sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

UMA MINISTRA EM LÁGRIMAS...

Avesso a interessar-me, falar e sobretudo escrever sobre política e os políticos que temos depois de me desiludir com os métodos e o nível da classe política que nos vinha – e vem - dirigindo e mais concretamente após os nossos eleitos representantes em tempos idos terem criado as então escandalosas, incríveis e mesmo ofensivas Pensões Vitalícias, numa decisão pessoal que tomei e que só foi alterada uma ou outra isolada vez em casos esporádicos e bem raros eu, que no pré e no pós 25 de Abril me interessei e vivi a política e durante muitos anos e tanto escrevi em milhares de linhas, muitas vezes de páginas inteiras em jornais e revistas publicadas no meu torrão natal, abro hoje um novo parêntesis nessa posição há muito assumida.

E faço-o sincera e convictamente depois de, fortemente impressionado, ter visto na televisão e já revisto aqui na net, a nossa actual Ministra da Saúde, Marta Temido de seu nome, numa emoção para mim jamais vista num governante, verter lágrimas enquanto discursava no Instituto Ricardo Jorge perante os seus trabalhadores.


Emocionou-se assim a senhora de voz embargada e com várias e emotivas lágrimas a rolarem-lhe pela face quando se dirigia aos trabalhadores do Instituto, que o seu ministério tutela, no seu agradecimento e muito apreço pela dedicação e esforço por eles despendido no combate à terrível pandemia que nos assola, que naturalmente a todos muito preocupa e, como agora se comprova, com a Ministra da Saúde a estar na 1ª linha desse combate e dessas preocupações.

Preocupações que, agora se constata com franca admiração, não são apenas oficiais mas, sobretudo, muito sobretudo, pessoais.

Em toda a minha existência não me recordo de ver em público num governante tamanha emoção, tamanho sentimento e tão grande sensibilidade pessoal no desempenho da sua importante missão e entendo que deve merecer todo o apreço e toda a estima.

Não sei se é boa ou má ministra; se é competente ou não; se desempenha o seu cargo com saber ou não; sei que é sensível, sei que sente a responsabilidade do seu cargo e isso diz-me muito.

Porque nunca me acanhei a criticar os frios, distantes, maus, se não mesmo mentirosos e falsos políticos, aqui estou hoje, francamente e também emocionado q.b., a manifestar toda a minha estima e muita admiração pela sensibilidade de Marta Temido, ministra de um governo de Portugal.

Bonito e sensibilizante!

Mulher de carne e osso – e lágrimas!… - como eu.

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

OS (DEFUNTOS) CARTÕES DE BOAS FESTAS

 
Vivíamos então as décadas de 50, 60, 70 e mesmo 80 do século passado... 

O digital ainda não tinha nascido; a internet igualmente ainda não havia surgido, não tinha sido inventada e, eventualmente, tão pouco seria sonhada pelas mentes mais imaginativas; os telemóveis idem-idem, aspas-aspas e, nos poucos aparelhos fixos, as ligações eram deficientes e… caras; as comunicações entre os humanos eram na época feitas quase exclusivamente pelo correio escrito em cartas, cartões, postais, telegramas, etc.

Era assim antigamente e foi neste quadro que surgiu o então designado “Cartão de Boas Festas” para ser enviado nesta quadra natalícia ao amigo, ao familiar, ao namorado e, depois, numa maior divulgação, a associações, instituições, quiçá empresas mais dedicadas e estimadas do remetente. 

Chegada este altura do ano todos corríamos às papelarias, tabacarias e até a cafés e mesmo mercearias em pequenas aldeias, na compra dos pequenos cartões e seus envelopes, que se vendiam em conjunto já com as dimensões adequadas às dos cartões.

Na Chamusca, sede do meu concelho natal, recordo-me que o estabelecimento grande fornecedor da população era sobretudo a “Papelaria do João Fonseca”, principal estabelecimento do género na vila mas, também no meu pequeno Chouto, na mercearia do meu tio Antero Barreto, que de tudo vendia, num ou noutro ano os houve, numa venda em que sobressaía a boa vontade e a simpatia do primo Zeca, sempre solícito em procurar destacar as belezas do produto e em agradar ao cliente.


Tanto quanto me lembro, os simpáticos cartões começaram nos recuados anos por serem fornecidos muito simples e de pequeno formato mas, depressa, de um simples cartão inicialmente com desenhos de paisagens sempre nevadas com casebres e árvores alvas de neve, depressa passaram a ter maior formato e a mostrar-nos imagens já mais coloridas de presépios com a Virgem Maria, S. José, o menino Jesus e os tradicionais burro e vaquinha com o seu bafo aquecendo a criança na manjedoura.

Mas não se quedariam por aí os simpáticos cartões e, logo, logo surgiu a grande novidade dos desdobráveis, de multi-faces, bem originais e bonitos para a época. Eram os mais procurados quando se pretendia presentear a namorada, o amigo especial, o familiar mais querido. Abria-se a face principal do cartão e no seu interior surgiam-nos imagens como que em movimento, dando uma dinâmica e vida ao cartão particularmente agradável à vista. Naturalmente, eram também os mais carotes mas, mesmo assim, como o desejo era agradar ao destinatário, isso pouco contava… Também com o surgimento das guerras de África começaram a circular uns cartões bem específicos, alusivos à presença dos nossos militares nos campos de batalha e que tinham a particularidade de apresentarem imagens de namoradas, de rostos e poses sempre mais ou menos apaixonadas mas obrigatoriamente discretas e castas, ou disso aproximadas, porque outra coisa a censura da época não deixaria passar…

Nas duas quadras natalícias que passei na guerra nos finais da década de 60, lá bem no distante e inóspito leste angolano, recebi naturalmente muitos e diversificados cartões de Boas Festas remetidos por familiares e amigos e, como seria inevitável – este rapaz guarda tudo!… -, ainda hoje os conservo como gratificante recordação. 

Para aqui documentar para a posteridade, escolhi desses cartões uns quantos variados que fotografei e aí deixo como ornamentação das minhas palavras. 

No grupo poderemos ver os mais simples e pequenos, com imagens de neve e árvores; um outro mais sóbrio e discreto de um amigo; e, encima, dois dos desdobráveis: um com o tradicional presépio e o outro, que aprecio bastante e que destaco em separado, que apresenta a saudosa jovem namoradinha no jardim da sua eventual casinha de aldeia empunhando um raminho de flores sendo  que, abrindo a janela, vê o seu amado que, de camuflado vestido, sinal que estava na guerra distante, surge-nos de perna trocada, muito prazenteiro numa paradisíaca praia de coqueiros e mar calmo já que, mostrá-lo sujo, cansado e a combater na mata, como infelizmente acontecia muitas vezes no seu dia a dia, seria absolutamente proibido pelos poderes de então. Lírico e romântico… Coisas da época…

Todos estes cartões e este hábito de comunicação entre nós entretanto se foram com a chegada dos mais modernos e rápidos meios de comunicação mas, convenhamos, o velhinho “Cartão de Boas Festas”, com o gosto que se escolhia de entre os muitos aos dispor na loja, com o carinho com que se redigia a sua dedicatória e até com a amizade com que se colocava no marco do correio, era bem mais amigo, fraterno e carinhoso que esta coisa das frias e quase impessoais mensagens escritas – e muitas vezes copiadas e partilhadas às dezenas e centenas… - recebidas nos telemóveis, nos computadores e na internet. 

Sinto-o eu...

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

O DESMAIO DO LUCIANO


NOS 46 ANOS DA MORTE DE DR. ARMANDO CUMBRE, O RECORDAR DE UMA SUA SINGULAR CURA... 

Luciano, pedreiro de profissão em Casa Agrícola da sua amada Chamusca, viveu toda a sua existência para o bom desempenho do seu trabalho, que executava com evidente prazer e prontidão; para a sua Celestina, companheira fiel, amiga e terna com quem uniu o seu destino nos inícios dos anos 40 do século passado e para a bonita Isabel, de seu nome de baptismo, menina de voz doce e delicada que haveria de nascer, fruto dessa união.

Formavam na vida o tradicional e ideal lar, comum na época, em que o marido trabalhava e levava para casa o produto do seu labor; a esposa cuidava do ninho, das roupas e das refeições e, a filha, depois de terminada a escola primária, costurava, bordava e fazia croché, no intuito de ser menina prendada para um seu futuro pretendente.

Luciano levava vida regrada e sem extravagâncias – que na época também não seriam permitidas... – com a dedicação ao trabalho e o apego ao lar. Laborava as normais horas de serviço por conta do senhor seu patrão, ia almoçar a casa, já que os dois locais, dentro da vila, pouco  distavam e, findo o período diário, voltava a montar a velhinha bicicleta Rua Direita fora e terminava desviando para a outra via, que percorria já a pé, apoiado no velocípede, dado que a pequena inclinação da rua e os seixos redondos da velhinha calçada algo dificultavam o seu percurso a pedais.

Pelo caminho, porque Luciano era homem muito comunicativo e sociável, correcto e educado com todo o seu semelhante, quedava-se um pouco em conversinhas amenas com o sapateiro, com o merceeiro, com as senhoras da “palha ripada” e, finalmente, tendo a “Taberna do Zé” como testemunha do seu trajecto, aí entrava uma tarde ou outra; conversava com os seus frequentadores e velhos amigos e, pelo meio, lá ia molhando a palavra e satisfazendo o paladar e o estômago com os pequenos tintinhos que lhe adoçavam a boca e algo o aliviavam das chatas canseiras do dia de trabalho.

Uma vez ou outra bebia um copinho a mais - talvez um pouquinho a mais… - e, chegado ao lar, ou porque vendo-lhe os olhinhos mais pequeninos, ou porque o nosso amigo arredondava demais as conversas ou até mesmo, talvez, expelindo algum odor avinhado, logo a sua atenta e preocupada Celestina o interpelava: 

- Luciano, estiveste a beber! Estiveste na “Taberna do Zé”!…

A que o nosso Luciano contrapunha:

- Olha, tinha o “Manel da Emília” à porta, entrei e estivemos os dois um bocadinho a conversar sobre as nossas vidas. Foi só dois copinhos a cada um…

Luciano repetiria a dose e a situação uma ou outra vez ao longo dos seus dias e sempre a cena em casa se reviveria e sempre a afável companheira, amiga e preocupada, o admoestava com dedicação e... docemente, sempre muito docemente.

Até que um belo fim-de-tarde, ou porque entrou mais um amigo no convívio e, no “agora pago eu, depois pagas tu”, ou porque aconteceu um pouco mais de entusiasmo nas conversas na “Taberna do Zé”, o nosso Luciano enganou-se um pouquinho na contagem “deles” e, quando resolveu avançar para casa, de bicicleta pela mão, a “carga” de um copito mais, repetido uma ou mais vezes, já lhe “ofereciam” um leve ziguezaguear não muito recomendável…

Mas... chegou. Chegou, não "sãozinho" na verdade mas… ainda assim, sozinho e pelo seu pé.

Já era um nadinha tarde para o habitual e as pacientes e ansiosas Celestina e Isabel, sentadas, de mesa posta para a janta que esfriava, viram-no abordar a porta da cozinha e, de mão amparada à ombreira, tirar o boné que lhe protegia a alva carequinha e, a preocupada companheira, vendo-lhe os olhinhos pequeninos e redondinhos, logo exclama:


- Luciano, estiveste a beber! Estiveste na “Taberna do Zé”!… - A mesma exclamação de outras ocasiões mas, desta vez, bem mais enérgica… Docemente, mas um bocadinho mais enérgica...

O nosso amigo, sem dizer palavra dá um passo em frente, entra na cozinha e, quando se apresta para se sentar à mesa, tomba para a direita e… estende-se ao comprido no chão vermelho de tijoleira e logo a aflita Celestina se levanta e grita, assustada:

- Ai Jesus! Ai Jesus! Luciano? Ó Luciano?!

A filha Isabel chama-o, preocupada:

-Pai? Ó meu pai? Meu Deus!…

A mãe Celestina chorosa, ordena-lhe aos gritos:

- Isabel, corre ao telefone e liga ao Dr. Cumbre, que nos acuda! Que salve o pai!…

A rapariga em dois pulos chega à sala de jantar e disca no preto aparelho o número do médico.

Atende do outro lado a criada do clínico e Isabel roga-lhe:

- Chame-me, por favor, o sr. dr.!

Cumbre, jantava… Levanta-se, vai ao telefone e ouve a aflita moça:

- Sr. Dr., sou a Isabel, a filha do Luciano. Sr. Dr. o meu pai está muito mal! Caiu desamparado, está de olhos cerrados e boca fechada e não responde aos nossos chamamentos. Não reage. Venha vê-lo, sr. dr.! Eu e minha mãe estamos aflitas. Por favor!

O médico deixa a refeição a meio, mete-se no automóvel e, em poucos minutos, chega à residência das preocupadas mulheres. 

Isabel, de porta aberta, já o aguardava ansiosa:

- Sr. dr., o meu pai não abre os olhos e não nos responde mas já abre e fecha a boca mas não diz nada, nada.

- Vamos já ver. - responde de pronto o médico, avançando casa adentro na direcção da cozinha.

E, Luciano ali continuava. Inerte, pálido e de olhos cerrados... 

Cumbre baixa-se e leva os joelhos à tijoleira do solo, dobra-se sobre o tórax de Luciano e escuta-lhe as batidas do coração; pega-lhe no pulso e conta as pulsações; queda-se pensativo breves segundos e, levanta-se de rápido indignado, no mesmo instante que vocifera e lamenta:

- Ai este cão que está com uma grande bebedeira e faz-me vir aqui!!!…

Rápido, pousa a maleta, estica os braços, abre bem as mãos e… zás-zás!; prega dois sonoros estalos nas inertes bochechas de Luciano que, de imediato, abre os olhos.

O médico pega na maleta, vira costas e deseja boa noite às mulheres, perante o espanto de Isabel que, seguindo-o na direcção da saída, ainda lhe pergunta:

- E o sr. dr. não receita nada ao meu pai?

- Receito: Amanhã diz-lhe que, já que não sabe beber vinho, que beba água!…

Saiu lesto, entrou no carro e foi concluir o seu jantar que esfriava...


(NOTA – Ainda que, por razões óbvias, os nomes dos intervenientes nesta cena com o Dr. Cumbre sejam fictícios, o episódio narrado é absolutamente verídico.)

domingo, 15 de novembro de 2020

3º ANIVERSÁRIO DOS FURINHOS

Foi no dia 15 de Novembro de 2017, completando-se portanto hoje 3 anos, que a velha carcaça deste escriba sofreu 3 furinhos no abdómen e, através deles, durante mais de 4 horas, os senhores doutores do Curry Cabral intervieram no fígado (lapararoscopia, de seu nome cirúrgico) e trataram da saúde, na verdadeira acepção da palavra, deste rapazinho.
 

Porque era a primeira vez que era submetido a uma cirurgia o doentinho ia ansioso, quiçá apreensivo mas, curiosamente, algo calmo e decidido, até porque não conhecia outra alternativa.

E, afinal e não obstante os 21 dias de internamento (exceptuando os 5 dias e meio de permanência nos Cuidados Intermédios logo após a cirurgia que foram bem chatos), passaram de maneira, sem que fosse agradável porque, cirurgia e internamento num hospital nunca poderá ser isso, mas de forma bem aceitável tendo contribuído para isso o trabalho e a competência dos vários profissionais intervenientes e, vamos lá… a vontade e boa adaptação do padecente rapaz. 

Através dos falados 3 furinhos os sabedores doutores retiraram do fígado o atrevido “brinco” (maligno) ali abusivamente nascido e já crescidinho e, praticamente sem qualquer dor, o ansioso doentinho, passou a ter esperança de dias melhores e bem menos preocupantes.

Não se registaram dores posteriores e nem mesmo antes elas foram sentidas, coisa associada às chamadas “doenças silenciosas”, muitas vezes as mais preocupantes porque de tardio tratamento.

E, a propósito e para terminar o registo desta efeméride, a referência à questão “sem dor” leva este jovem de ontem, que já se lembra de muitas situações de outros tempos, a recuar uns bons anos e recordar o episódio da à época humilde e idosa aldeã sua conterrânea, gente simples do nosso povo, quando descrevia a seu pai uma visita feita ao experiente e sempre extrovertido Dr. Cumbre, médico na sua concelhia Chamusca durante quase meio século, solicitando-lhe remédio que lhe eliminasse a súbita e sofrida dor sentida numa perna:

- Ò sr. Zé, eu disse ao sr. doutor que antes da dor nada me doía e estava tão bem e, sabe o que ele me respondeu?

- Ainda bem, rapariga, que estavas bem e que nada te doía antes! Olha lá: e… se estivesses mal e se te doesse antes, não era pior? Anda lá!… Vai à farmácia comprar essa injecção da receita e, lá no Chouto, o Zé Azevedo que te a dê.

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

CHEGA NOVA "LICENÇA", PARTEM VELHAS CATARATAS...

Nas madeiras como nas pessoas temos uma realidade indiscutível e inevitável: o caruncho sempre chega, mais cedo ou mais tarde. É assim e não o conseguimos evitar em definitivo pelo que só nos resta recorrer a remédios e outros preceitos na tentativa de ir adiando para que a data final surja o mais tarde possível. Nas madeiras, como nas pessoas.

É assim, não tem como evitar e não há alternativa e por isso esta velha carcaça não foge à regra.

Tendo começado a frequentar os senhores doutores há 4 anos, desde então não tem parado mais, numa sequência de consultas médicas, receituários, tratamentos e cirurgias em catadupa que mais parece um verdadeiro curso intensivo. Intensivo e… prolongado. Prolongado q.b.

Foram vividos nestes últimos dias mais uns quantos episódios dessa “empreitada” com análises, TAC, cirurgias e preocupações quanto baste e que terminaram ontem – por agora… - com mais um resultado final. 

Assim, fiquei a saber que a “figadeira” não criou mais qualquer “brinquinho” (notícia excelente!), pelo que a renovação da “licença” voltará a fazer-se daqui a 3 meses e, finalmente, ontem “mandei” embora a catarata de olho (direito) - a que faltava -, passando a beneficiar de uma visão que, francamente, não me recordo se alguma vez assim tive.

Encantado com os resultados obtidos não deixo de me lamentar por andar tanto tempo a ver coisas e objectos pessimamente quando tinha à disposição meios tão rápidos e eficazes que me dotariam de uma muito melhor qualidade de vida. Como assim andei tantos anos, é interrogação que faço a mim próprio...

Considero um espanto, um enorme espanto, as melhoras registadas e, dando graças à ciência, mais uma vez saúdo os senhores doutores, os homens e as mulheres que estudam e aprendem a cuidar e a melhorar a saúde dos seus concidadãos, proporcionando-lhes – quantas vezes sem a devida recompensa!… - uma melhor saúde, um melhor bem-estar e, tantas e tantas vezes, salvando-lhes mesmo as suas ameaçadas vidas!

Para a ciência, o milagre em que acredito e para os homens e mulheres que a servem e fazem evoluir todo o meu aplauso, todo o meu imenso apreço!  

domingo, 8 de novembro de 2020

VITÓRIA DA AMÉRICA E DO MUNDO!

 Ainda que a viver dias de alguma ansiedade por via de aguardar amanhã o resultado de mais uma TAC feita à “pecinha das iscas” e, logo no dia seguinte (10), a cirurgia ás cataratas do olho esquerdo, não pude deixar de me manter a pé até às duas da manhã de hoje para poder acompanhar os discursos de vitória nas eleições dos EUA de Joe Biden e da sua vice- presidente Kamala Harris, sobre aquela coisa que dá pelo nome de Donald Trump que, incrivelmente foi eleito há 4 anos tendo-se mantido na Casa Branca nos últimos 4 anos.


Sem me considerar minimamente sabedor da matéria mas sendo um atento observador do que vejo, ouço e leio, tenho como sendo um grande alívio para o mundo a vitória de Biden e a consequente saída de cena daquele incrível Trump inculto, impreparado, racista, xenófobo, ignorante, inconsciente e, sobretudo, sobretudo profundamente mentiroso. Um sujeito, um dirigente da craveira de um presidente dos EUA que consegue dizer num mesmo discurso tudo e o seu contrário sem se rir, num descaramento inimaginável para quem quer que seja que tenha dois dedos de testa, é algo impensável mas perfeitamente normal naquele ser.

Pensar que alguém assim venceu umas eleições para presidente da dita nação mais poderosa do mundo e, durante 4 anos rasgou acordos internacionais de enorme interesse mundial, usou o lugar e o poder para decisões xenofobas, racistas, inimigas do ambiente e do planeta e, finalmente, nos últimos tempos, criminosamente negou a evidência e a ciência para um necessário e imprescindível combate à terrível pandemia que já matou centenas de milhares de seus concidadãos e milhões de seres humanos no planeta, é algo impensável no mundo moderno e civilizado que vivemos nos nossos dias.


Com o sabedor, calmo e ponderado Joe Biden – que teve comportamento exemplar de serenidade, paciência e educação com o seu adversário nesta agressiva peleja – quero acreditar que voltará à América a decência, o respeito pela ciência e pelo ambiente, o não ao racismo e à xenofobia, a verdade e o respeito pela governação da sua nação e a cordialidade e o respeito no relacionamento internacional.

Para sair em “beleza” de cena e de forma a condizer com o seu permanente comportamento do dia a dia enquanto permaneceu na Casa Branca, o sujeito que foi seu inquilino vai ao ponto de não reconhecer a derrota argumentando com falsidades e vigarices na votação, sem que apresente uma prova, um documento que seja e indo ao extremo de declarar-se vencedor das eleições. 

A cereja no topo do bolo de alguém que de democrata nada tem e que, ou me engano muito ou, logo que saia do poder, terá sérias complicações com a justiça americana e mundial.

Se a justiça do mundo não for cega...

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

O 76º FOI DE... MÁSCARA...

Não bastavam as imensas convulsões que ao longo dos tempos e continuamente vínhamos tendo pelo mundo que, todavia e não obstante a sua gravidade, muito pouco ou nada incomodavam o comum cidadão da nossa terrinha, que tinha de chegar esta incrível e mortífera pandemia universal do Coronavírus que a todos atinge e a todos preocupa.

Desde Março último que todo o nosso viver se alterou radicalmente para muito pior e até mesmo dramático e, infelizmente, ninguém tem conhecimentos mínimos que sejam que nos possa garantir qual o futuro que vamos ter. E, e tudo parece indicar-nos que “a procissão ainda vai no adro”…

Todo o mundo receia contágios indesejáveis e todo o mundo anda de máscara colocada de Norte a Sul, de Este a Oeste e, por via disso, a comemoração do meu 76º aniversário de vida não poderia fugir à regra.

Se o ano passado foi uma bonita reunião de familiares e amigos num excelente restaurante lisboeta, este ano, forçosamente, foi num isolamento e numa restrição de movimentos importante e necessária.

Reunindo na garagem familiares mais
chegados
, usando todos máscara e com um bolo caseiro, por sinal excelente mas, onde,
por hábito e absoluta desatenção este aniversariante estupidamente soprou as velas (???) (chamado à atenção logo depois...já era tarde…) registamos em fotos para a posteridade - eu com o Rafael para manter a tradição e uma outra do pequeno grupo familiar - o insólito festejo e cada um regressou às suas residências, castrado de afectividade e calor humanos sempre usuais nos anteriores e já saudosos festejos de outros anos, mas resignados e até acalentados porque, apesar de cerceados nas celebrações e nos movimentos, vivemos ainda sem qualquer contágio e inevitável afectação na família.

Este ano, tristemente foi assim, para o ano logo veremos.

Bom, veremos isso se a minha “licença” se mantiver válida porque, se não…

Mas quero acreditar que a validade continuará e, regularmente, com a preciosa ajuda dos meus sabedores doutores, tudo continuarei a diligenciar para a manter. 

terça-feira, 27 de outubro de 2020

GUERRA COLONIAL - O ISOLAMENTO

Na sequência das toscas crónicas que venho alinhavando neste blogue sobre as experiências e vivências observadas e sentidas na guerra colonial que vivi, resolvo abordar desta vez o tema do isolamento sofrido por muitos militares em tão distantes e inóspitas paragens e que, segundo me parece, tem sido algo secundarizado quando se fala nas consequências psicológicas resultantes da participação na guerra, nomeadamente no tão falado “stress pós-traumático” e, todavia, segundo o meu ponto de vista que é fruto da experiência vivida e sentida, o mesmo talvez seja necessário considerar em dose, se não muito elevada, pelo menos considerável.

Pessoalmente não senti, nem proximamente nem mesmo distante no tempo essas consequências que muitos dos meus antigos camaradas participantes na guerra experimentaram e mesmo hoje ainda sentem nalguns casos demasiado evidentes, mas sei de alguns que, não o sofrendo em dose elevada, mesmo assim todos os dias, ainda agora, passados tantos anos, têm de falar na guerra e nos diversos episódios vividos e sentidos. Inadvertidamente, as suas conversas sempre resvalam para uma ou outra situação vivida na sua comissão de serviço...

Não sofri, nem felizmente sofro dessas perturbações mas recordo-me de um susto que senti dias após o regresso à minha aldeia quando, sentado à lareira, que tinha em aquecimento uma panela de ferro com água, a minha mãe destapando-a e os pingos da tampa caindo nas cinzas do borralho provocando o inevitável som “puf!, puf!” eu, que estava meio absorvido em qualquer pensamento, escutando os ditos cujos como “tau!, tau!” e, “ouvindo” o som de uma arma automática a disparar, dei um salto no banco onde me sentava. À interrogação/surpresa de minha mãe: “O que foi?...”, respondi-lhe de imediato, desvalorizando: “Nada! Nada!”.

E, também bem me lembro quando, mesmo depois de regressar e durante muitos e muitos meses, todas as noites – todas a noites! - sonhava com a guerra… Anos, diariamente, a ter sonhos relacionados com aqueles maus dias vividos, até que, sem que me apercebesse, assim tivesse deixasse de sonhar. Um dia, um belo dia, lembrei-me que tinham terminado esses sonhos de guerra... Porquê, não sei mas... talvez porque, como diz o nosso povo: “o tempo tudo cura”…

Todavia, o nosso isolamento naquelas terras “no cú de Judas”, vizinhas das denominadas “Terras do Fim do Mundo”, junto à fronteira com a Zâmbia – na ida demoramos uma semana inteira a fazer a deslocação de Luanda até ao destino! -, foi mesmo mais sentido nesse primeiro ano que ali permanecemos do que no tempo restante, já que, na segunda metade da comissão, instalados a cerca de uma centena de kms da capital angolana, com estadia em várias fazendas (de cana de açúcar, de bananas, de palmares, etc) e viagens frequentes a Luanda, o isolamento foi muito menos experimentado.

Mas, no Leste, durante 14 meses, esse grande isolamento aconteceu mesmo e todos o tentamos evitar usando as mais diversas distracções como desporto, música, leituras, escrita, etc.. Nada dado a música, (de ouvido que nem calhau…) pratiquei algum desporto (futebol e voleibol) e, sobretudo, para além da leitura (familiares e amigos enviavam-me alguns jornais e revistas), a escrita para muitos saudosos correspondentes na então chamada Metrópole, ocupava-me bastante tempo. Eram tantos os correspondentes que criei uma lista (cuja imagem aí deixo, onde falta a referência ao meu pai por me escrever amiudadas vezes), prática, eficiente e fácil, com uns símbolos que colocava à frente do respectivo nome e, assim, numa rápida observação, via se lhe devia carta ou aerograma (fica também a imagem deste famoso meio de comunicação escrita) ou se aguardava resposta do respectivo amigo… (Na época tirei a foto que aí deixo com a chegada de uma pequena aeronave que regularmente nos levava os sacos do correio naquelas distantes paragens.)

Ah, ainda sobre a lista adoptada com o rol dos correspondentes, devo referir que para as namoradas – que também me ocuparam algum tempo (perdido – infelizmente!… -  nos primeiros meses mas… isso são contas de outro rosário...), como é óbvio essas anotações não eram necessárias…

Mas – há sempre um “mas”… -. se é verdade que o isolamento a que fui sujeito não me provocou perturbações de maior, outro tanto não posso dizer de uma outra faceta experimentada com esse afastamento da civilização… Refiro-me à saudade imensa que, ao longo dos meses fui sentindo, de ver, de ver uma mulher… branca... Aconteceu de facto e, sem que isso tenha minimamente que ver com qualquer espécie de racismo, xenofobia, ou algo semelhante, num sentimento que não experimento na minha maneira de encarar o mundo que me rodeia, francamente. Mas que também não sei bem explicar, também confesso. Mas, racismo, não! Francamente. 

A falta registada por estar durante tanto tempo sem olhar as feições, o físico, a beleza, o riso de uma mulher branca, mexeu com a minha “caixinha dos pirolitos”, de verdade.

Em Lumbala, só me recordo de, branca, ver uma ou duas vezes, porque poucas vezes saía de casa, a esposa, baixinha e magrinha, do Chefe de Posto local e, no Chilombo. de mulher branca, só tinha a companheira do pequeno comerciante local que, certamente existia, mas de quem nem já me recordo…

Rapaz novo, saudável, ágil, de sangue na guelra – tinha na época 23 anos! - “artista” que sempre apreciou sobremaneira o sexo oposto, admirou e alimentou o olhar e o espírito com a beleza ímpar e gostosa das beldades desse seu tempo, passar meses e meses sem ver uma “branca”, foi por demais complicado.

Tão complicado que, quando, 10 meses passados no mato, este rapaz vai de férias a Luanda e, na sua primeira paragem o voo do “Noratlas” aterra no Luso, a 1º cidade da rota e o nosso jovem percorre a pé uma das suas ruas, vislumbra pela sua ampla montra, dentro de uma livraria, uma jovem moça branca – branquinha! Linda!- que, nas suas estantes arrumava uns livros ou coisa no género, o sôfrego e “castrado” moço pousa os cotovelos no varão que no exterior protege o grande vidro da montra, fica especado de “lanternas” fixas nas curvas da jovem moça, na face bonita, nos  cuidados e bonitos cabelos loiros e, ficando assim abstrato de tudo, de tudo e de todos à sua volta, deliciando-se com a "paisagem", só alguns bons e largos momentos passados “acorda” dessa sua “hipnose”, interrogando-se meio “zonzo” do "totiço": “É pá! Que se passa contigo, Victor?”…

Eh..., aconteceu mesmo assim, numa estranha situação que ainda hoje, tantos anos passados, está bem viva na minha memória. 

Danada de guerra!... 


quarta-feira, 14 de outubro de 2020

VINTE ANOS PASSADOS, OUTRAS CATARATAS...


Pois é… depois de há 20 anos – completam-se mais exactamente no próximo domingo, 18 – ter visitado com prazer e algum espanto as Cataratas Submersas no Rio Nilo, de que deixo aí foto ao lado, eis que, ontem, sou confrontado com as consequências de umas outras, bem mais inconvenientes e chatas, porque nas minhas duas “lanternas” faciais…

Há já mais de um ano que os médicos haviam alertado para inevitabilidade da sua remoção mas, a velha “istória” do “deixa andar”, do “pode ser que não seja bem assim”, fez com que a intervenção se tornasse inevitável face à muita deterioração da visão e, ontem, a operação aconteceu mesmo no Hospital da Luz (Oeiras). 

Entre os preparativos e a cirurgia, que me parece já corriqueira e algo fácil para os especialistas – os que, como sempre digo, merecem na realidade ser considerados de “doutores”, porque nos cuidam e curam das maleitas e tantas vezes nos salvam as vidas! - e demorou coisa e uma horita.

Para além da remoção da catarata foi-me implantada um lente intraocular, idêntica à da imagem ao lado e as dores da cirurgia foram nulas, ou quase.

E a verdade é que, chegado a casa e retirado o penso que me tornava um sósia de Camões, fiquei verdadeiramente pasmado com o resultado obtido: via espantosamente bem do olho esquerdo operado! Tudo claríssimo, tudo incrivelmente branco e os objectos de formas definidas como, francamente, nunca me lembro de ter visto.

Fiquei parvo com os resultados obtidos e não imaginava que o mundo fosse assim, de formas tão definidas, coloridas e fantásticamente luminoso. Lindo! Lindo!

Mas há um senão… Um senão e nada pequeno: prevejo que vou ter séria confusão na minha “caixinha dos pirolitos” durante o período que mediará esta cirurgia e a próxima ao outro olho  daqui a um mês. Vou andar com a cabeça à roda. Vou, vou...

Verdade que a jovem médica (Mafalda Mota), por sinal bem simpática e comunicativa, já me tinha prevenido que isso aconteceria mas, uma coisa é sabermos e, outra, bem mais desagradável, é sentirmos.

Será um mês bem complicado para o meu “computador craniano”, tanto mais que a minha falta de visão já obrigava ao uso de lentes de graduação elevada e, assim, o problema certamente sentir-se-á em dose maior, mas terei de me adaptar e, tentando contornar a situação o melhor que possa, atingir a desejada data da nova operação – então ao olho direito – com os mínimos inconvenientes que me for possível.

Mas a coisa não vai ser muito fácil e agradável…

Não, não...

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

AGORA NO ALENTEJO, NOVO ENCONTRO DOS VELHOTES...


Na verdade, quando em 2013, no encontro com os velhos amigos de infância, Tó e Zé Manel, ouvi este último falar de um herdade da família no Alentejo eu logo “lancei a escada” para que ele me conseguisse uma pescaria aos achigãs nas represas que eventualmente a propriedade tivesse  e tinha natural esperança que tal fosse possível, ficando à espera que o velho amigo me abordasse para a sua concretização.

Os anos foram passando, ia-me lembrando da situação mas, por uma questão de educação, jamais questionaria o Zé Manel porque não queria que me considerasse atrevido, se não mesmo descarado. 

Não fui nem o sou de todo e, assim, foi com redobrado prazer que dias atrás recebi do meu amigo a abordagem e o contacto esperado para avançarmos para a falada pescaria a que acrescentava também o almoço nas instalações da propriedade. Esta última proposta é que me deixou algo “sem jeito” porque, quando pedi a realização da pescaria, jamais queria incomodar quem quer que fosse e muito menos com a oferta da refeição. Tentei demover o Zé dessa intenção mas não consegui, tanto mais porque já havia decidido isso com a esposa. Foi acertada a data e o nosso desejado encontro e pescaria aconteceu hoje na herdade situada ali juntinho a Vendas Novas.

Foi também, claro, o Tó, velho companheiro de aventuras infantis que se fez acompanhar da esposa Ercília e, assim, à mesa do almoço com a Drª Graça, esposa do Zé Manel, ficou o ambiente bem mais leve, agradável e, evidente, bem mais bonito.

Saí de casa pelas 6,30 horas, ainda o dia estava a nascer e, passando pelo Carregado para tomada do meu cunhado Gilberto, que fez-me companhia, avançamos estrada fora na direcção do Alentejo.

Lá chegados, junto ao portão da herdade aguardava-nos pelas 8 horas o diligente amigo Zé Manel e, feitos os naturais cumprimentos – agora ligeiros, por causa do “bicho”…  - iniciamos a pescaria em 2 das 3 represas e, aí, nos seus desejados e esperados bons resultados que ansiávamos, é que a coisa falhou… Os achigãs não marcaram presença, os danados...

A excepção deu-se comigo que consegui a ferragem de um pequeno rapazinho, coisita aí com menos de ¼ de kg mas que, confesso, me surpreendeu pelo aspecto branco/acinzentado que logo relacionei com o fundo arenoso da represa. Muito branquinho o amigo achigã. Uma represa bem bonita, ainda com bastante água, em vista parcial a imagem que aí deixo.
 
Os restantes companheiros pescadores, Gilberto e Tó – aprendizes os rapazes… ihih – carregaram a “grade” para casa. Mas um deles ainda fez questão de, atrevidamente se fazer fotografar com o troféu, coisa que o grande pescador, que nem eu, minimamente se importou... Como é bem evidente, têm de aprender muito com o craque… ihih

Seguiu-se o almocinho e o convívio, em que recordamos mais um pouco da nossa infância no Bairro do Restelo (onde não faltou a lembrança do triste episódio quando, crianças de 12/13 anos, de calções e meinhas brancas, eu e o Tó fomos detidos na esquadra de Pedrouços, tidos como malfeitores, ladrões de carros, situação que conto aí no blogue noutra crónica e, entre outras recordações, lembramos também a velha, pequena, corcunda e sempre muito irada avó deles dois, a sua incrível tosse e as guerras por demais assanhadas que mantinha a toda a hora com a filha Ricardina, minha madrinha).

O nosso anfitrião ainda teve a amabilidade de nos oferecer mais uma viagem pela herdade e ainda pescamos – ou fizemos por isso, porque nada “deu” de interesse piscatório… - numa 3ª grande e bonita represa e regressamos ao cair da tarde a nossas casas.

É verdade que a pescaria foi fraquíssima, se não mesmo quase nula, mas ficou a bonita e gostosa jornada de convívio e confraternização de amigos, velhos e sinceros, num ambiente saudável e gratificante.

E, sobre os achigãs, paciência… Ficarão a crescer para premiar quem os ferre numa próxima…

NOTA – Para memória futura ficam as imagens dos 3 velhotes; de uma das represas e ainda do craque mais velho, concentrado na sua pesquinha.

domingo, 20 de setembro de 2020

AINDA A CARRINHA DA GULBENKIAN

Nas minhas já habituais e regulares incursões nas velharias de outros tempos que ao longo da vida fui preservando e que, agora, vou revisitando e finalmente agrupando e arquivando convenientemente e com algum método, coisa que nos tempos passados não fiz, estando ainda uma boa parte “a monte” e guardada sem qualquer critério ou organização, a que as sucessivas mudanças de casa mais baralharam e prejudicaram, encontrei agora uma interessante carta, de 1965, que aqui incluo com  gosto num seu pequeno trecho e que, revendo-a, deveras mereceu o meu apreço por a ter guardado.


É redigida pelo velho e saudoso amigo Zé do Areal (Custódio Marques Montargil, de seu nome de baptismo) que adoptou esse pseudónimo nas muitas crónicas que ao longo dos anos escreveu sobre a sua Chamusca em particular e o Ribatejo em geral para diversos jornais e, sobretudo, para a então “Vida Ribatejana”, de Vila Franca de Xira, amigo com quem, para além de contactos pessoais em Lisboa onde residia, também troquei vária correspondência ao longo dos anos, sendo que nesta carta aborda aquele saudoso amigo o caso da Biblioteca Itinerante, da Fundação Calouste Gulbenkian, que noutros tempos consegui que servisse o meu Chouto natal. 

Titulada “A carrinha da Gulbenkian”, já aqui escrevi uma crónica sobre o assunto, tendo-lhe anexado apenas o recorte do jornal da época onde inicialmente sugeria a visita da Biblioteca Itinerante ao Chouto e também o meu cartão de leitor mas onde faltava algo escrito que testemunhasse a minha diligência na deslocação da carrinha há minha terra, documento ou documentos que, face à “barafunda” que ainda tenho nas minhas velharias não consegui encontrar na ocasião da redacção da crónica, o que me fez confusão porque, recordo-me, naquela recuada data troquei sobre o caso alguma correspondência com a Gulbenkian no intuito de reforçar directamente o meu pedido uma vez que, provavelmente, o jornal não teria chegado à Fundação…

Nesta correspondência de Zé do Areal agora encontrada ele felicita-me pelo êxito da minha iniciativa, acrescentando mais umas palavras sobre o interesse da leitura e da instrução nas pessoas e do proveito que daí poderia advir para o povo choutense.

Escreve então Zé do Areal: 

"Meu amigo. Recebi a sua carta que li com atenção. É evidente que, quanto à sua acção em prol da ida da B.I. (Biblioteca Itinerante) ao Chouto só me regozijo com o seu triunfo e faço sinceros votos para que os choutenses se apercebam que a maior fortuna que se pode possuir é a Instrução e através dela a educação. Isto sim valoriza e impõe o homem que se esforce e se disponha a ir tão longe quanto possível. Todo aquele que só disponha de fortuna monetária está sujeito, perdida ela, a sofrimentos insuportáveis. Portanto parabéns pelo êxito obtido."

Sábias palavras que agora releio com agrado e que aqui deixo como pequeno mas gratificante testemunho de uma face do laborioso trabalho que ao longo da vida venho executando sem o mínimo interesse material e com o único objectivo de ajudar o meu semelhante e assim também servir as gentes e a terra que me foi berço.

Um sermão que, conforme costumo dizer ninguém me encomendou mas que me dá satisfação e prazer e, porque nasci assim, assim continuo e… provavelmente assim desaparecerei.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

PROVEITO DE FÉRIAS

Inevitável e desde sempre, quando parto para férias faço-me acompanhar de alguns livros para leitura nos momentos de ócio e, assim, televisão e notícias de tragédias, escândalos e tricas políticas ficam para preocupação muito secundária e, antes, prefiro ocupar o tempo com a leitura de um artigo ou outro de jornal ou revista e, sobretudo, o embrenhar-me no conteúdo de um bom livro, seja de romance, história ou análises sociais do mundo que nos rodeia.

Foi o que também fiz este ano e li num total para aí umas 1700 páginas dos livros que


escolhi.

Assim, reli mais uma vez Miguel Torga que incluiu um volume com os seus 8 primeiros Diários e ainda os 13º e 14º e li também a obra “Cinco homens que abalaram a Europa” da autoria do politólogo Jaime Nogueira Pinto, livro que tinha adquirido meses atrás e aguardava ocasião calma e despreocupada para o ler.

De Torga já aqui tenho confessado a minha preferência se não paixão pela sua leitura porque, para além de a sentir autêntica e genuína e embora reconheça que é bastante lúgubre e algo tristonha, o nosso transmontano escreve muitíssimo bem e muito se ganha com a sua leitura. Eu sou inveterado apreciador e admirador de Miguel Torga e adoro lê-lo.

Quanto a Jaime Nogueira Pinto foi a 1ª vez que o li e gostei. Esta obra, que nos fala de Estaline, Mussoline, Hitler, Salazar e Franco desde os seus nascimentos até às suas mortes, dá-nos conta das suas origens e das suas sanguinárias, se não loucas, vidas políticas.

O autor é um assumido homem de direita (evita por exemplo chamar de fascista ao regime de Salazar) e, isso, para além de já o sabermos de seus habituais debates políticos e artigos em jornais e revistas, é evidente nesta obra mas é sem dúvida um homem de vastíssimos conhecimentos da história política nacional e mundial de que este livro é um excelente testemunho com detalhadas narrações de encontros, reuniões e decisões políticas dos actores políticos naqueles agitados anos da nossa Europa, onde o autor nos fornece muitos e impressionantes detalhes, sinónimo de que se serviu dos seus vastos conhecimentos e muita documentação consultada para assim se expressar.

Foi portanto este o meu proveito literário destas férias, que duraram dois meses e dou o tempo por bem empregue. 

Descansei a cabeça e distraí-me. Foi bom!


domingo, 13 de setembro de 2020

NUMA FESTA ADIADA, O "DITO" DE UM AMIGO



Em tempos que já lá vão tive amizade e amiudado contacto com um conterrâneo do meu Chouto natal, amigo que, embora sofrendo de um pequeno desarranjo mental, era pessoa extremamente correcta, afável e amiga de todos os que com ele lidavam e conviviam.

Falo de situação vivida na minha juventude, adolescente e rapaz, coisa dos anos 50 a 70 do


século passado e que inclusive envolveu troca de vária correspondência quando me encontrava na Guerra Colonial, sendo o saudoso amigo sempre pronto a escrever-me para Angola, fazendo detalhadas descrições das envolvências da sua vida pessoal, laboral e igualmente das ocorrências na nossa aldeia, coisa que eu, lá bem distante, na solidão e isolamento do mato, apreciava.
 

A deficiência desse amigo, não sendo profunda, também não era tão leve quanto o mínimo aceitável mas, não obstante, o seu convívio era agradável e amigo e esse saudoso homem usava mesmo muitas vezes expressões que para sempre me ficaram na memória, sendo que hoje aqui deixo uma que me parece adequada ao assunto principal que nesta crónica quero abordar e que se prende com o adiamento da festinha da passagem do 3º aniversário do Grupo da minha terra (CHOUTO – NOSSA TERRA, NOSSA GENTE), Grupo que criei na net e administro com prazer e de aqui já tenho falado. Sempre temos festejado os seus aniversários e este de hoje não fugiria à regra, não fora o danado do “bicho” que no ameaça a toda a hora e em cada canto e que nos impõe isolamento e reserva, evitando contactos propiciadores de um indesejável contágio.

Usava então muitas vezes aquele amigo a sabedora expressão – ditado popular? - quando, forçosamente, tínhamos de adiar qualquer situação das nossas vidas, “Deixe lá amigo, porque há mais marés que marinheiros!...” e recordei-me dela quando dirigia este ano uma saudação vídeo ao Grupo, lembrando a efeméride.

Na verdade, sendo que custa bastante suspender o hábito de pessoalmente festejarmos o interessante aniversário, como já era tradição, as circunstâncias a isso nos obrigam porque, cumprir o que está recomendado oficialmente em domínio público e, sobretudo, preservar e cuidar bem da nossa saúde está, tem de estar, em primeiríssimo lugar.

Pessoalmente - e sei que em vários amigos e conterrâneos igual sentimento é vivido e disso vão dando expressão em mensagens ali deixadas ao longo deste dia -, custa-me bastante não realizar este ano a comemoração mas, por outro lado, sabendo do perigo do vírus e sendo a pandemia a nível global, com as naturais preocupações mundiais que a todos acarretam, já se fala muito numa eficaz vacina a surgir em prazo mais ou menos curto e, por isso, há que ter calma, resignação e... esperança.

Calma, resignação e esperança que, mais que nunca, para todos nós são bem necessárias, até porque, como diria o meu saudoso amigo, se ainda estivesse entre nós: “Deixem lá amigos, porque há mais marés que marinheiros!..”.

(Como “ornamento” do texto deixo um “boneco”, que fiz no “photoshop”, alusivo à efeméride.)

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

A CALMA BEIRA ALTA


Uns dias, como é habitual nesta época do ano, na calma e sossegada Beira Alta.

O recuperar de energias da azáfama e preocupações do dia-a-dia na grande cidade, num ambiente e num espírito que dá para ler, meditar, dormir e, até mesmo sonhar. Sonhar... não obstante a idade…

Não livre de um eventual contágio, claro, mas estamos talvez um pouco mais distantes do covid porque, para além de aqui pela aldeia não usarmos máscara por casa e no largo espaço seu envolvente, temos mais ar e mais liberdade de movimentos e só a ida às compras na vila recomenda e obriga o seu uso como importante medida de prevenção. E, na verdade, não fora as noticias da comunicação social, a net, os jornais, por aqui quase que dava para esquecer o danado do “bicho”...

Para quem gosta de leitura é um paraíso e disso tenho usufruído. Uns jornais, umas revistas e os inseparáveis livrinhos, fazem-me companhia permanente.

Acabei o grande volume que integra os oito primeiros Diários de Miguel Torga. Já os li, nem sei bem quantas vezes mas nunca me canso de saborear a sua rica escrita. Não obstante reconhecer que é algo lúgubre e triste – Torga fala da morte e da tristeza do existir vezes sem conta nas suas obras – acho-o de conteúdo muito rico na escrita e na discrição das vivências dos dias; de um português rico e exemplar e entendo mesmo que o mundo ficou a dever-lhe um Nobel, tão intensa, genuína e valiosa é a sua obra de prosa e poesia. Um senhor a escrever e a sentir, de uma expressão genuína e apaixonante, de que gosto particularmente.

Faria hoje anos se fosse vivo e não esqueço que tive a preocupação de propositadamente estar em Coimbra após a sua morte aquando da ida do seu corpo para S. Martinho de Anta, sua terra natal onde jaz.

Esta estadia por terras beirãs foi todavia um pouco agitada nos primeiros dias quando, depois de recebermos por umas quantas vezes na sala a visita de umas “simpáticas” vespas, que logo imaginamos “asiáticas” pelo seu porte e pela suas cores, descobrimos que tinham ninho, exactamente por cima das nossas cabeças, na chaminé da lareira.

Foi um bom bocado alarmante dada a envergadura das "meninas" - cerca de 4 cms (!) - e a robustez dessas sujeitas – só morriam depois de bem calcadas (!) - e também pelo natural receio de alguma picada…

Os serviços camarários foram prontos em socorrer-nos e, no cair de um dia, munidos de um comprido maçarico introduzido na chaminé em sentido descendente e depois no inverso (imagem junta), fizeram “churrasco” das indesejáveis visitas. Seriamos então esclarecidos que não eram “asiáticas” mas Vespa Crabro, de que aí fica uma imagem retirada da net.

De resto, aqui, nesta calma Beira Alta, os dias tranquilos e sossegados prosseguem, sendo quebrados a pedaços por uma ou outra visita de familiares e amigos que, embora sempre agradáveis, retiram um pouco o ambiente necessário para sentar e escrever uma linha, uma frase, uma crónica, coisa que sempre dá redobrado prazer a este pobre escriba.

sábado, 18 de julho de 2020

HISTÓRIA DE VIDA BONITA DE UM TEMPO FELIZ


Vivíamos pacatamente na nossa pequena aldeia na década de 60 do século passado quando, subitamente, surgiu na terra um grupo de forasteiros na sua totalidade composto por vários e diversos elementos de uma família de  artistas de circo de rua.

De imediato designados pelos moradores de “comediantes”, fizeram as suas primeiros exibições logo de seguida na nossa aldeia e percorreram mesmo várias terras vizinhas dando os seus espectáculos de rua e, de certo agradados com a hospitalidade das nossas gentes, resolveram mesmo fixar residência no Chouto, daí partindo para várias exibições pelos lugares em redor.

Na sua família algo numerosa destacava-se sobremaneira pela sua beleza, pela sua juventude, pelo loiro da sua farta cabeleira e, sobretudo, pela sua escultural figura física, a filha Graciete, de seu nome de baptismo. Era muito bonita, bastante esbelta e, como todos os restantes membros da família, extremamente educada e afável e, sempre de sorriso estampado, facilmente era figura que a todos cativava.

E cativava tanto ou tão pouco que o “João da Emília”, um dos 6 filhos do “Tio Alfredo Paneiro”, rapaz como os irmãos nascido e criado na terra, muito simples, pacato, algo “apagado” mas muito trabalhador e, como os restantes irmãos e irmãs, de reconhecida cortesia e educação e que se havia tornado motorista dos “artistas de rua”, se “embeiçou” de amores pela bonita e esbelta “Graciete comediante”, a contorcionista, a atracção maior da companhia.

Foi a bomba na aldeia e o falatório algo malicioso e de mau presságio que se calcula, com comentários jocosos q.b. que não faltavam.
- O quê? O pobrezinho e ingénuo “João  da Emília” a namorar a “batida e sabida” loiraça Graciete, filha dos comediantes??? Eh! Eh! Vai ser giro, vai! Coitado, não lhe gabo a sorte!...

E se estes nada favoráveis comentários são durante farto tempo o motivo de conversa de muitos, eles  mais se agravam quando o nosso “João da Emília” e a sua Graciete resolvem casar e avançar para o altar da igreja da aldeia para unirem oficialmente os seus destinos. Foi então um desfilar de suposições e “garantias/certezas” de todo o mundo local.

De todo ou… quase todo…


Na verdade, perante a necessidade de arranjar padrinhos para a união e observando em redor, a noiva Graciete recorre aos irmãos do noivo, Álvaro e Maria Irene e, ele, convida o amigo José Azevedo e esposa, comerciante, figura bem conhecida da região, de onde obtém o pronto sim, só com a pequena troca da “Menina Maria”, sua esposa, pela filha Adília.

E o casamento católico no templo local realizou-se e os jovens noivos assentaram casa na aldeia, perante muita incredibilidade e bastante expectativa de tudo e todos para os tempos que aí viriam…

E, volvidos 55 anos - passa hoje o 55º aniversário do casamento -, que aconteceu afinal?

Aconteceu que o “João da Emília” e a “Graciete comediante” depois de casados fizeram e criaram uma numerosa família de rapazes e raparigas, transmitiram a todos eles os valores nobres do trabalho, da educação, da cordialidade e da amizade e, pelo seu exemplo e honradez, desmentiram todos os velhos e antigos maus presságios e deixaram a exemplar lição aos que conheceram as suas origens e os seus alicerces, a certeza e a sabedoria da bonita construção das suas vidas em comum.

Vistas, testemunhadas e sentidas no conjunto dos seus concidadãos e amigos, de entre os quais me incluo com muito gosto!

Ao velho amigo João, muitos anos de vida, com saúde e bem-estar e à Graciete, que há pouco nos deixou, a paz eterna!

segunda-feira, 6 de julho de 2020

BOAS NOTÍCIAS - II "RECAUCHUTAGEM" 5 ESTRElAS!


Realizada a TAC pouco depois das 13 horas de hoje, ainda antes das 18 recebo telefonema do competente e sabedor cirurgião que me operou em 2017 e que com a sua equipa desde então acompanha a evolução do estado da minha pecinha das iscas, dando-me conta da boa notícia de que tudo está bem, dentro das limitações impostas pela doença da peça, o que quer dizer que o tratamento feito no final de Maio resultou em pleno.

Exultei de satisfação, como é fácil imaginar e esta feliz notícia aliviou-me sobremaneira da muita  ansiedade que sentia desde o dia que decidiram submeter-me à Quimioembolização até ao instante de hoje que soube que a mesma foi eficaz! 

Era uma ansiedade muito idêntica à sentida após a realização da 1ª TAC depois da cirurgia de 2017 – recordando-me bem que, o mesmo dr. que agora me telefonou, nas vésperas dessa cirurgia teve o cuidado de me prevenir que o sucesso da operação não seria propriamente “trigo limpo, Farinha Amparo”… - e ansiedade porque em ambas havia o desejo da eficácia das intervenções e, já se sabe, nessas situações sempre surge o receio do sofrido paciente de que algo não corra bem e o sucesso seja uma miragem.

Mas não foi o caso então, como o não foi desta vez  numa situação de opção de tratamento grande novidade para mim e certamente para o comum dos mortais leigos na matéria.

Atacar tumores malignos no fígado através de um cateter, talvez da espessura de um cabelo, que lhes leva a químio que os faz secar em poucas semanas, sem dor e sem que haja a habitual queda de cabelo no doente, era algo que desconhecia e de que beneficiei com justificado prazer! E o danado maior, que em Fevereiro tinha 2,8 cms agora, quando da intervenção em Maio, já se agigantara para… 4,2  cms… Mais um pouco e certamente o Victor não estaria aqui a regozijar-se…

Como sempre digo: graças à Ciência e aos homens e mulheres que estudam, que consomem dias e noites de exaustiva aprendizagem e saber e todos esses enormes conhecimentos põem posteriormente ao serviço de outros homens e de outras mulheres que padecem e dessa sabedoria beneficiam. E como mal remunerados esses senhores doutores estão!… 

E pronto!... Despachadinho – e mais levezinho de mente!… - fico a aguardar que daqui a mais 4 meses se volte a “espreitar” a pecinha das iscas, surgindo então nova ansiedade para verificar se novo “brinco” ela ganhou como adereço… 

Oxalá isso não aconteça mas há que estar precavido. Seria então uma eventual III “recauchutagem”… 

Mas, como ainda falta algum tempo, por agora vou… relaxar...

quinta-feira, 25 de junho de 2020

CHOUTO - VIVER SEM ELECTRICIDADE


Porque hoje passa o 48º aniversário da chegada da energia electrica ao meu Chouto natal, ocorre-me redigir meia dúzia de linhas recordando como foi nascer, crescer e viver até aos 27 anos de idade sem a preciosa electricidade que para outras terras e outras paragens vizinhas – ainda que não sedes de freguesia, como o pobre Chouto… - era bem de que há muito usufruíam.

E, porque o homem é animal que facilmente se adapta às circunstâncias, a coisa era sentida, se bem que com indignação, é verdade, mas também com a forçada conformidade porque havia que viver consoante as circunstâncias, tanto mais que outra solução não tínhamos…


Nas residências, nas 24 horas do dia, sentia-se a grande falta dos hoje tão normais e corriqueiros electrodomésticos - frigoríficos, televisores, rádios sobretudo - acontecendo que, com o pôr-do sol e o cair da noite, o problema se agravava sendo então necessário recorrer ao uso dos velhinhos candeeiros a petróleo que nos forneciam a pouca mas imprescindível luminosidade.

Nas ruas existiam uns quantos candeeiros públicos (meia dúzia, ou pouco mais que isso...) fixados nas paredes exteriores de algumas casas, alguns em gavetos de ruas, mas que nem todas as noites eram acesos. A Junta de Freguesia na época vivia com muita escassez de meios financeiros e o dinheiro para o petróleo faltava… Quando o havia lá ia então o zelador, o saudoso Raul dos Santos, de escada às costas tratar de abastecer e acender os candeeiros que tão úteis eram nas noites mais escuras. Não iluminavam muito, como é lógico, mas ainda assim eram úteis porque serviam de referência na escuridão. Nas noites de luar, sobretudo no Verão, a sua falta não era assim tão sentida, tanto mais que conhecíamos bem as ruas da aldeia.

(Mas, aqui para nós que ninguém nos ouve, as noites escuras e a falta de candeeiros acesos, também tinha certa utilidade para alguns personagens, sendo que estou a lembrar-me de alguém, “amigo do alheio”, que por sinal até estava bem referenciado mas que, ainda assim, uma vez ou outra actuava pela calada da noite escura… Mas, não era só esse cidadão que beneficiava da negra noite porque ela era também útil para uma ou outra paixoneta (eu soube de duas que disso “lucraram”...) que permitia que os “atrevidos” cavalheiros saltassem as “cancelas”… E havia disso na aldeia, sim… E, a propósito, alguém escrevia a este pobre escriba, que na época na guerra andava: “À noite, enquanto os pais dormem, ela abre-lhe a janela e ele salta para dentro”. É... a falta da luz electrica também trazia algumas vantagens…) 

Mas, fechado o parêntesis, retornemos à narrativa dos dias sem electricidade na aldeia…
Nos estabelecimentos públicos e sobretudo nos que funcionavam também de noite, caso de tabernas, barbearias, alfaiatarias, etc e até da Sociedade Recreativa então com muita actividade, era usado o chamado “petromax” que, embora consumisse mais que o tradicional candeeiro de torcida que usávamos nas casas de habitação, dava uma luz bem mais clara e intensa. Fazia um ligeiro ruído mas iluminava muito bem.

Nas nossas residências utilizávamos então os velhinhos candeeiros de torcida, sendo que havia os de pé alto, os mais utilizados, mas também existiam uns outros mais baixos em que a base de suporte era o próprio depósito do combustível. Esses, para melhor facilitar o seu transporte, tinham como que uma pega acoplada, assim como que fosse a asa de uma caneca ou chávena. Mas os mais utilizados eram sem dúvida os de pé alto, com alguns deles bem bonitos, por sinal. Deixo aí imagens de candeeiros que usávamos, inclusive uma de outro tipo menos usual mas que me lembro bem dos meus avós utilizarem não tanto em casa mas na rua e sobretudo nos palheiros, quando queriam visitar o gado. Tinham um arco amovível que servia de pega e eram mais práticos para transportar na mão e, na escuridão intensa, até produziam uma luz bem aceitável e facilitavam os eventuais movimentos manuais.

Mas não termino sem aqui deixar uma pequena lembrança que sempre me ocorre quando vejo os candeeiros a petróleo de pé alto que tão úteis tínhamos nas nossas casas.

Esses candeeiros eram os que usávamos em casa de meus pais, utilizando dois ou três, consoante as divisões que precisávamos de iluminar, sendo colocados habitualmente em cima de um móvel ou até mesmo na mesa da refeição para melhor vermos os alimentos. Em algumas casas usavam também colocá-los num pequeno suporto fixado numa parede da cozinha, evitando assim um ou outro toque e queda, com consequente quebra no solo.

Na época e porque na zona cultivava-se muito o arroz, abundavam as melgas que nos incomodavam por demais logo que a noite caía, acontecendo que, como não tinham luz nas ruas, elas infiltravam-se nas casas ainda que tivéssemos  a contínua preocupação de sempre manter portas e janelas fechadas.

Mas, as danadas, por aqui ou por ali, conseguiam sempre entrar e fortemente nos brindar com as suas horríveis picadas. Dizíamos então, vá lá saber-se porquê, que nos… mordiam.

Eu que tinha o hábito vindo de anos de sempre ler umas páginas de livro ou revista todas as noites antes de dormir, para as "fintar" usava um velho truque antes de adormecer, de forma que não me picassem durante a noite... E se só uma danada incomodava que se fartava, imagine-se um “enxame” delas como as que todas as noites me brindavam enquanto lia na cama… Zum, zum, zum!!! Ás centenas, as desgraçadas sobre a minha cabeça!…

E que fazia eu para as enganar, de forma a que me deixassem em paz durante o sono?

Os meus pais ensinaram-me desde miúdo e eu isso sempre fazia: Antes de adormecer levantava-me, pegava no candeeiro e colocava-o no corredor à saída da porta do quarto e encostava a porta de forma a ficar com uma pequenina fresta, de 2,3 cms. ficando portanto o quarto em semi-escuridão. Esperava uns curtos 2,3 minutos e as desgraçadas passavam todinhas para o corredor iluminado. Ficava então à  escuta e, não ouvindo uma única dentro do quarto, punha a cabecinha de fora da porta e… zás, soprava pela chaminé e apagava o candeeirinho, fechando de imediato a porta.

Era truque que nunca falhava e eu dormia sem a indesejável presença daquelas danadas.

E pronto. Aqui ficam umas pequenas historietas da infância e juventude do ”je” no pobre e enjeitado Chouto sem luz electrica e durante muitos anos abandonado pelas entidades competentes.

Mas eu, depois dos meus 15 anos, continuamente na imprensa não deixava que esquecessem a falta da luz no meu Chouto e martelava, martelava e martelava no assunto, até que em 1972 me calaram… 

A voz era fraquinha e o seu efeito seria mínimo mas o “charnequenho” abandonado ficava ciente que cumpria a sua missão...