muito bem cuidado.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

A V "RECAUCHUTAGEM" ESTÁ AÍ!


 E, com esta, que terá início com o internamento amanhã e a Alcoolização no dia seguinte (15), serão 5 as intervenções nesta doentinha “pecinha das iscas” que teima em fazer crescer “brincos” que os senhores doutores vão, com a ajuda da ciência, por enquanto eliminando.

Primeiro 1 Laparoscopia, depois 3 Quimioembolizações e, desta vez, será a Alcoolização.

Com, umas menos, outras mais dolorosas, lá vou percorrendo o difícil caminho que, no dizer do meu médico assistente, assim continuará em bem enquanto houver tratamento porque, quando algo surgir em que falte a cura…

Acaba-se a “licença” e, era uma vez…

Mas, ainda que disso convencido e preparado, há que andar em frente, utilizando a ciência e o saber dos homens para, como bastas vezes se dizia na minha juventude na minha terra, “acordar todos os dias com os dedos dos pés a mexer...”


quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

VIVER (MUITO) POBRE

Penso que vermos uma imagem, como a que retirei da net, de alguém desconhecido
mas que nos mostra ser uma mulher carregando para casa um braçado de lenha seca, podendo parecer algo estranho para os citadinos jovens de hoje, ela não é de todo minimamente invulgar para quem, como eu, nasceu e cresceu numa aldeia.

Na verdade, em tempos que não distam dos actuais tanto quanto isso, nas aldeias de Portugal era vulgar, familiar, assistirmos a pessoas que faziam fogueiras nas lareiras de suas casas para seu aquecimento e confecção dos alimentos, em muitos casos porque havia que poupar no gasto do petróleo do velho e rudimentar fogareiro e tanto mais que o moderno gaz em garrafa ainda não havia chegado.

Falo do que bem me recordo, nos mais recuados anos da minha infância e juventude nas décadas de 40 a 70 do século passado na minha aldeia Natal, pequena e pobre, ali no extremo da fronteira sul do Ribatejo com o Alentejo.

O Chouto (Chamusca), encravado no meio de grandes propriedades agrícolas e onde a quase totalidade dos seus habitantes não possuía um metro quadrado de terreno, médio ou pequeno que fosse, que pudesse cultivar e daí retirar alguns bens para ajuda da alimentação, vivia quase exclusivamente da agricultura latifundiária e, para além dos que conseguiam um serviço permanente nas grandes propriedades, onde usufruíam duma escassa remuneração mas, ainda assim, garantida semanal ou mensalmente, beneficiavam todavia de casa gratuita e de um espaço para horta onde cultivavam muitos alimentos para seu consumo.

Mas, e os outros? Os que não tinham trabalho certo viviam da pobre e curta jorna em oferta e procura para pequenos trabalhos em quintais, hortas, searas, etc, feita nas tardes de domingos nas tabernas da aldeia onde eram procurados. Era aí a chamada "Praça da Jorna" da minha terra.

Acontecia por isso que, como algumas poucas excepções de comerciantes e pequenas profissões (pedreiros, carpinteiros, alfaiates, sapateiros) todas as casas da restante população eram realmente muito pobres, frias, inóspitas e de fraquíssimas condições de habitabilidade.

Lembro-me de muitas casas de telha vã, com cortinas em vez de portas interiores, janelas exteriores de taipais de madeira sem vidros e, até uma ou outra, bem me recordo, de piso em… terra batida, que o escasso dinheirito não chegava para adquirir cimento para as cimentar.

Ainda relacionado com a habitação e pensando naquela que os trabalhadores tinham nas grandes propriedades e, sendo verdade que a maioria dos lavradores a forneciam gratuitamente, numa reportagem que fiz para o “Jornal da Chamusca”, em 1973, encontrei e por incrível que pareça, uma triste realidade: o trabalhador, não obstante o parco salário e géneros (mantas anuais e cereais), construía ou mandava construir a casa e, se deixasse a propriedade, a casa era do patrão…

Por tudo isto, nessas recuadas épocas, vivia-se pobre, muito pobremente e tínhamos muitas crianças que andavam descalças pelas ruas térreas e empedradas, usavam velhas calcitas remendadas várias vezes e já herdadas de irmãos mais velhos e que, descalças, iam para a escola, algumas percorrendo assim, de Verão e de Inverno, sem calçado, largas distâncias desde as suas residências em povoados em redor da aldeia até à escola primária e, de certo, quantas e quantas vezes de estômagos vazios.

Recordo-me ainda que, na década de 50, a Cáritas Portuguesa (penso que o fez directamente, a Cáritas, porque não estou a imaginar Salazar e o seu governo, com a sua política autoritária, sobranceira e de isolamento mundial, tomar essa iniciativa...) conseguiu junto dos EUA umas grandes e importantes ofertas de muitas toneladas de leite em pó e queijo enlatados para ajudar a matar a fome dos portugueses. A Cáritas, como organização de cariz religioso, entregou às dioceses católicas a missão da sua distribuição que, por sua vez a passaram para os párocos e, estes, nas localidades onde não residiam e porque melhores conhecedores da pobreza nas suas terras, a cidadãos dessas terras. Na minha aldeia e porque bem conhecedor da realidade local, foi solicitado a meu pai que o fizesse e bem me recordo de situações de pobreza que meu pai nos contava à mesa e dos problemas de consciência que sentia para o fazer equitativamente não querendo ser injusto para quem quer que fosse, beneficiando alguém num eventual prejuízo de um seu vizinho. Era muito difícil não surgir um ou outro reparo e bem me recordo como o meu saudoso progenitor se sentia penalizado quando lhe soava que tinha oferecido a A mais um pedaço de queijo do que a B, mais uns gramas de leite a um que a outro.

Mas, tão bem quando foi possível, tudo foi distribuído várias vezes durante uns anitos (numa das vezes, para maior auxílio, chegaram também roupas ainda em excelente estado, ou até mesmo sem qualquer uso detectável) e não tenho dúvida que muitas crianças e adultos beneficiaram dessa graciosa alimentação e a todos ajudou a crescer, a viver e a minorar o seu  sofrimento do dia a dia. Sim, porque a quem vive e sobrevive do quase nada, quem nada tem para pôr na mesa na hora de alimentar os filhos, tudo o que lhe vem, escasso que seja, sempre é bem-vindo e sabe-se lá com que gratidão é recebido...

Enfim, a crónica já vai longa mas achei-a necessária para registar para a posteridade as dificuldades económicas vividas e sentidas por larguíssima percentagem da população portuguesa, aqui com a minha terra em particular, sobretudo naqueles recuados anos do pós-guerra e seguintes, quando a recuperação industrial, comercial, económica e financeira acontecia aceleradamente por toda a Europa mas onde em Portugal tal não sucedia em virtude da opção neutral e isolacionista de Salazar que nos livrou de muitas mortes na guerra, consoladora realidade, mas onde igual recuperação infelizmente não aconteceu por via da sua política de “orgulhosamente sós”...