domingo, 20 de setembro de 2020

AINDA A CARRINHA DA GULBENKIAN

Nas minhas já habituais e regulares incursões nas velharias de outros tempos que ao longo da vida fui preservando e que, agora, vou revisitando e finalmente agrupando e arquivando convenientemente e com algum método, coisa que nos tempos passados não fiz, estando ainda uma boa parte “a monte” e guardada sem qualquer critério ou organização, a que as sucessivas mudanças de casa mais baralharam e prejudicaram, encontrei agora uma interessante carta, de 1965, que aqui incluo com  gosto num seu pequeno trecho e que, revendo-a, deveras mereceu o meu apreço por a ter guardado.


É redigida pelo velho e saudoso amigo Zé do Areal (Custódio Marques Montargil, de seu nome de baptismo) que adoptou esse pseudónimo nas muitas crónicas que ao longo dos anos escreveu sobre a sua Chamusca em particular e o Ribatejo em geral para diversos jornais e, sobretudo, para a então “Vida Ribatejana”, de Vila Franca de Xira, amigo com quem, para além de contactos pessoais em Lisboa onde residia, também troquei vária correspondência ao longo dos anos, sendo que nesta carta aborda aquele saudoso amigo o caso da Biblioteca Itinerante, da Fundação Calouste Gulbenkian, que noutros tempos consegui que servisse o meu Chouto natal. 

Titulada “A carrinha da Gulbenkian”, já aqui escrevi uma crónica sobre o assunto, tendo-lhe anexado apenas o recorte do jornal da época onde inicialmente sugeria a visita da Biblioteca Itinerante ao Chouto e também o meu cartão de leitor mas onde faltava algo escrito que testemunhasse a minha diligência na deslocação da carrinha há minha terra, documento ou documentos que, face à “barafunda” que ainda tenho nas minhas velharias não consegui encontrar na ocasião da redacção da crónica, o que me fez confusão porque, recordo-me, naquela recuada data troquei sobre o caso alguma correspondência com a Gulbenkian no intuito de reforçar directamente o meu pedido uma vez que, provavelmente, o jornal não teria chegado à Fundação…

Nesta correspondência de Zé do Areal agora encontrada ele felicita-me pelo êxito da minha iniciativa, acrescentando mais umas palavras sobre o interesse da leitura e da instrução nas pessoas e do proveito que daí poderia advir para o povo choutense.

Escreve então Zé do Areal: 

"Meu amigo. Recebi a sua carta que li com atenção. É evidente que, quanto à sua acção em prol da ida da B.I. (Biblioteca Itinerante) ao Chouto só me regozijo com o seu triunfo e faço sinceros votos para que os choutenses se apercebam que a maior fortuna que se pode possuir é a Instrução e através dela a educação. Isto sim valoriza e impõe o homem que se esforce e se disponha a ir tão longe quanto possível. Todo aquele que só disponha de fortuna monetária está sujeito, perdida ela, a sofrimentos insuportáveis. Portanto parabéns pelo êxito obtido."

Sábias palavras que agora releio com agrado e que aqui deixo como pequeno mas gratificante testemunho de uma face do laborioso trabalho que ao longo da vida venho executando sem o mínimo interesse material e com o único objectivo de ajudar o meu semelhante e assim também servir as gentes e a terra que me foi berço.

Um sermão que, conforme costumo dizer ninguém me encomendou mas que me dá satisfação e prazer e, porque nasci assim, assim continuo e… provavelmente assim desaparecerei.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

PROVEITO DE FÉRIAS

Inevitável e desde sempre, quando parto para férias faço-me acompanhar de alguns livros para leitura nos momentos de ócio e, assim, televisão e notícias de tragédias, escândalos e tricas políticas ficam para preocupação muito secundária e, antes, prefiro ocupar o tempo com a leitura de um artigo ou outro de jornal ou revista e, sobretudo, o embrenhar-me no conteúdo de um bom livro, seja de romance, história ou análises sociais do mundo que nos rodeia.

Foi o que também fiz este ano e li num total para aí umas 1700 páginas dos livros que


escolhi.

Assim, reli mais uma vez Miguel Torga que incluiu um volume com os seus 8 primeiros Diários e ainda os 13º e 14º e li também a obra “Cinco homens que abalaram a Europa” da autoria do politólogo Jaime Nogueira Pinto, livro que tinha adquirido meses atrás e aguardava ocasião calma e despreocupada para o ler.

De Torga já aqui tenho confessado a minha preferência se não paixão pela sua leitura porque, para além de a sentir autêntica e genuína e embora reconheça que é bastante lúgubre e algo tristonha, o nosso transmontano escreve muitíssimo bem e muito se ganha com a sua leitura. Eu sou inveterado apreciador e admirador de Miguel Torga e adoro lê-lo.

Quanto a Jaime Nogueira Pinto foi a 1ª vez que o li e gostei. Esta obra, que nos fala de Estaline, Mussoline, Hitler, Salazar e Franco desde os seus nascimentos até às suas mortes, dá-nos conta das suas origens e das suas sanguinárias, se não loucas, vidas políticas.

O autor é um assumido homem de direita (evita por exemplo chamar de fascista ao regime de Salazar) e, isso, para além de já o sabermos de seus habituais debates políticos e artigos em jornais e revistas, é evidente nesta obra mas é sem dúvida um homem de vastíssimos conhecimentos da história política nacional e mundial de que este livro é um excelente testemunho com detalhadas narrações de encontros, reuniões e decisões políticas dos actores políticos naqueles agitados anos da nossa Europa, onde o autor nos fornece muitos e impressionantes detalhes, sinónimo de que se serviu dos seus vastos conhecimentos e muita documentação consultada para assim se expressar.

Foi portanto este o meu proveito literário destas férias, que duraram dois meses e dou o tempo por bem empregue. 

Descansei a cabeça e distraí-me. Foi bom!


domingo, 13 de setembro de 2020

NUMA FESTA ADIADA, O "DITO" DE UM AMIGO



Em tempos que já lá vão tive amizade e amiudado contacto com um conterrâneo do meu Chouto natal, amigo que, embora sofrendo de um pequeno desarranjo mental, era pessoa extremamente correcta, afável e amiga de todos os que com ele lidavam e conviviam.

Falo de situação vivida na minha juventude, adolescente e rapaz, coisa dos anos 50 a 70 do


século passado e que inclusive envolveu troca de vária correspondência quando me encontrava na Guerra Colonial, sendo o saudoso amigo sempre pronto a escrever-me para Angola, fazendo detalhadas descrições das envolvências da sua vida pessoal, laboral e igualmente das ocorrências na nossa aldeia, coisa que eu, lá bem distante, na solidão e isolamento do mato, apreciava.
 

A deficiência desse amigo, não sendo profunda, também não era tão leve quanto o mínimo aceitável mas, não obstante, o seu convívio era agradável e amigo e esse saudoso homem usava mesmo muitas vezes expressões que para sempre me ficaram na memória, sendo que hoje aqui deixo uma que me parece adequada ao assunto principal que nesta crónica quero abordar e que se prende com o adiamento da festinha da passagem do 3º aniversário do Grupo da minha terra (CHOUTO – NOSSA TERRA, NOSSA GENTE), Grupo que criei na net e administro com prazer e de aqui já tenho falado. Sempre temos festejado os seus aniversários e este de hoje não fugiria à regra, não fora o danado do “bicho” que no ameaça a toda a hora e em cada canto e que nos impõe isolamento e reserva, evitando contactos propiciadores de um indesejável contágio.

Usava então muitas vezes aquele amigo a sabedora expressão – ditado popular? - quando, forçosamente, tínhamos de adiar qualquer situação das nossas vidas, “Deixe lá amigo, porque há mais marés que marinheiros!...” e recordei-me dela quando dirigia este ano uma saudação vídeo ao Grupo, lembrando a efeméride.

Na verdade, sendo que custa bastante suspender o hábito de pessoalmente festejarmos o interessante aniversário, como já era tradição, as circunstâncias a isso nos obrigam porque, cumprir o que está recomendado oficialmente em domínio público e, sobretudo, preservar e cuidar bem da nossa saúde está, tem de estar, em primeiríssimo lugar.

Pessoalmente - e sei que em vários amigos e conterrâneos igual sentimento é vivido e disso vão dando expressão em mensagens ali deixadas ao longo deste dia -, custa-me bastante não realizar este ano a comemoração mas, por outro lado, sabendo do perigo do vírus e sendo a pandemia a nível global, com as naturais preocupações mundiais que a todos acarretam, já se fala muito numa eficaz vacina a surgir em prazo mais ou menos curto e, por isso, há que ter calma, resignação e... esperança.

Calma, resignação e esperança que, mais que nunca, para todos nós são bem necessárias, até porque, como diria o meu saudoso amigo, se ainda estivesse entre nós: “Deixem lá amigos, porque há mais marés que marinheiros!..”.

(Como “ornamento” do texto deixo um “boneco”, que fiz no “photoshop”, alusivo à efeméride.)