domingo, 31 de maio de 2020

E... SEM DOR, II "RECAUCHUTAGEM" ULTRAPASSADA!


É verdade, a segunda “recauchutagem” foi ultrapassada e felizmente sem dor ou qualquer contrariedade física digna de nota. Uns hematomas surgidos e que ao longo dos dias irão passando e… dores zero. Felizmente e por enquanto…

Desde ontem, logo às primeiras horas da tarde estou em casa depois de exactamente 45 horas passadas em que aconteceu a entrada (dia 28), o tratamento (29) e a alta (30). Convenhamos que foi bem pouco tempo para realizar a “recauchutagem”…

Fica agora a expectativa da eficiência da intervenção, sendo que levará 3 a 4 semanas a saber-se.

O processo adoptado foi a “quimioembolização”, de que deixo aí uma imagem que retirei da net, que consistiu na introdução de um cateter numa artéria de uma virilha que levou ao tumor a químio que lhe vedará o fornecimento de sangue e oxigénio fazendo com que definhe e morra. 

Mais uma demonstração de como a ciência e o saber dos homens é cada  vez maior, para nossa comodidade e bem-estar.

Resta esperar que resulte em pleno e não seja necessária nova intervenção para melhorar esta ou por surgirem novos apêndices e, isso é que nada nos diz que não aconteça, restando-me estar preparado para tal desiderato… 

É a vida...

quarta-feira, 27 de maio de 2020

... E, A NOVA "RECAUCHUTAGEM" AÍ VEM!...


Bem me pareceu logo em Fevereiro que seria inevitável ter de voltar  a recorrer à ciência e à sabedoria dos senhores doutores – eles, sim, com o apropriado e justo título de doutores! - para de novo sofrer intervenção na minha muito doente "pecinha das iscas" e, infelizmente, as minhas suspeitas estavam certas.

Foi em Fevereiro que fiz e tive o relatório e as imagens da Ressonância Magnética feita mas, a pandemia e o condicionamento forçou uma demora de 3 meses e, agora, aliviadas as restrições de movimentos, amanhã lá vou para mais umas dores e, sobretudo, preocupações…

Desta vez, ao que a médica que me acompanha me informou e uma vez que, segundo disse, não é aconselhável voltar a fazer cirurgia ao fígado, a eliminação dos tumores far-se-á através da pele, com uma agulha, segundo me indicou. Se as minhas buscas aqui na net estiverem correctas, deduzo que se chama “rádioablação” a intervenção e que consiste numa agulha que vai ao núcleo do tumor e, através de uma fonte de calor, o queima. Ao que li é um método recente, que é feito com anestesia geral do doente, sendo muito menos doloroso e de melhor e mais rápido período de recuperação no pós-tratamento. Mas, amanhã, certamente, conhecerei mais detalhes.

Seja como for, embora com a preocupação de um sempre aborrecido internamento e tratamento hospitalar, parto despreocupado q.b. e confiante porque sei ficar entregue ao que de melhor na especialidade existe em Portugal no tratamento de doenças hepáticas. Fiquei muito bem impressionado há dois anos e meio quando sofri a cirurgia e tenho a convicção que, agora, tudo decorrerá por igual. Pessoal médico, enfermagem e serviços foram impecáveis e, certamente agora voltarão a sê-lo, naquele Curry Cabral que tanta gente cura e salva. 

Procurei na net e deixo aí uma imagem ali encontrada sobre o tratamento de que vou beneficiar, isto se não estiver errado na minha interpretação da intervenção.

Durante, ou depois da forçada estadia hospitalar, aqui darei conta.

Até lá!...

domingo, 24 de maio de 2020

A FISGA - COMO EU, QUEM A USOU E MATOU PASSARINHOS?


Um galho em “V” de uma árvore era cortado em medida que nos coubesse na mão e no bolso e, depois de aparado, eram-lhe atadas nas extremidades do “V” duas tiras de borracha previamente retiradas de uma velha “câmara de ar” de bicicleta ou de automóvel ou camioneta, sendo que, para estes últimos “elásticos”, era necessário usar mais força para os esticar, embora imprimissem mais velocidade à pedrinha projectada.


Nas duas outras pontas das tiras de borracha aplicava-se um pequeno pedaço de cabedal onde seria colocado o “projectil” (leia-se: pedrinha) a arremessar em direcção ao pássaro.

Depois, bem, depois era partir para a “caça” de fisga no bolso mais ou menos dissimulada para que pais e vizinhança não vissem que íamos aos pássaros. A operação era feita maioritariamente debaixo das copas das árvores ou perto delas ou até nas proximidades de vedações de hortas, por exemplo, em cujas varas ou canas os pássaros pousavam e depois de nos aproximarmos pé-ante-pé para não sermos notados…

Colocada no cabedal a pedrinha/projectil, fixa com boa pressão pelo “punho” a fisga, esticadas as borrachas, feita a pontaria com um olho fechado e outro aberto no centro do "V" da forquilha, seleccionado que estava o alvo/passarinho a atingir, era só largar a pedrinha e, em grande velocidade, aí ia o “projectil”.  

Se o “caçador” tinha boa pontaria, a pobre avezinha caía de imediato moribunda no solo mas, se não tinha – como era o meu caso… -, a pedrinha passava ao lado e... a pobre ave continuava vivinha e feliz, cantando e procriando.

Eu e muitos dos meus amigos de infância - se não quase todos… - usávamos muito a rudimentar “arma” por montes e vales da minha aldeia natal na busca dos pássaros mas, no meu caso pessoal, devo confessar que a tinha escondida porque o meu pai me proibia de fazer tal barbaridade aos passarinhos. Pois… ele proibia mas, eu, várias vezes a usei às escondidas na companhia da rapaziada amiga.  

Mas – lembro-me bem… -, um ou outro passarinho que matei – fui e sou péssimo em pontaria… -, não levei para casa, não… Isso seria tareia, pela certa...

(Imagem retirada da net)


domingo, 10 de maio de 2020

... EM "BRAILLE", DA POETISA EMÍLIA MONTALVO



Lisboa, 8 de Junho de 1984
Meu prezado amigo,
Eu não pudia deixar-lhe de manifestar o que me vai na alma sensível pela surpresa que Deus lhe inspirou por mim…
Agradeço-lhe muito grata, Victor.
É realmente bondoso, porque pensa nos semelhantes.
Tenho amor à minha terra, onde tive até aos 8 anos a minha primeira infância. Depois fui para onde me deram uma educação que me permitiu dar a bastantes crianças tudo o que ensinar-lhes na cultura, na moral e na religião.
Naquele que o Victor fez ouvir na Renascença está a minha crença a Jesus que me ilumina e me concede a coragem e a resignação.
Felicito-o no valor, na boa esposa e nos filhinhos que tanto achei encantadores.
Beijinhos para eles e para a Hortense de quem sou amiga.
Um grande abraço da sincera amiga que pede a Jesus a bênção do vosso lar.
Emília de Jesus Montalvo
                                                

Fruto de tudo guardar mas também, o que parece lógico, como um natural sentimento de gratidão pelo conteúdo, satisfação pela inusitada forma e apreço pela autora desta belíssima missiva em “braille”, fez com que chegasse até hoje este valioso documento – valioso pelo menos para mim que, pela 1ª e única vez, recebi una carta assim redigida – e, desta forma dar motivo à criação desta minha crónica de hoje, iniciada pela “tradução” da carta em “braille” que à direita aqui também se deixa.



Foi sua autora Dª Emília Montalvo, senhora e amiga que, não sendo exactamente minha familiar directa, também não estava muito distante disso dado que era irmã de minha tia Ilídia, casada com meu tio Joaquim Azevedo, irmão de meu pai, sendo por isso amiga muito próxima o que deu azo a contactos mais ou menos frequentes. Na verdade, visitei várias vezes Dª Emília na Escola António Feliciano Castilho, em Lisboa, onde vivia e professava e também em diversas ocasiões convivemos na casa de meus tios, onde igualmente vivia a sua já idosa mãe, acontecendo isso quando a senhora passava férias na Chamusca.

Nascida na Chamusca, Emília de Jesus Montalvo, de seu nome completo, veio ao mundo com a visão como qualquer criança sem deficiência, mas uma terrível doença retirou-lhe a vista e a menina ficou totalmente cega. Desconheço mais detalhes dessa doença porque, por incrível que pareça, nos muitos contactos tidos com Dª Emília, com minha tia e até com a mãe de ambas, nunca tive coragem de tal assunto abordar... Achava que, para tanta angústia, já bastava a vivida pelas próprias nas suas vidas, no seu dia a dia...

Cega a menina e sentidas as dificuldades económicas dos progenitores foi conseguido o seu internamento no Asilo Escola António Feliciano Castilho onde a criança cresceu, estudou, educou e desenvolveu a sua personalidade bem vincada e apreciada. Com efeito, Emilia, inteligente e interessada, depressa se evidenciou e em pouco tempo atingiu mesmo o professorado, de forma que aos 18 anos já dava aulas na própria escola.

Surgiu então a poesia na sua vida e, dai a ver publicadas suas obras em diversos jornais e revistas, de entre os quais se destaca o “Diário de Notícias”, foi um pulo. Colaborou também, tanto  quanto julgo saber, com o Teatro Amador da sua Chamusca natal, da qual falava sempre com uma grande paixão. Para além de se expressar em diversas línguas de onde sobressaia o francês, o inglês e até o esperanto, com o curso de conservatório tornou-se também professora de piano e canto, numa belíssima e muito interessante vida onde sobressaia sempre a sua exemplar educação, o seu belíssimo trato e a sua impressionante serenidade física, psicológica e até poética. Também o timbre de voz e a forma como se expressava, dividindo de maneira bem característica as sílabas, completando as palavras de forma verdadeiramente límpida e impecável, admirava os interlocutores menos habituados. Também o seu porte físico e a calma e serenidade com que estava e se movia, deixavam impressionados tudo e todos. Um ser humano “sui generis”, sem dúvida.

Nesta carta que hoje trago a público Dª Emília manifesta reconhecimento por algo que sobre ela escrevi e foi lido aos microfones da Rádio Renascença algo que, francamente, já não me recordo… Lembro-me que na época, num programa de António Sala, por vezes foram lidas 2 ou 3 coisinhas que escrevi mas… já não me lembro o quê… Por via desta carta deduzo que uma delas foi sobre D. Emilia Montalvo, possivelmente alguma ou algumas poesias de sua autoria, a exemplo desta que também aí deixo…

Resta acrescentar que Dª Emília Montalvo nasceu na Chamusca, a 7 de Maio de 1904 e veio a falecer em Lisboa, no Lar de Nossa Senhora da Saúde, onde nos últimos anos esteve internada, no dia 16 de Maio de 1989.

EM TEMPO - Dias depois de redigir esta crónica surgiu na net uma bonita e interessante foto mostrando-nos Dª Emília Montalvo a escrever algo em braille e que, com a devida vénia,resolvi trazer para aqui, integrando-a no corpo do texto.

sábado, 2 de maio de 2020

OUTROS TEMPOS, OUTRAS VIDAS...


Eram outros tempos, eram outras vidas, eram outras vivências...
Era o tempo pós-guerra, era o tempo de outras muito duras realidades…
Era o dia-a-dia de privações, de dificuldades, de até fome para muitos…
Era o dia-a-dia da incerteza do dia seguinte, se o trabalho à jorna surgia…
Era o tempo do suor, da dor, do esforço braçal, do sol-a-sol…

Medito em tudo isto ao ver esta foto com “talheres” de outrora e que, hoje, felizmente, já poderão ser peças de museu.

Havia-os em casa de meus avós maternos, no Anafe do Meio, do meu Chouto natal. 

Eu criança e eles adultos, de corpos bem moídos pela árdua labuta agrícola no arroteamento e amanho das terras do senhor marinheiro que em Lisboa recebia pelo S. Miguel a renda dificilmente amealhada e suada durante o ano, sentados em pequenos bancos de assento de palha, idênticos ao da foto junta e ao redor de grande travessa em cima de uma baixinha e curta mesa, com a altura dos banquinhos, todos tirávamos as colheradas ou garfadas do nosso lado na grande malga, usando relíquias iguais a estas da foto que encontrei na net. 

No final, rapada a travessa, o avô Gregório levantava-se, subia os dois degraus de cimento atrás de si, corria a cortina de pano de ramagens que dava acesso ao seu quarto e da avó Maria e, de baixo da cama para estarem mais fresquinhas do calor abrasador do Verão, porque toda a casa era de telha vã, retirava uma grande melancia de que ele era mestre no cultivo. Voltava a sentar-se, punha a melancia no colo entre as pernas e traçava-a em compridas fatias (talhadas, como lhes chamava) que distribuía uma a cada um, deixando o coração (castelo) por ser mais doce, para a rodada final.

Depois, bem, depois todos se levantavam e, homens e mulheres, filhas, genros, boieiros e demais contratados iam para a danada da labuta agrícola e a avó Maria, de pernas arqueadas e saia larga e comprida, pegava na grande malga vazia e nos talheres e procedia à sua lavagem num grande alguidar de barro. A loiça com água e sabão azul e branco e os garfos, iguaizinhos aos da foto, eram demoradamente esfregados com o mesmo sabão azul e branco num esfregão de pano bem forte. Se havia palha de aço, não me recordo mas talvez houvesse. Ou talvez isso fosse uma modernice…

E, no dia seguinte repetia-se a cena…

O mesmo esforço, a mesma labuta, o mesmo sentar em redor da grande malga, os mesmos garfos cinzento escuros e ásperos…

A vida de outros tempos…

A vivência árdua e muito difícil de quem, com tanta dedicação e carinho, nos criou e amou...