quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

MEMÓRIAS...


Embora assente em cartas da época, como esta datada de 14 de Junho de 1958 que aqui junto e outras que escrevi nos anos de estudo em Lisboa e que dirigia a meu pai e ele guardou e eu preservei também e que me ajudaram a localizar no tempo todo aquele período, o meu escrito de hoje é baseado muito nas minhas memórias dado que o episódio que esteve na origem do rompimento das relações entre a família dos meus padrinhos e a minha, pela sua importância e pela dor provocada, isso bem justifica.

É necessário frisar desde já que o relacionamento entre as famílias era excelente até aí, bastando para isso salientar que os meus padrinhos antes de o serem já tinham sido padrinhos de casamento do meu pai e que eu estava a convite deles hospedado na sua casa e convivendo diariamente como se seu filho fosse, não esquecendo ainda que bastas vezes em fins-de-semana e sobretudo férias de Verão os convívios entre todos eram frequentes e meus padrinhos e filhos adoravam estar no Chouto. Ficaram famosas as vivências das meninas, jovens e bonitas adolescentes Teresa e Gaby, de calções pelo Chouto – um Chouto na época, sem televisão, jornais e fracas comunicações e por isso muito desfasado das “modernices” da capital… - ou tomando banho, mergulhando e nadando num tanque de água de regas no Anafe do Meio, do sr. Estêvão Maia! Para as pessoas de mais idade na aldeia aquilo era uma tontice de gente claramente sem maneiras… Junto aqui uma foto dos dois talvez junto do dito tanque de água onde as meninas se banhavam.

Vivia-se portanto este delicioso ambiente quando, subitamente, uma insólita e aparentemente inofensiva ocorrência tudo perturbou e tudo alterou... Radicalmente.

O facto aconteceu sensivelmente entre os dias 6 e 11/12 de Junho de 1958. Nesse intervalo de tempo, uma coisinha aparentemente sem importância, veio alterar toda a minha vida de estudante…

Morávamos no Bairro do Restelo, na Rua Soldados da India, exactamente a última rua do bairro encostada a Algés e frequentávamos o Liceu de Oeiras. O trajecto diário era feito por comboio desde a estação de Algés e, até lá, íamos a pé, de casa, num percurso de 5 a 10 minutos. Para encurtar caminho atravessávamos por um estreito carreiro um terreno baldio que estava sempre cheio de ervas e sobretudo cardos muito altos, daqueles que dão como flor as conhecidas alcachofras. Era essa “cultura” exactamente que ali tínhamos naquele inicio de Verão e últimos dias de aulas do ano lectivo. Logo de seguida eu iria de férias para o Chouto e, foi lá, a 14, que recebi a carta do Tó que junto aí e que me dava conta das notas e onde o rapazinho tem o cuidado de “gritar”, provocador, antes de as notas escrever: “As tuas notas são piores do que as minhas”… eh!eh!

Mas, voltemos à “istória”: Atravessávamos nós - eu e o Tó - o carreiro quando, subitamente, reparamos que do meio dos cardos e sob o efeito dos raios solares, vinha um reflexo de qualquer coisa brilhante… Curiosos, embora picando-nos com os bicos dos cardos, fomos ver… E que encontramos? Encontramos dois grandes, cromados e luzidios faróis de automóvel, daqueles que são fixados exteriormente encima do para-choques ou até mesmo dos guarda-lamas dianteiros. Via-se que tinham sido serrados pelo seu pé…

Estávamos com pressa para apanhar o comboio e já não voltamos a casa para ali os guardar… Logo a seguir tinha o começo da Av. Vasco da Gama e, no 1º prédio, tínhamos a mercearia onde a minha madrinha era cliente e por isso o merceeiro conhecia-nos e foi a ele que pedimos se nos guardava o achado até regressarmos. O senhor acedeu e, na volta ali levantamos os faróis pondo em marcha o nosso plano… Atravessamos a avenida e no outro lado, um pouco mais acima, tínhamos uma oficina auto. Foi aí que nos dirigimos perguntando ao mecânico se queria comprar os faróis…

Não me lembro, não sei, não vi mais nada e só me lembro que demos por nós detidos na esquadra da polícia de Pedrouços... Lembro-me de uma pequena sala de velhas paredes, no 1º andar, de soalho muito velho e esburacado e com uma janela pequena de grades exteriores. Coisa horrível! Estávamos assim... detidos! Presos como ladrões ou, no mínimo, suspeitos de termos cerrado e roubado os faróis! Nós, crianças de 13 e 12 anos e meio, de calçõeszinhos de ir ao colégio, de aspecto de meninos de coro, estávamos encarcerados que nem gatunos!...

Dissemos quem eramos e, passadas uma ou duas horas, lá apareceram os meus padrinhos que acabaram por levar para casa o filho Tó e o afilhado Victor, envergonhados e sem saber onde se meterem… Ralharam-nos muito mas não bateram. Na verdade tínhamos actuado um bocadinho mal mas jamais suspeitávamos na encrenca em que nos estávamos a meter…

Logo, logo de seguida - um/dois dias – acabaram as aulas e eu fui de férias para a aldeia e, lá chegado, bem-disposto porque sabia pelos "pontos" feitos que tinha passado de ano e, sem querer estragar a festa e, talvez e principalmente, com receio que o meu pai me chegasse a "roupa ao pelo”, resolvi nada contar ao meu pai sobre essa vergonha porque passara e deixei correr os dias… Foi esse mais um erro meu…

Passadas umas boas semanas, bem mais de um mês, recebe o meu pai uma carta do padrinho Cerqueira muito, muito dura. Talvez mesmo violenta!... Li a carta depois várias vezes porque o meu pai, além de ma ter lido, tinha-a numa gaveta da secretária e ainda hoje me interrogo como raio o meu padrinho, sendo uma pessoa tão cortês, afável e ponderada, antes de escrever aquela carta tão dura ao afilhado Zé, não pensou, num só momento sequer que ele poderia desconhecer totalmente aquela “istória”… Contava ele que tinha sido incomodado sobremaneira com aquilo, tinha sido chamado à Judiciária umas quantas vezes e tinha-se visto em sérias dificuldades para conseguir que o processo fosse arquivado. Mas, finalmente, já estava arquivado naquela data!...Contava isso e mostrava-se muito incomodado pelo afilhado não se ter minimamente preocupado com aquela actuação do filho que tantos dissabores lhe causara. Estava verdadeiramente surpreendido e ofendido com o afilhado e compadre Zé!...

Como é bom de ver o meu pai ficou muito melindrado com as palavras do padrinho, deu-me um raspanete dos valentes e, logo de seguida, decidiu que eu não voltaria mais para Lisboa para casa dos padrinhos e disso mesmo deu conta ao padrinho Cerqueira em carta que lhe escreveu e que, certamente, também não terá sido nada meiga…

Não tenho a absoluta certeza das fazes seguintes mas julgo que logo de seguida o meu padrinho se retratou e terá apresentado as suas desculpas pedindo que não cumprisse o que dissera e deixasse o Victor voltar em Outubro. A madrinha Ricardina entrou também no processo mas o meu pai não recuou minimamente na decisão. Não era pessoa para isso. Quando resolvia cortar, cortava e não recuava. Era assim a sua maneira de ser e, com esta atitude, não recuando, acabou por deixar também o padrinho ofendido, no que se compreende perfeitamente. Ele, que pedia desculpa pelas palavras menos pensadas, entendia que o afilhado bem podia reconsiderar e deixar voltar tudo ao ponto de partida... Tinha também a sua razão mas... o afilhado Zé era e foi sempre assim. Estava decidido, estava decidido!

Foi então assim, sem um corte de relações oficiais, mas efectivas, dado que não mais voltaram a contactar-se mutuamente, que o relacionamento terminou entre eles.

Digo entretanto e em abono da verdade que jamais o meu pai me impediu de contactar com os padrinhos e, antes, devo confessar por ser verdade, sempre me pressionou nesse contacto tanto mais que o padrinho começou a ficar muito doente, numa doença que cinco anos depois acabaria por o vitimar. Trocávamos alguma correspondência, nomeadamente por alturas das festas pascais e natalícias e lembro-me mesmo muito bem da ocasião em que o visitei em casa, com ele já acamado e muito doente, que fiz isso por sugestão do meu pai…

Lembro-me que aconteceu em Agosto de 1963 quando se realizou em Lisboa, no Terreiro do Paço, uma grande manifestação nacional de apoio a Salazar e à sua política ultramarina, como então se dizia. Foram para Lisboa autocarros de todo o país cheios de gente e do Chouto também isso aconteceu e o meu pai sugeriu que eu aproveitasse, que não pagava nada e ia e vinha no mesmo dia e em vez de ir à manifestação ia visitar o padrinho a casa. Foi o que fiz e foi a última vez que o vi com vida… No mês seguinte (Setembro) morreria. Estive então toda a noite no velório no Mosteiro dos Jerónimos e depois no funeral para o cemitério do Lumiar, com a bandeira do Sporting a cobrir a urna e um grande acompanhamento, nomeadamente com muita gente do clube.

Assim desapareceu tão prematuramente um excelente amigo que me deixou muitas saudades que, sinceramente, são saudades que ainda hoje sinto!... 

Fica então aqui narrada a triste “istória” que esteve na origem do nosso afastamento e, se a conto, para além de memorizar e registar esse acontecimento, faço-o também para que melhor se possa comparar como  se alteraram os comportamentos das autoridades deste país desde então para o dia de hoje…  Se antes de desconfiava até de duas inofensivas crianças, colocando-as como ladrões perigosos, detidas na esquadra,  hoje, adultos e mesmo já cadastrados, roubam e matam e… pouco ou nada lhes acontece…  

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

BELÍSSIMO! BELÍSSIMO ENCONTRO!


Belíssimo! Belíssimo encontro  hoje  com os meus velhos companheiros e amigos de infância José Manuel Samouco (ao centro, na foto) e António Manuel Cerqueira (à direita)! 

Coisinha  super- agradável que aqui quero registar com redobrado prazer pelo particular gosto que senti e sentimos dado que, em conjunto, não nos juntávamos há mais de 55 anos! E… cinquenta e cinco anos é já muita coisa!...

Nos já tão distantes anos de 1955, 56 e 57 eu , vindo do distante e sertanejo Chouto vivia na época escolar em casa dos meus padrinhos de baptismo, pai do Tó – e da Teresa e da Gaby – e o Zé Manel era primo deles, filho da irmã Elisa da minha madrinha Ricardina. A esta madrinha e a meu padrinho António Cerqueira devo a insistência junto de meus pais para eu deixar o Chouto e ir estudar para Lisboa porque meu pai achava que eu deveria vir a ser… alfaiate… Isso mesmo, o meu saudoso pai entendia que eu, depois da 4ª classe, deveria entrar no amigo mestre Acácio Varela, sem dúvida um excelente alfaiate que tinha a sua oficina logo ali ao lado, para  iniciar a minha carreira na alfaiataria. Logo eu que não tinha e nunca mais tive jeitinho algum para trabalhos manuais… Que desastre teria sido...

Foram então os meus padrinhos – a minha madrinha, lembro, era veemente nessa vontade! – que forçaram e “exigiram” que eu fosse para sua casa em Lisboa para obter primeiro a então necessária “Admissão ao Liceu”  - era assim que se chamava -  e depois prosseguir nos estudos. Aí, então, tirei a “Admissão”, numa escola junto ao Bairro do Restelo onde ficava a casa dos padrinhos e, depois, já no Liceu de Oeiras, ainda andei mais dois anos porque chumbei logo no 1º ano, Mas o chumbo não foi aí por culpa minha… Um acidente doméstico, nas férias no Chouto,  provocou e prejudicou-me muito os estudos… Valeu-me então o falecido e saudoso Manuel Marques, famoso massagista do Sporting de então e amigo da família da casa que me tratou durante algumas dolorosas semanas! Mas ainda sofro dessa inadvertida queimadela de azeite a ferver naquela distante passagem de ano.

Mas regressemos então ao belíssimo encontro com os meus dois velhos amigos de brincadeiras dos anos cinquenta:
Nasceu esta reunião e foi pretexto para o Zé Manel me oferecer umas autênticas pérolas compostas por jornais, revistas e postais velhos da Chamusca, coisas de 1928 e seguintes anos, de que deixo aqui foto, que eram pretensa do seu pai, “pérolas” estas ou idênticas que me lembrava ter visto no quarto da sua avó no Restelo. A conversa nasceu na internet e o Zé Manel foi exemplar na gentileza que usou para comigo fazendo esta oferta que muito aprecio!

Juntámo-nos então hoje num almoço/encontro que prosseguiu pela tarde adentro e todo o tempo não chegou para rememorarmos os velhos tempos de crianças no Restelo em que jogávamos à bola na rua – as balizas eram as sarjetas!... -, em que frequentávamos o Sporting tanto na velha sede do Passadiço, como no Estádio de Alvalade que na altura era todo nosso! Andávamos por todo o lado e o estádio era como se nossa casa fosse!... Víamos os jogos junto ao relvado e os jogadores – Passos, Travassos, Juca, Octávio de Sá e tantos outros, eram visita de casa de meu padrinho que era e foi durante muitos anos Secretário Permanente do clube.  Assim como que o actual Director - Geral que, por sinal, é o também meu familiar Valdemar Barreto. Curiosidade e casualidade bem interessante, acho.

Mas recordamos igualmente muitas outras situações como, por exemplo, a velhinha avó deles dois que habitava alternadamente nas casas das duas filhas mas que, quando estava no Restelo, em casa da filha Ricardina, o “terramoto” era diário e constante. Senhora muito pequena, muito corcunda e com uma tosse crónica horrível, possuía um feitio conflituoso no máximo que se possa imaginar e, com a filha, o choque é permanente e muito violento! Um exemplo: Ela embirrava, é o termo, que a minha madrinha quando fazia Cozido à Portuguesa colocasse farinheira no cozido. Embirrava a 1000%!
Numa das vezes, lembro-me bem, desconfiada ela foi ver à panela, viu a farinheira, sacou-a e, de farinheira na mão, pendurada pelo cordel, veio gritar para a janela: “Olhem! Olhem!” e…zás! Atirou a farinheira a voar pela rua fora…

E quando a filha recebia “à socapa” em casa para pernoitar o velho pai que vinha da Golegã a Lisboa? A velhinha e o sr. Vacas estavam separados  há largos anos e a senhora detestava que a filha acolhesse o pai debaixo do mesmo tecto onde ela estava… Minha madrinha recebia então o pai na porta da cozinha, nas traseiras da vivenda, fazia-o subir a um dos quartos no 1º andar e era aí que lhe levava o jantar sem a mãe sentir a mais leve suspeita… De manhã, o homenzinho saia cedo, pé ante pé com a ajuda da filha que, logo de seguida e antes de ir para o trabalho, tinha o cuidado de deixar o quarto arrumado e sem qualquer vestígio de que o pai ali tinha dormido. Mas, aconteceu que numa das vezes ela se esqueceu de um jarro de água no quarto… A velha senhora, que ficava sozinha em casa enquanto uns iam para o trabalho e outros para o liceu, ou porque gostava de vistoriar ou porque algo suspeitara, deu a volta e encontrou o jarro de água e aí o terramoto aconteceu…. Chegada a noite, quando a filha Ricardina chegou do trabalho, a casa parecia que ia abaixo!... Tourada, tourada das boas!

Um detalhe de soberba importância era a forma como o meu padrinho assistia a todas estas contendas entre a esposa e a sogra!… Era um espanto! Um espanto! Nunca se metia e dava a sensação que assistia de poltrona, assim como que em camarote da ópera, a todas as cenas… Meu padrinho era muito educado, um verdadeiro diplomata do seu tempo e jamais o vi intrometer-se, o mínimo que fosse, para acalmar os ânimos das beligerantes… Eh! Eh! Um verdadeiro espanto que nunca mais esqueci!

Igualmente muitíssimo educado e incapaz de levantar a voz fosse para quem fosse tenho de aqui recordar e lembramo-lo bem no nosso almoço de agora, era o pai do Zé Manel, o sr. Armindo Samouco, pessoa de quem igualmente guardo uma belíssima, belíssima  recordação!  Ele e a esposa tinham um magnífico relacionamento e um excelente trato e, nesse caso, aí com a velha senhora, mãe e filha davam-se muito bem! Mas a paciência, toda ela, era da filha Elisa que era uma santa pessoa porque, nitidamente, a Ricardina estava sempre, sempre em colisão com a velha mãe. A velhinha era por demais conflituosa!...

Falamos disto e de muitas outras recordações nesta belíssima tarde que convivemos eu, o Zé Manel e o Tó e, porque ainda ficou muito, muito para falarmos, já aprazamos novo encontro, talvez desta vez para o Alentejo que, inclusive, deve meter pescaria aos achigãs… Mas eu não me comprometi minimamente em arranjar produto piscatório para o almoço… Nessa não caí eu…

Sei que sou excelente pescador – eh! eh!  - mas, nessa não me meti…

NOTA - Falamos também da ocorrência  que tem tanto de insólita quanto aborrecida que ditou o corte de relações ou algo parecido entre o meu padrinho e o meu pai e que ditou o meu abandono dos estudos em Lisboa  e o consequente afastamento entre as famílias mas, para não tornar este escrito demasiado extenso, abordarei o caso no meu próximo apontamento, daqui a dois ou três dias, não só para ficar em registo mas para vermos também e compararmos como as autoridades no tempo de Salazar lidavam com os crimes a ordem pública e as de hoje lidam... Viemos do 80... para o 8...

domingo, 6 de janeiro de 2013

OS 40 ANOS DO "EXPRESSO"


O "Expresso" celebra hoje o seu 40º aniversário  e, ontem, depois de comprar o seu número comemorativo, escrevi umas quantas linhas que agora aqui resolvo publicar e que talvez fiquem bem como arquivo e memória futura...

 Hoje é sábado e, como todos os outros sábados, desde há 40 anos, aqui tenho comigo o “Expresso” que hoje saiu numa edição muito especial porque amanhã celebra o seu 40º aniversário de publicação!

Sair de manhã aos sábados e, no primeiro quiosque comprar o “Expresso”, é para mim um hábito, se não mesmo uma obrigação que sinto quase, quase, como o cristão que todos os domingos vai à missa…

Compro o “Expresso” “obrigatoriamente desde o seu 1º número e para além de ainda guardar esse exemplar, guardo muitos outros, sobretudo do período revolucionário que vivemos após o 25 de Abril de 1974 e lembro-me tão bem como hoje com que expectativa aguardei a saída do 1º número e sobretudo com debati com um velho amigo, há muito já falecido, o conteúdo do jornal acabado de sair. Tratava-se do Afonso, Afonso Henrique Santos de seu nome completo mas que assinava os seus poemas e outros escritos com o pseudónimo de Henrique Bravo. Relojoeiro de profissão, trabalhava numa pequena relojoaria e ourivesaria no Calhariz, junto à então Caixa Geral de Depósitos na Calçada do Combro. 

Esse amigo tinha-me sido apresentado pelo António Bento do “Jornal da Chamusca”, seu velho amigo com quem chegaram a publicar uns cadernos de poesia, de nome “Atitude” e o Afonso chegou também a escrever no “Jornal da Chamusca”. Costumava também sugerir ao António Bento e a mim formas de melhor apresentarmos o jornal e recordo-me por exemplo que numa das vezes deu a ideia de publicar em grande destaque na 1ª página uma foto de um “Bate Papo” em que eu aparecia a entrevistar em palco o padre Diogo, da Chamusca mas apresentado a foto em negativo. O Bento, concordou, ficou bem interessante e lembro-me que muitas pessoas apreciaram a originalidade.

Mas voltemos ao “Expresso” cujo nascimento, na verdade, está bem fresco na minha memória… O jornal nasceu assente na chamada Ala Liberal da então Assembleia da República que era composta entre outros por Pinto Balsemão, que o fundou e dirigiu durante anos e ainda por Mota Amaral, Sá Carneiro, Miller Guerra e Pinto Leite, um homem de que muito pouco se fala porque morreu muito novo num acidente de helicóptero na então Guiné portuguesa mas curiosamente o seu nome vem publicado na 1ª página do “Expresso” no seu 1º número. Era um jovem empresário e político de que muito se esperava.

Foi então assente neste grupo que muito escreveu no jornal de então e aproveitando a pequena abertura que Marcelo Caetano trouxe ao regime do chamado Estado Novo que Balsemão pensou e criou o jornal. Caetano tinha aberto qualquer coisita o ambiente político e esses então jovens deputados achavam que era possível mudar o regime pelo dialogo na Assembleia. Ficaram celebres as discussões deles com os deputados mais velhos e conservadores, ultras, defensores do regime de Salazar e lembro-me por exemplo duma contenda entre Miller Guerra e Cazal Ribeiro que constava do Diário da Assembleia e que circulava mais ou menos clandestinamente entre nós…

O pessoal mais à esquerda – leia-se gente de ideais comunistas que vivia clandestina, mais ou menos ”abafada” – acharam o jornal demasiado conservador porque esperavam mais agressividade na escrita mas eu lembro-me que gostei muito, logo do 1º número. Até então só podíamos ler umas coisitas ou outras contra o regime no “Diário de Lisboa” e no velho “República”. O “Expresso”, trazia uma linguagem algo diferente e como era semanário, o que era uma novidade na altura, dava para ir lendo durante a semana.
Desde a 1ª hora foi sempre um jornal muito influente no poder e não raras vezes tem contribuído para a queda de governos. Recordo-me por exemplo quando Vasco Gonçalves em pleno PREC, num comício em Almada, se atirou ao “Expresso” chamando-lhe pasquim. Desabridamente o homem parecia que estava fora de si e, logo, logo vaticinei: já caíste…! Durou duas ou três semanas…

O jornal está agora muito diferente, como é lógico e tem acompanhado a  evolução dos tempos estando muito mais moderno e competitivo.

É, para mim, o melhor jornal português e ficaram pelo caminho muitos outros que o tentaram abater… Lembro-me do “Semanário”, do “O Jornal”, do “Independente” e ultimamente do “Sol”. Todos tiveram de desistir e morrer, excepção ao “Sol” que ainda aí está porque ultimamente se agarrou a capitais angolanos…

Neste número comemorativo do 40º aniversário, na “Revista”, eles publicam um trabalho com leitores fiéis do jornal desde o 1º número mas esqueceram-se de mim…

Imperdoável!... Eh! Eh!