quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

NATAL DE RECORDAÇÕES E EMOÇÕES


Quase igual a tantos outros já vividos ultimamente o nosso Natal deste ano, com as tradicionais Rabanadas, Sonhos, Mousses e bolos e doces diversos e, naturalmente, com o tradicional Bacalhau com Couves, na Consoada e o sempre indispensável Cabrito Assado no almoço do dia, cabrito que, a exemplo dos outros anos, fui buscar propositadamente a Vouzela, na nossa Beira Alta e, no jantar de hoje a inevitável Açorda, com o pão, as couves e o bacalhau restantes de ontem. 

E digo quase igual porque, desta vez, exactamente na manhã de hoje, o meu compadre Lenine resolveu pregar-nos uma partida  - ou melhor, o seu coração é que pregou a partida... A "máquina" ficou acelerada durante a noite e patrão Lenine teve de recorrer ao hospital onde esteve toda a manhã em exames mas felizmente logo teve alta e connosco saboreou o cabrito e as outras iguarias do almoço de Natal. O problema talvez tenha sido esporádico mas o amigo Lenine vai ficar atento e não vai descurar a situação.

Sobre então a forma como decorreu o nosso Natal e excluindo este preocupante percalço da saúde de compadre Lenine, tudo o  resto desenvolveu-se conforme o habitual. Houve a usual troca de prendas como é tradição mas, desde há uns tempos a esta parte, bem mais reduzida por via da pequenada ser cada vez mais escassa nestas nossas festas. Agora, no meu agregado familiar resume-se ao Rafael, com os seus 13 anos que, desta vez, entre outras lembranças, foi premiado com um agora indispensável computador portátil, coisa que o encantou, como é bom de imaginar. Mas também os menos jovens foram premiados e os dois casais de compadres, pais e avós, viram ser-lhes oferecido bilhetes para o belíssimo Cirque du Soleil, oferta que muito apreciaram, como se adivinha.

Mas, no tocante às sempre inevitáveis conversas nestas ocasiões, este ano houve a particularidade, aproveitada pelos avozinhos, para recordarem como em tempos  passados tinham presentes de Natal – ou não tinham… , como passavam os seus dias e a sua infância e juventude nas respectivas aldeias, com seus usos e costumes, que brinquedos usavam e como se divertiam ao longo dos dias. Bem interessantes diálogos foram travados porque, sendo os meus compadres naturais e tendo crescido na Beira Alta e eu no Ribatejo, já bem a Sul e quase Alentejo, tínhamos todavia vivências quase idênticas, embora aqui ou ali com alguns hábitos diferentes. 

Hoje e porque se completam 52 anos sobre o dia do meu “baptismo de fogo” na guerra de Angola, que me obrigaram a fazer, recordei os difíceis momentos passados e como deles tive o saber, mas sobretudo a sorte, de escapar com vida e hoje estar vivo para contar. 

Mas lembrei também o muito triste falecimento do meu saudoso pai, com a sua morte a 24, a noite de Natal a velar-lhe o corpo e a sepultura a 25, Dia de Natal de 1978. Coisa muito triste e ainda hoje difícil de lembrar. 

Resta referir que fica aí um registo fotográfico da nossa mesa na Consoada e... pronto, passou-se assim mais uma quadra natalícia, sendo que desejo e quero crer que outras se seguirão!

Se para isso ainda houver “licença”...

domingo, 15 de dezembro de 2019

A MINHA TERRA, SEMPRE A MINHA TERRA...


É isto: sou assim!… 

Sou assim mesmo, apaixonado pelo meu berço natal, acho que já faz parte do meu ADN e não há mais volta a dar.

Nasci assim ou, no mínimo, sou assim desde que atingi a idade da razão, aí pelos meus 14/15 anos e pelos vistos assim viverei até ao fim dos meus dias.

Comecei a fazer “garatujas” numas cartas que dirigia para a então “Vida Ribatejana”, jornal na época mais lido na região – o que aqueles homens me aturaram de palermices na altura, só mais tarde disso tive noção… - na sua redacção eles lá compunham os textos de melhor forma e mais tino e assim comecei a noticiar e a defender os interesses do meu Chouto natal.

Ninguém me encomendou o sermão e nem eu sei bem explicar de onde vem todo este amor e dedicação pela minha região e pela minha terra… É coisa de mim próprio. Do meu ser e não há que arranjar mais explicação ou dar qualquer volta. Não, não há.

Mas a verdade é que passaram mais de 6 décadas e aqui permaneço no meu posto, olhando a região e sobretudo a minha terra, interessando-me pelo seu progresso, combatendo o seu esquecimento e mesmo abandono pelas entidades oficiais, afinal como no antigamente.

Depois dos jornais, com milhares de horas consumidas ao longo dos tempos na elaboração de artigos, notícias e reportagens diversas – sempre grátis, sem auferir um cêntimo de proveito pessoal, sempre em apoio de causas sociais e sem alguma vez defender algo de meu interesse individual ou de meus familiares – eis-me agora de há uns anos a esta parte na net, este moderno e importante meio de comunicação em boa hora inventado. Se já pouco se leem jornais, outro tanto não acontece com a internet com a sua ampla implantação e generalização em todos os lares e mesmo no bolso de cada um. 

Para além de Blogue e Site pessoais onde publico as minhas ideias e as minhas notícias, criei um Grupo no Facebook para divulgação, defesa dos interesses da minha terra natal e convívio entre todos os seus naturais e amigos que a ele queiram aderir. Aconteceu já vai para 3 anos, dei-lhe o nome de CHOUTO – NOSSA TERRA, NOSSA GENTE e escrevo estas linhas ainda sob a emoção dos acontecimentos ontem vividos na minha aldeia.

É que o nosso convívio e a nossa amizade não é apenas virtual e, de há uns tempos a esta parte, partirmos mesmo do dito e do escrito nas telas dos computadores para a vivência pessoal, experimentada e sentida ao vivo, em carne e osso, entre todos nós.

Tenho organizado encontros da rapaziada de minha idade para revivermos tempos passados nas ruas, largos, montes e vales da nossa aldeia, convívios que titulo de “ GRANDES ENCONTROS DE JOVENS DE ONTEM” e este ano parti para a realização de convívios de Natal, tendo ontem ocorrido o 1º com um bem agradável sucesso e cuja vivência e feliz experiência ainda sinto hoje, passadas 24 horas.

O objectivo é a convivência e felicitações na época festiva e, ao mesmo tempo, tal como nos encontros dos “Jovens de Ontem” contribuirmos com ofertas de géneros alimentícios para o modelar Centro de Acolhimento Social em boa hora criado na terra e que tão bem dirigido é.

Ontem tivemos então o 1º “CONVÍVIO DE NATAL 2019 C/ “BOAS FESTAS” AO C.A.S.C.”, como o titulei e foi um verdadeiro e bonito êxito!

Os 39 aderentes - e houve alguns amigos que, não podendo comparecer, fizeram questão de igualmente contribuir -, reunimo-nos no restaurante da aldeia onde degustamos um delicioso e farto "Cozido à Portuguesa”, divertimo-nos com canções várias interpretadas por alguns dos convivas – eu aí não pude dar uma ajudinha, pequena que fosse, por via de ter uns ouvidos que, para a música, são uns verdadeiros calhaus… - e, depois, partimos para o Centro Acolhimento carregando as prendinhas, onde nos aguardava o Presidente da sua Direcção e algumas das colaboradas da Instituição que tão bom serviço presta às gentes da minha terra.

Recepção sempre gentil e amiga, como é usual naquela casa, a que se seguiu a nossa visita e naturais votos de Boas Festas aos utentes do Centro que nos aguardavam.

Foi uma cerimónia muito bonita, muito reconfortante e até emocionante por ser a 1ª vez que aquilo fazíamos, por nos conhecermos mutuamente visitantes e visitados e por sentirmos e experimentarmos um delicioso calor humano que nos fez ali conviver e depois retornar aos nossos lares de corações cheios! Cheinhos!

Bonito! Útil! Emotivo e gratificante!

Acho que ficamos todos de parabéns e não duvido, pelas reacções registadas que, para o ano, voltaremos a realizar este convívio e esta visita e igual colaboração com o nosso Centro e certamente teremos ainda maior participação, a julgar pelas reacções que vão chegando.

E a minha paixão pela minha terra e suas gentes continuará sempre, sempre. 

Nem poderia ser de outra forma. 

Faz parte do meu ADN.

NOTA FINAL – Deixo imagens de parte das prendinhas oferecidas, do excelente Cozido servido e da amena cavaqueira vivida. Um vídeo da entrega das prendinhas pode ser visto aqui.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

JOSÉ AZEVEDO, O PASSARINHEIRO


Homem multifacetado na sua actividade laboral e comercial, José Azevedo criou e desenvolveu comércios vários e exerceu muitas e diversificadas profissões, desde vendedor de máquinas de costura, rádios transístores e electrodomésticos, matança e talho de carne de porco, receptador e negociante de cereais e até criador de largos bandos de frangos em aviário, galinhas poedeiras, coelhos, bovinos, cabras, borregos e até chinchilas, tudo Zé Azevedo exerceu com o propósito único e natural de melhor viver e criar mais bem estar para os seus. 

Homem de muito trabalho e bastante saber, por incrível que pareça ainda tinha tempo de recrear-se e divertir-se com o seu “hobby” preferido: os pássaros. Capturar ou comprar e fazer reproduzir em cativeiro as mais diversas espécies, mais ou menos autóctones, mais ou menos exóticas, era a sua grande distração, era o seu grande prazer. 

Com a evolução das mentalidades, com a edificação de uma nova cultura em que possuir aves e animais em cativeiro é condenável e mesmo proibido, viver hoje com esse gosto e prazer criaria a José Azevedo sérias contrariedades com as autoridades e até mesmo, naturalmente, com o seu semelhante.

Então, construiu mesmo no quintal da sua residência, primeiro em armação de madeira e rede fina e, em fase posterior, com sólida estrutura de ferro, amplas gaiolas de vários metros quadrados de área onde a passarada vivia e procriava, nalguns casos em bandos, como acontecia com os periquitos. 

Tinha as mais diversificadas variedades de pássaros que iam dos pequeninos bicos de lacre, até aos robustos faisões de várias raças, passando por pintassilgos, canários, periquitos, verdelhões, cardeais, melros, perdizes, patos, rolas, pombos diversos e até gralhas que, pacientemente ensinava a palrar e, muitas, muitas outras variedades de aves. Mais à frente no tempo e numa nova propriedade de terreno virgem que adquiriu noutro local da aldeia, nela voltou a construir casas, pavilhões e gaiolas com mais pássaros e, vedada que foi a propriedade, ali chegou a ter pavões, patos diversos e mesmo coelhos à solta que procriavam e viviam em buracos que escavavam no solo. Ficam aí algumas imagens desse diversificado conjunto de aves, junto das quais surge o então seu pequeno neto Nuno, igualmente grande apaixonado de aves e outros bichos.

Mas, a sua grande paixão era mesmo as aves e, para além das que adquiria com regularidade em casas especializadas e noutros criadores, ia mesmo à sua caça com armadilhas de rede que ele próprio criava. Nessas capturas, visco nunca usou, exactamente porque temia esquecer-se dos locais onde o aplicava e assim deixar alguma ave morrer de fome e sede e, quanto às armadilhas, usava-as em pequenas poças de água da chuva, nas estradas de terra junto à aldeia de sua residência. A “tampa” da estrutura da armadilha era elevada do solo no local da poça e suportada por um pequeno segmento de ripa de madeira, ligado por um cordel até ao seu esconderijo onde se mantinha atento ao movimento dos pássaros. Detectadas que fossem a aves a beber ou a banhar-se, José Azevedo puxava pelo cordel o braço/suporte que deixava cair a parte superior da armadilha, assim aprisionando as aves. Hoje, esta captura seria totalmente inviável mas, na altura, tudo e todos achavam bonito ter um passarinho na gaiola, fixada numa parede ou dependurada num qualquer suporte. E, quantos melros, retirados pequeninos dos ninhos, não criou José Azevedo alimentando-os à colherada pelo bico abaixo, com arroz, massa, batata, da sua comida caseira? Por incrível que pareça  muitos, imensos! E tudo na época legal, aceite, aprovado e bonito!… Na verdade, o que era aceite e compreendido ontem ao progenitor do autor destas linhas, hoje acarretar-lhe-ia grandes complicações e dissabores e seria mesmo impraticável, porque proibido.

Mas as aves eram tratadas com o maior carinho e desvelo e o nosso amigo tinha mesmo literatura que o ajudava a mantê-las e reproduzirem-se, literatura que veio mesmo até aos nossos dias e de entre a qual se destaca o “Manual Prático do Passarinheiro”, obra que lhe foi oferecida em 1956 pelo dr. Benjamim Amaral Neto, figura destacada na Chamusca de outrora, de cujo livro aí se deixam duas imagens. 

Para além disso José Azevedo trocava correspondência e conhecimentos com outros criadores de aves, de onde sobressaia por exemplo muitas trocas de ideias e animais com pelo menos dois criadores de faisões do nosso país. Neste caso dos faisões tinha mesmo, de propósito, reservadas para chocarem os ovos das fêmeas, pequenas garnisés, sendo que realmente muitos faisões fez nascer e criou e só uma espécie não conseguiu que procriasse: o prateado. Nunca José Azevedo conseguiu criar no aviário faisões prateados. Nem isso, nem canários, acontecendo que, neste caso dessas avesinhas amarelas, achava que a sua multiplicação era muito melindrosa.

Tanta bicharada, para além do muito e atento trabalho que exigia, obrigava igualmente ao dispêndio de consideráveis verbas mas, que recorde ao escriba destas linhas, jamais lhe foram ouvidos lamentos, queixumes ou a mais pequena vontade de desistência de tão bonito aviário. 

Um dos alimentos que “descobriu” para aliviar tamanha despesa com a alimentação das aves, sobretudo dos “bicos” mais miúdos, era a milhã, erva daninha que crescia espontânea em grande quantidade nos cômoros dos canteiros dos arrozais que na época abundavam na zona. As sementes da erva assemelhavam-se a alpista e as pequenas aves, com destaque para os periquitos, comiam-nas como tal.

Mas, na verdade, José Azevedo não se queixava da despesa que tinha com o aviário, talvez pelo muito prazer que lhe dava esse seu “hobby”, prazer que igualmente por vezes transformava em divertimento, como o daquela vez que se lembrou de pegar numa bisnaga de guache vermelho do estojo de desenho escolar deste escriba e, dissolvendo uma porção na água de um recipiente, resolveu banhar nela um periquito branco. A pobre avezinha ficou cor-de-rosa e, como resultado disso e porque espalhou-se a notícia de que “o Zé Azevedo tem um periquito cor-de-rosa”, foi divertido observar a curiosidade de muitos visitantes que queriam ver um periquito de cor… rosa. Mas o nosso passarinheiro não gostava de aldrabar as pessoas, não gostava não e, antes que se fossem, confessava a sua brincadeira ao visitante. E o periquito rosa, foi tomando banho dia-a-dia em água límpida e, pouco a pouco, foi ficando… branco, a verdadeira cor da sua plumagem.

Mas não ficaria por apenas essas cenas mais ou menos hilariantes com situações resultantes do “hobby” e aqui se recorda aquela em que o nosso passarinheiro viu surgir-lhe à porta dois militares da GNR que, depois de o saudarem interrogando:
- Como está sr. Azevedo? - lhe solicitam:
- Sabemos que tem um aviário com muitas aves, será que nos deixa visitá-lo?

O sr. Azevedo, que de ingénuo pouco tinha, achou logo que aquele pedido para apreciar o aviário trazia... “água no bico” e respondeu-lhes de pronto:
- Com certeza! É um prazer! Façam favor de entrar!…

Atravessaram a residência e chegaram ao quintal,.quedando-se então por alguns minutos vendo as aves e, findo uns instantes, observa-lhe o cabo da patrulha:
- Vejo que o sr. tem aqui perdizes...
A que Zé Azevedo de imediato respondeu:
- Pois tenho! Um casal e ando a ver se consigo que se reproduzam…
- Mas sabe que é proibido ter perdizes em cativeiro?
- Sei, sei! - admitiu de imediato o nosso passarinheiro..
- Pois, sendo assim, lamento mas terei de lhe levantar um Auto que lhe acarretará algumas consequências.

O atento Azevedo já esperava por aquela informação e respondeu-lhe de pronto:
- Se fosse a si não passava já o Auto porque, se esperar uns instantes, pode ser que eu lhe evite esse trabalho…
E, dito isto, entrou em casa, foi ao escritório e trouxe aos GNRs a Autorização, de 10/8/1955, da Comissão Venatória Regional do Sul, que aqui se junta.

Os homens viram a Autorização e pediram desculpa pela sua desconfiança, confessando:
- Sr. Azevedo, cumprimos ordens!
- Eu sei que cumprem ordens e fazem bem mas agora peço que digam ao vosso Comandante que mude de informador porque este é fraco.
- Na verdade, foi uma denúncia mas, como é que sabe isso?
José Azevedo não desarmou e...
- Sei que foi uma denúncia e acho que sei quem a fez mas… errou. Teve azar!

E, quando os GNRs viraram costas, diz a crónica, José Azevedo rebolou-se de gozo...

Na verdade José Azevedo era um homem profundamente legalista e, sabendo que tinha gente que dele pouco gostava, procurava nunca “pôr o pé em ramo verde”…

Mas a história das perdizes em cativeiro e da autorização para isso, ainda tem mais um curioso e interessante episódio...
A autorização restringia a apenas um casal de perdizes o seu cativeiro e o nosso passarinheiro pretendia que se reproduzissem, tendo desenvolvido para isso muito trabalho e dedicação durante alguns anos até que, finalmente, conseguiu os seus intentos e o casalinho teve uma “linda ninhada de perdigotos”, nas suas palavras, na carta que abaixo se refere. 

Como Zé Azevedo não tinha licença para os possuir, tratou de voltar a escrever à Comissão Venatória, por carta de 5/8/1963 bem redigida, argumentando que lhe haviam dado muita despesa, trabalho e dedicação, sendo alimentados “com farinha própria e ovos cosidos” pelo que gostaria de os guardar em seu poder e, porque “não os quero para eu comer” por “não sendo capaz de os matar” e ainda que, libertando as pequenas crias estas “não saberão procurar comida e em breve serão devoradas  pelos milhafres e outras aves de rapina que abundam nesta região”, o nosso amigo pedia autorização para os manter no aviário.

A Venatória, entendeu a situação, compreendeu a estima do passarinheiro pelas aves e prontamente lhe enviou nova Autorização, esta já especificando que era para “guarda de perdizes que se destinam a reprodução para repovoamento”.

José Azevedo ficou satisfeitíssimo com a nova e alargada autorização e teve mesmo o cuidado de escrever nova carta à Comissão Venatória oferecendo-lhes – pasme-se!… - um casal de perdizes. Isso mesmo, por incrível que pareça: um casal de perdizes oferecidos à Venatória… Os homens ficaram encantados com a gentileza e, educadamente, responderam-lhe na volta do correio “cumpre-nos agradecer muito penhoradamente a oferta” mas, uma vez que “estão devidamente instaladas não é conveniente por motivos de ordem tecnica mudar-lhe agora as condições de “habitat”. 
Assim mesmo, gratos e talvez surpreendidos com a oferta do cavalheiro Azevedo. 

E, para encerrar esta já extensa crónica, resta acrescentar que o “hobby” preferido do nosso amigo, terminou de forma dramática…

Com 62 anos José Azevedo partiu desta vida, prematura, repentina e tristemente para todos os seus entes. A sua dilecta companheira de sempre, a doce e sofrida Maria do Rosário, fez questão de manter todas as aves do querido esposo e isso aconteceu durante muitos meses até que, bruscamente, numa escura e dramática noite, o irado cão do casal de vizinhos da casa contigua à sua e que, com Maria partilhavam as traseiras das residências na nova propriedade criada por José Azevedo, forçou e quebrou a corrente que o prendia, correndo rápido para as gaiolas que arrombou com grande violência, tendo liquidado e devorado tudo o que mexia. Tudo, tudo! Não ficou um bico vivo!

Maria do Rosário não se apercebeu de tamanho drama durante a noite e, de manhã, quando viu horrorizada o terrível espectáculo de faisões, pombos, galinhas, patos e demais aves, tudo dizimado, ficou em choque e o caso não era para menos. 

Num pequeno  e dramático instante findava assim todo o bonito “hobby” do seu  querido Zé e ela nem queria acreditar…

Chorou. Chorou muito a sofrida Maria, tendo de imediato recebido o carinho e o alento de família chegada e mesmo afastada e de muitos amigos solidários com a sua grande dor e, com o tempo, que tudo ameniza nos espíritos, foi-se conformando com a triste realidade.

Marcá-la-ia entretanto para todo o sempre, além do grande desgosto pelo ocorrido, a atitude dos vizinhos, donos do cão: deles, nem uma palavra de pedido de desculpa... 

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

DOIS ANOS DE "RECAUCHUTAGEM"!


É verdade que tenho mais um ou outro queixume de, dor aqui, maleita acolá, por via dos dois anos já decorridos sobre o corte dado à figadeira mas, na realidade, pelo que dizem os regulares exames feitos e por nada sentir que me apoquente sobre o caso, não há a mínima dúvida que valeu a pena a melindrosa intervenção sofrida, exactamente faz hoje 2 anos. 

Alertava-me dias antes o sabido e experiente cirurgião que, com mestria e muito saber “trabalhou” o ofendido fígado, que a intervenção não seria “trigo limpo, Farinha Amparo”, na conhecida expressão de que o sucesso da operação não tinha plena garantia de sucesso mas, felizmente, o êxito foi mesmo total.

Quando, pelas 10,30 horas, naquela manhã de 15/11/2017 me levaram para a cirurgia, eu ia plenamente informado do grave mal de que padecia mas, também, porque sempre confiei e confio na ciência e no saber dos homens, ia calmo, bastante calmo, convicto que o bom sucesso aconteceria e ponderando que, se isso não acontecesse, talvez não acordasse mais.

Mas correu tudo bem e, mercê dos muitos conhecimentos da medicina actual e graças às imensas horas de estudos dos homens e mulheres ao longo dos tempos foi possível, apenas com 3 furinhos na minha barriguinha, cortar e retirar o danado do tumor maligno que ameaçava enviar-me mais cedo para o triste e lúgubre “jardim das tabuletas”.

Não foi dessa e um dia será mas, enquanto por cá andar e que seja como até aqui, a coisa valerá a pena e, desta forma, arranjaram-me motivo para, anualmente, em Novembro, festejar o nascimento e… a “recauchutagem”.

Para “ornamentar” esta crónica e ainda que ponha em dúvida o gosto da sua publicação, escolhi mesmo assim uma imagem da barriguinha (?) do rapaz com os 3 furinhos fechados pelos agrafos que os ajudaram a cicatrizar. E, francamente, pouco ou mesmo nada me doeu.

E, como foi possível, apenas com esses furinhos, ver e retirar com pleno sucesso um tumor de 4 cms que teimava crescer e acabar com o seu “hospedeiro”, é coisa que admiro, que me espanta, que agradeço e louvo o saber e o conhecimento de homens e mulheres que me merecem a maior admiração e o mais elevado respeito!

domingo, 3 de novembro de 2019

3/4 DE SÉCULO!


E aí estão os  ¾ de século em cima da carcaça do rapaz! E, para falar com franqueza, quando há cerca de 3 anos começaram a aparecer-me as maleitas e, sobretudo, quando soube do grave problema na peça das iscas, cheguei a temer não atingir esta “simpática” marca… Mas, felizmente, atingi.

Hoje e recordando os anos passados e os dias e meses que voaram, lembrando-me de factos, acontecimentos, alegrias e tristezas vividas, não quero dizer como é hábito que me parece que foi ontem mas, andarei talvez por muito perto se confessar que acho o tempo entretanto decorrido foi muito, muito curto. Muito curto!…

A infância e a juventude no meu Chouto natal, a vida militar com a guerra incluída, a vida profissional muito activa, a família com esposa, filhos e neto, não foi ontem não mas, mas passou muito depressa… 

Dir-me-ão que passaram 6, 7 décadas e que isso já é um tempo considerável mas eu entendo, eu sinto, que foi tudo, tudo muito curto. Caramba, terrivelmente curto!

No festejo deste ano, como o dia 2 correspondia a um sábado e desejando fazê-lo a um almoço e vindo nesse dia da Beira Alta era coisa que não dava muito jeito, optamos por um adiamento de 24 horas e hoje celebramos em família, com um excelente rodízio de carnes num bom restaurante (Chimarrão) do Parque da Nações, em Lisboa, os meus 75 aninhos.

 Foi muito bom, como seria de esperar e, eu, para melhor festejar – sem abusar minimamente!… - saboreei 2 ou 3 cms no fundo de uma taça de um saudoso Borba alentejano. E o tintinho estava divinal!... Todavia, infelizmente, só provei... 

Num gesto que muito me sensibilizou e já perto do final da refeição, juntou-se ao meu grupo para festejar com um cafezinho e um whisky, o meu velho amigo e conterrâneo Armando Jorge de quem já tenho falado aqui no meu blogue em anteriores crónicas, rapaz que animou a nossa reunião, num convívio muito gratificante!

Deixo aí, não só as habituais imagens destes tradicionais festejos com os confraternizantes à mesa e o “obrigatório” registo com o cada vez mais crescido neto Rafael como também uma outra da família no passeio pelo Parque das Nações.

E, pronto! Para o ano quero acreditar que haverá mais…

Só peço “um” de cada vez e, se for no mínimo com a abalada saúde estabilizada como até aqui, tanto melhor!...

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

A VELHINHA APOSENTA-SE...


Pelas notícias recentes ficamos a saber que vai sair do uso do exército português a velhinha espingarda G3, fiel companheira de muitos milhares de jovens compatriotas que fizeram as guerras de África entre os anos 61 e 74 do século passado.

Naturalmente, também eu, tendo andado naqueles “trabalhos”, tive por obrigatória e gratificante companhia esta “menina”- a “canhota”, como então lhe chamávamos - e, como tal, não posso deixar de experimentar alguma nostalgia quando vejo que, alguns anos depois de mim, também a fiel G3 passa à reforma.

Os dias passados e o tempo decorrido, dão azo a estas sensações a que de há muito já me habituei… É a vida das pessoas e das coisas... Inexorável.

Mas, meditando nisso, também dei comigo a pensar que, decorridos todos estes muitos anos após ter deixado a “canhota” em Luanda, possivelmente para que logo depois um outro novo mobilizado dela tomasse posse, já nem me recordo bem – quero dizer, não me lembro totalmente… - das suas diversas peças e do seu funcionamento.

Eu, que tantas vezes a montei e desmontei e que, inclusive, dei ensinamentos e instruções da amiga G3 a muitos soldados, hoje já não me recordo em pleno de todos os seus componentes. Com uma revisãozinha ia lá mas, assim a uma 1ª ou 2ª tentativa, reconheço que não conseguiria. São muitos anos de “separação” da “menina”…

Mas era uma “menina” muito fiel e fazia-nos companhia para todo o lado desde que saíssemos do arame farpado - quero dizer, do aquartelamento - e, mesmo em diversas situações lembro-me bem de a ter como dedicada companheira enquanto dormia. No Muaco, por exemplo, ficava encostadinha às paredes de madeira da barraca do destacamento e, quando passei umas noites numa pequena tenda, dando protecção a uma velha máquina de movimentação de terras, a amiga G3 “dormia” ao lado de mim e dos soldados que me acompanhavam. Também na Fazenda Lifune, de noite, cujo quarto de dormir ficava um pouco afastado da camarata dos soldados, a amiga sempre estava encostada junto à mesinha de cabeceira.  Mas nunca me foi precisa, felizmente!


Mas tive uma situação em que nossa “canhota” foi simultâneamente útil e… perigosa. Aconteceu quando tive o meu chamado baptismo de fogo em 25 de Dezembro de 67, dentro do arame farpado em Chilombo, lá no “cú de Judas”, no leste angolano. Desarmado, porque estava no aquartelamento e “maçarico…, vinha de beber umas cervejas na “venda” de um branco que ali estava  estabelecido na companhia de um fuzileiro que, ele sim, levava G3 ao ombro. Na noite escura vínhamos conversando a caminho das nossas instalações quando “elas” começaram a cantar vindas da nossa esquerda, para lá da cerca de arame farpado que ficava 50 ou 60 metros.  Porque os sujeitinhos atacantes ouviam a nossa voz no silêncio da noite escura, os tiros vinham bem dirigidos a nós e, antes de os dois nos atirarmos para o chão, o fuzo ficou apenas como gargalo da garrafa de bagaço que trazia mas, como era bem experiente naquelas andanças, de imediato destravou a G3 e começou a responder ao tiroteio e, aí, o foguetório tornou-se ainda mais intenso sobre nós. Os gajos viam os fogachos da G3 do amigo fuzileiro e tomaram-nos como alvo e, aí, o furriel “maçarico” ficou bem mais preocupado e tratou de rastejar o mais depressa possível para fugir daquela encrenca. E, felizmente, nem eu nem o meu companheiro fomos molestados. E foi assim que amiga G3 foi em simultâneo útil – muito útil! - mas também perigosa.

E pronto. Agora vai para abate depois de ter cumprido brilhantemente a sua importante missão na guerra.

Outro tanto não pode dizer-se dos homens que a fizeram usar…

NOTA FINAL – Ficam duas imagens em que a minha fiel amiga me fez companhia. Uma, quando regressamos ao quartel no dia festivo de 11 de Outubro de 1968 em que passava um ano de comissão e sabíamos da saída daquele inferno para outra zona mais calma e menos perigosa e, uma outra quando, cansados e abatidos, chegamos à segurança do aquartelamento vindos de um patrulhamento nas matas de kms que perigosamente o circundavam.

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

UMA DATA SEMPRE LEMBRADA


Na verdade, sempre que anualmente atingimos o dia 11 de Outubro, inevitavelmente vem-me à memória a mesma data de calendário mas do ano de 1967, dia em que, mobilizado, me meteram num barco (Paquete Niassa) atracado no Cais de Santa Apolónia, em Lisboa, com destino a Angola para aí ir fazer a guerra.

Denominava-se então pomposamente de “mobilização” o acto forçado de irmos combater e, para o caso de não gostarmos do “convite”, só tínhamos a fuga para o estrangeiro como alternativa... E ainda houve muitos que, durante os 13 anos que duraram as guerras em Angola, Guiné e Moçambique, optaram por essa dolorosa alternativa.

A viagem até Luanda, com duração de 11 dias, correu muito bem para os graduados (oficiais e sargentos) alojados em 1ª Classe e Turística respectivamente e tomando as refeições de optima qualidade no excelente restaurante do paquete. Eu (furriel) viajei numa cabina com mais 3 meus camaradas de igual graduação. 1 beliche de 2 camas de cada lado, corredor ao meio e sanitários ao fundo. Os oficiais, porque em 1ª Classe, talvez tivessem mais um pouco de comodidade mas pouco mais seria, penso... Juntávamo-nos e comíamos por igual no mesmo restaurante.

Mas, se nós graduados, viajávamos assim bem instalados e com boa comida, outro tanto não se passava com os pobres soldados que, dormindo em beliches encavalitados uns em cima dos outros nos fundos porões do barco, só viam luz e sol e respiravam algum ar pela abertura existente no seu centro e por onde habitualmente se fariam as cargas e descargas do paquete. Positivamente e na verdadeira acepção da palavra, os nossos soldados viajavam que… nem gado.

A ementa do jantar de despedida no Niassa
A ventilação, feita exclusivamente por essa entrada dos porões era praticamente nula, o calor era insuportável e, juntando a isto o cheiro a azedo dos vómitos de alguns mais incomodados com os balanços do barco e os fraquíssimos locais para se executar a higiene pessoal e tendo também ainda em conta que uma grande percentagem desses rapazes, vindos de pobres aldeias do Minho, não teriam muitos esses hábitos, o cheiro naqueles horríveis espaços era absolutamente insuportável. Fui lá duas ou três vezes em serviço e achei incrível que se transportasse e mantivesse seres humanos naquelas circunstâncias. Verdadeiramente inadmissível!

Mas, se isto já era horrível, o cenário ainda se agravou e complicou muito mais quando os nossos pobres soldados, aí pelo meio do viagem, sofreram uma... intoxicação alimentar. Então, foi o caos absoluto! Naquelas condições higiénicas era impossível e desumano ter rapazes ali a rebolarem-se com dores, a vomitarem e a gemerem e até gritarem de aflição e então os responsáveis autorizaram que os pobres-coitados avançassem para as classe 1ª e Turística e, no chão dos corredores, se deitassem tentando aliviar a forte indisposição e os vómitos. Foi o caos completo com os corredores pejados de rapazes que, sem se poderem conter, urinavam, defecavam, vomitavam! Horrível!
O porão com os beliches dos soldados juntos com a carga.

O caso foi tão grave e alarmante que os responsáveis chegaram a ponderar alterar e desviar a rota do paquete e atracar na Guine para que em terra se debelasse a situação. Mas, acabou por não ser necessário. Após 2 ou 3 dias em que os soldados estiveram mal, ou por um ou outro comprimido tomado, ou for força da sua juventude e da sua constituição física, robusta e saudável, começaram a registar melhorias de saúde e logo se recompuseram. Felizmente! 

Mas foi aflitivo, deveras! 

Aflitivo e até revoltante porque, à boa maneira daqueles tempos, o Comando das tropas informou as mesmas que a indisposição resultou da... “travessia da linha do Equador” associada às altas temperaturas que se registavam naqueles dias... Assim mesmo. E comunicaram isso sem rirem… Lembro-me que nós, graduados, rijos e valentes sorrimos… para dentro...

Enfim… coisas daqueles tempos.

E a 22, passados dez dias no mar, lá atracamos em Luanda a que, no caso do meu Batalhão, se somou mais uma semana de camioneta de carga, de novo que nem gado, comboio e novamente camioneta, até atingirmos Cazombo e depois Lumbala no leste angolano, bem juntinho à fronteira com a então Rodésia, hoje Zambia. 

E hoje por aqui me fico neste rememorar de um velho e árduo passado naquela malfadada guerra forçada.

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

O SR. CAPITÃO


Vindo da sua alentejana Ponte de Sor, de onde era natural, na companhia de parte da sua família mais chegada (pai, madrasta e uma irmã) o jovem de 26 anos Eduardo Alvega Capitão , o “sr. Capitão” como sempre viria a ser conhecido e tratado, chega ao Chouto em meados da década de cinquenta do século passado e fixa-se no Casal de Vale da Bezerra, propriedade que seu pai havia tomado de renda para exploração agrícola onde sobressaía o cultivo e produção de arrozais em assinalável escala.

Jovem, alto, elegante e bem parecido, de voz melodiosa, conversa pausada e fluente, a sua presença desde a primeira hora fez-se notar não só por isso mas também porque o seu contacto com todos era educado, cordial e muito cativante e, desta forma, foi-lhe fácil granjear a admiração e o apreço da população local.

Mas tinha ainda dois factores mais que, ao correr do teclado agora ocorre  lembrar e sublinhar: o nosso jovem fazia-se transportar num moderno e desportivo automóvel (Volkswagen Karmann Ghia) de cor belíssima (igual ao da imagem anexa), coisa muito rara para a época e só ao alcance de certas bolsas e, como era conhecido por “sr. Capitão”, tinha quem fizesse a analogia do seu apelido com um suposto graduado na carreira militar e era ver como a muitos e muitas (com elevado destaque para certas moças de idades casadouras...) lhes causava uma admiração muito especial…

Mas o sr. Capitão, embora assim se apresentasse no Chouto e aldeias vizinhas, não era um estouvado “play boy” como poderia imaginar-se e, antes, era um jovem sereno, ponderado e com os pés bem assentes na terra.

Com idade para procurar a mulher que deveria ser sua fiel companheira para a vida e ainda que passeando em carro desportivo, último modelo e ser para algumas um capitão (militar), factores de grande atracção, Eduardo Capitão sabia bem isso e jamais se precipitou.

Nos seus primeiros tempos na aldeia tratou de analisar as muitas e variadas amizades que se lhe apresentavam para melhor conhecer as pessoas e as coisas que o cercavam e foi fazendo  a sua selecção…

Conversava e convivia cordialmente com toda a gente sem excepção mas as visitas e conversas eram mais frequentes e, no seu reconhecimento confesso com quem firmou mais amizade foi “com os Barretos, Antero e filho Zeca”, “com os alfaiates Acácio Varela e Arlindo Texugo” e, sobretudo, com o comerciante José Azevedo.

Foi com este último que Eduardo Capitão mais se identificou “via nele uma pessoa, educada, de caracter, de cultura e muito conhecedor da vida e das coisas” confessaria e, na verdade, os dois amigos conversavam amiudadas vezes durante largos tempos naquela época, tanto mais porque José Azevedo também apreciava muito a sensatez, cortesia e educação do seu jovem amigo.

Tendo então entre 10 e 14 anos de vida nessa data este escriba, porque ouvia uma ou outra vez os diálogos travados e também por confidências posteriores do seu progenitor, ele pode hoje aqui afirmar que muitas vezes as conversas versavam sobre a intenção de Eduardo arranjar noiva e as dificuldades inerentes a encontrar jovem que se enquadrasse nos seus desejos. 


José Azevedo, então com os seus já experientes 40/45 de idade sendo mais de 20 de conhecimento dos – e das… - habitantes na região, amigo do seu amigo como ninguém, também desejava que o seu jovem e bom amigo seguisse um rumo acertado e feliz e é neste quadro que, um belo dia, aconselha o amigo (“sr. Eduardo”, como sempre o tratou):

- Sr. Eduardo, anos passados tive um grave conflito com Custódio Pinheiro e o seu filho respeitante a uma casa que esse proprietário me arrendou e que me levou a cortar relações com eles que jamais reatarei porque são pessoas com quem mais não me interessa relacionar mas isso não me impede de lhe indicar a sua filha Alice, uma boa rapariga que, estou convicto, muito provavelmente será uma excelente esposa e o poderá fazer feliz. Do pai e do irmão não gosto mas isso nada me impede de reconhecer nela uma optima pessoa! Tente uma aproximação e poderá ser feliz.

Eduardo Capitão segue o conselho do amigo, faz algumas deslocações à Ribeira de Ulme, alguns kms distante, onde a recomendada noiva vive e consegue os seus objectivos de uma primeira aceitação. Convivem, trocam ideias, namoram durante algum tempo e, passado ele, um dia chega ao Chouto junto do seu amigo e diz-lhe:

- Sr. Azevedo (como sempre o tratou) participo-lhe que eu e Alice vamos casar! Gostaria muito de o convidar para a cerimónia e para a boda mas não me atrevo a isso porque sei a sua resposta face à sua incompatibilidade com os meus futuros sogro e cunhado, mas creia que é com muita pena que não verei o sr. Azevedo naquela data única da minha vida que o amigo, com o seu caracter e saber, ajudou a concretizar.

José Azevedo reconhecido e certamente reconfortado, abraça o amigo Eduardo e deseja-lhe felicidades!

Os anos passaram, José Azevedo partiu em 1978 muito prematuramente e o sr. Capitão viu também partir a sua amada Alice em 2010, depois de uma vida em conjunto de muitos anos bons e felizes e, agora, com quase 91 anos, raciocina em pleno, ainda passeia, convive com familiares e amigos, frequenta com entusiasmo a Universidade Sénior da Chamusca, vila onde mora, navega na internet com progressiva evolução no seu conhecimento, conduz a sua viatura (que não o desportivo carro dos anos 50, claro) e continua a ser o mesmo senhor de então: educado, correcto, cordial e amigo! A pé desloca-se amparado a uma bengala, se bem que a saúde não o incomode sobremaneira “a não ser os ouvidos, porque não me conseguem acertar com os aparelhos...” confessaria a este escriba que conhece desde adolescente dos seus belos tempos no Vale da Bezerra.

Para além de tudo isto, o sr. Capitão faz questão de estar presente no Chouto nos diversos eventos organizados pelo Grupo na net CHOUTO – NOSSA TERRA, NOSSA GENTE, como atesta a imagem junta registada por ocasião da festa do 2º aniversário do Grupo, onde contou a este seu amigo alguns detalhes da sua muita amizade com José Azevedo onde sobressai o seu aconselhamento da noiva, facto que desconhecia, consentindo que o divulgasse e onde teria a oportunidade de confessar: 

- Seu pai teve influência no meu casamento! A sua amizade e caracter permitiu-me arranjar uma excelente, amada e saudosa esposa!

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

CHOUTO - FESTEJAMOS O 2º ANO DO GRUPO!


Um conjunto de situações conjugadas impediram-me de dispor de tempo e condições para aqui registar a bonita festinha realizada no meu Chouto natal no passado dia 14 na comemoração do 2º aniversário do nosso Grupo CHOUTO -  NOSSA TERRA, NOSSA GENTE ocorrido no dia anterior mas, finalmente, venho fazê-lo aqui hoje com alegria e prazer.

(Primeiro foram uns quantos dias a tratar e editar imagens de fotos e vídeos da bonita jornada para publicação na página do Grupo, depois foi uma viagem ao Norte e outra até aos achigãs e, pelo meio, ainda suportei 2, 3 dias de forte indisposição (náuseas) por via do reforço da medicação, a mando do médico, numa tentativa de minorar ou travar a “simpática” Parkinson, última “aquisição” desta já usada carcaça…)

Decorreu lindamente a festinha, como a do 1º ano celebrada com um almoço no Restaurante Pimenta no Chouto claro, mas a que desta vez se adicionou uma animada sessão de música e canções interpretadas por amigos integrantes do Grupo, de entre os quais sobressaiu a colaboração do amigo Adriano Cruz, o velho “Ervilha” companheiro de brincadeira de criança nas ruas da aldeia que, agora, com a sua muita experiência adquirida com dezenas de anos e centenas de actuações em palcos integrando conjuntos musicais, animou sobre-maneira de arte e saber a nossa festa, dando-lhe um saudado e aplaudido cunho de alegria e até mesmo familiaridade! A amabilidade e saber do nosso Ervilha, para além de ter sido diversificada e alegre, foi mesmo ao valioso detalhe de criar com sabedoria e bairrismo o que chamou de Ode ou Hino do Grupo. Gostei e gostamos muito, seguramente! 

Houve palavrinhas amigas relativas ao Grupo e à comemoração e até mesmo a criação de aplaudidas quadras alusivas, declamadas pela autora Ana Maria Matos, amiga  que, logo de seguida, também teve a amabilidade de oferecer-me um bem sortido conjunto de doces, compotas e licores, rica produção e criação da nossa freguesia, numa gentileza que muito me sensibilizou!  

Nas palavras que proferi salientei o prazer que me dá a manutenção do nosso Grupo e o saudável e amigo ambiente ali criado e mantido, destaquei a transposição que progressivamente vamos fazendo passando da amizade virtual para a real, palpável e pessoal com estes nossos regulares encontros e convívios; disse da minha vontade de prosseguir com o mesmo querer do 1º dia e anunciei um próximo evento a 14 de Dezembro, data em que ali no Chouto voltaremos a encontrar-nos para, no mesmo restaurante, saborearmos um bom e rico Cozido à Portuguesa – as “Couves com Carne” da nossa infância e juventude mas agora mais “compostas e ricas”, como lembrei… - e, como remate desse convívio, visitarmos o magnífico Centro de Acolhimento da nossa terra – chamei-lhe mesmo “hotel de 5 estrelas”! -, desejando Bom Natal aos seus utentes e colaboradores e ofertando-lhes individualmente uma “Cestinha de Natal” contendo algum recheio para a confecção dos fritos e doces da quadra. Com agrado verifiquei que todos os 30 convivas presentes saudaram com entusiasmo esta iniciativa e por todos foi garantida a sua participação. Francamente, fiquei agradecido e… emocionado.

O Grupo, agora já com mais de 6 centenas de aderentes, continua muito participado e até interveniente na causa choutense e, para além das muitas e interessantes publicações de muita e diversa ordem de vários dos seus integrantes, vai provocando a curiosidade e interesse de vários sectores que solicitam a sua colaboração para eventos e enviam mesmo convites para a nossa presença nessas realizações. É interessante e, para mim, que gosto do administrar, tem sido agradável e gratificante.

É verdade que por vezes já me provoca algum trabalho pelas muitas publicações que regularmente são feitas e acarreta algumas preocupações, não tanto como resultado de quezílias ou desencontro de ideias e processos que uma ou outra vez ocorrem mas, sobretudo, porque gosto de manter um bom ambiente, uma boa colaboração e, como o faço com gosto e prazer, não me queixo do trabalho despendido e aqui estou já no 3º ano com o mesma dedicação e vontade do 1º dia, prosseguido a pequena obra que penso ser útil à minha terra natal e às suas gentes amigas.

Faço-o sempre com o mesmo e único espírito: servir!

Ninguém me encomendou o “sermão” - e desde os meus 15 anos de idade que assim é… - mas, nasci assim, apaixonado pela minha terra, pela minha região e pela sua gente e assim terminarei certamente o fim dos meus dias!…

Manias…

NOTA FINAL – Junto aí fotos alusivas à comemoração, com uma imagem do instante do soprar na velinha deste 2º ano, como no 1º por parte dos amigos menos jovens presentes Eduardo Capitão e António da Rosa na companhia do seu neto João Pedro, o mais jovem dos convivas presentes; um instantâneo de Ana Maria Matos na declamação das suas quadras; também uma foto do amigo Adriano durante a sua aplaudida e diversificada actuação; e, finalmente, este rapazinho ostentando a gostosa oferta dos doces choutenses com que foi presenteado.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

JOSÉ E MARIA, O MENINO, O AGUAMENTO E A CADELA DA "CALISTRA"


José, filho de carpinteiro, aprendia o ofício com o pai quando, subitamente, vê surgirem-lhe complicações pulmonares que o forçam a internamento no hospital da sua Chamusca natal.

Porque a cura demora a chegar, a estadia hospitalar prolonga-se e José aproveita esse período para colher os primeiros e elementares ensinamentos de enfermagem (conhecimentos que viriam a ser-lhe valiosos durante a sua vida futura) e, chegada finalmente a cura, o jovem ouve do médico que o assistiu na maleita o conselho para não prosseguir na profissão de carpinteiro, se queria ter um vida futura duradoura e saudável…

Porque José tinha a 4ª classe de ensino escolar básico - coisa não muito vulgar na época - sabia ler, escrever e fazer contas com desenvoltura, surge a ideia de prosseguir a sua vida laboral como ajudante na mercearia do cunhado Antero, de porta aberta com sucesso no pequeno Chouto, aldeia a várias léguas da sua Chamusca, já na charneca ribatejana, por estrada de muitas curvas, esburacada, poeirenta no Verão e encharcada no Inverno. 

Conversado e acertado o compromisso com a irmã Henriqueta e o cunhado Antero, o nosso jovem deixa então com tristeza a sua sempre amada vila e muda-se para a pequena aldeia, ficando hospedado em casa dos agora seus novos anfitriões.

Depressa se concluiu que José, jovem, inteligente, desempoeirado e desenvolto, tinha jeito e queda para o comércio e por isso o sucesso aconteceu e o jovem comerciante sentia-se bem e feliz com a sua nova vida. Não obstante nunca esquecer a sua amada vila, que visitava sempre que podia, começou a apreciar o ambiente da pequena aldeia, a criar e a alargar amizades e, e deu mesmo inicio a uma abordagem que lhe viria a transformar a vida radicalmente, quando conheceu Maria e tentou uma aproximação...

Maria, jovem e bonita, era a 4ª filha de Gregório e Maria “Arroteadora”, como era conhecida por ter vindo com o marido e as 4 filhas do concelho de Abrantes para arrotearem as terras incultas. Maria, de feições rosadas e bonitas, alegre, ágil e vendendo vida, era analfabeta, labutava com as irmãs e os pais nas terras bravias e no cultivo das searas e hortas da propriedade e com uma beleza que dava nas vistas, era mesmo conhecida nas redondezas por “Maria bonita”.

Todavia, para alguns, ao pé do jovem José, comerciante, inteligente, letrado, astuto e sabedor, Maria não “casava”... Sem saber ler e escrever, inculta, de mãos calejadas pelos cabos das enxadas, das foices ou das forquilhas; de pele tostada pelo árduo sol da charneca, sem cremes ou pinturas das senhoras da vila, parecia a alguns nitidamente um enlace improvável de se concretizar. Parecia mas… não foi!

José aguentou não só as primeiras recusas da “Maria bonita” como também as criticas de familiares e amigos - como poderia ser um jovem e inteligente comerciante, casar com uma rapariga do campo e ainda para mais analfabeta? - mas o jovem insistiu, insistiu e o namoro primeiro e o casamento depois, aconteceram mesmo.

Montaram casa na mesma rua da residência da irmã e da mercearia e casaram em 1943 na Igreja Matriz da amada Chamusca e, algum tempo decorrido José, inteligente e ambicioso, comercialmente “ganha novas asas”: pressente um negócio a nascer, deixa a mercearia do cunhado e estabelece-se por conta própria como vendedor de máquinas de costura, peça então “obrigatória” no enxoval com que os pais gostavam de presentear as filhas casadoiras.

O negócio corria bem, o relacionamento entre José e Maria era excelente e, por via disso eram felizes e, naturalmente, meses passados do enlace, a jovem  esposa engravida. Engravida e, dentro do período normal, dá à luz o seu 1º e bonito rebento, um filho varão. Feliz, José pensa de imediato dar-lhe o nome de Leandro mas Ricardina, vinda da grande Lisboa convidada para madrinha do pequeno e que já havia sido sua madrinha no casamento, opõe-se determinando:

- Leandro nunca, Zé! Victor! Vai chamar-se Victor, que é muito mais bonito! - e o afilhado, embora contrariado, aceita. E o menino é registado como Victor.

Inicia-se então a sua criação normal, bonita e feliz durante um ano e, com o menino crescendo, já com esse aninho de vida, algo surge de triste e preocupante: o pequeno Victor deixa de comer com o apetite habitual; pede e quer tudo para ingerir mas rejeita tudo; começa a surgir pálido e a definhar; os cabelinhos começam a ficar de pé; geme e chora a toda a hora... Maria, angustiada, chora, acha mesmo que o seu adorado filhinho vai morrer...

Profundamente preocupados, Maria, José e seus familiares interrogam-se e José leva o menino ao médico seu amigo na Chamusca que o observa e receita alguns medicamentos que logo são dados ao pequenino na esperança que surja a desejada cura...

Mas a situação mantém-se dia após dia, com o menino sempre na mesma ou mesmo pior. Sem comer, pálido, cabelos em pé, enfezado e os preocupados pais cada vez mais angustiados...

É então que Maria ouve da mãe, das irmãs e das vizinhas: 

- O menino tem “augamento”! O menino está “augado”! Só melhora e fica bom com a “mesinha” para o “augamento”. Faz-lhe a “mesinha”, Maria!

Maria chega a casa e fala a José do conselho da “mesinha” e ouve do jovem marido um rotundo “não”. 

- Mesinhas? Mesinhas??? Gente ignorante! 

José, de outra cultura, nascido e criado na vila, tinha formação bem diferente de Maria, analfabeta, aldeã, mulher do campo... Que ninguém trocasse a ciência e os médicos pelas “mesinhas”e pelas “benzedoras”! Ninguém! (De seu lema e certeza de toda a vida, só uma vez, muitos anos após haveria de abdicar desta convicção quando, face a gravíssima doença da sua Maria lhe adivinhava a morte em virtude dos milhentos médicos e especialistas consultados não lhe atinarem com a doença e consequente remédio e tolerou que alguém levasse uma peça de roupa da esposa para que a “benzedora” lhe indicasse o tratamento).

Mas Maria, não obstante não querer nem poder contrariar José, não desistiu. O menino estava magrinho, definhado, ia morrer e isso desesperava-a. Conversa com a cunhada “mana” Henriqueta, senhora bondosa, extremamente educada e sua preferida confidente. E a “mana” - carinhoso tratamento que sempre usaram entre si - ainda que extremamente religiosa e de cultura igual à do irmão, ouve a confidência da cunhada e acede em ajudá-la na realização da “mesinha” porque, para além de sentir a dor da “mana”, também ela tinha um carinho enlevado e muito especial pelo pequenino sobrinho. Uma condição acertaram mutuamente: José jamais poderia saber da sua “mesinha”!

Dizia a crença que a mãe do aguado bebé deveria pedir as umas quantas vizinhas umas porções de ingredientes para serem cozinhadas e depois o pequeno ingerir. Se a criança comesse toda a papa fabricada excelente mas, se todavia não comesse tudo, nenhum ser vivo deveria ingerir o resto porque… morria.

Maria e Henriqueta fazem a papa às escondidas e dão-na ao pequeno Victor que a ingere colher a colher, até mais não querer, perante o ar embevecido e esperançado das mulheres e deixa um pequeno resto na malga, a que havia que dar o destino final…

Maria, preocupada e curiosa, pergunta a Henriqueta: 

- E agora, mana? Que fazemos ao resto que o menino não quis?

- Olhe, damos à cadela da “Calistra” que todos os dias não me desampara a porta!

E dão o resto da papa à cadela da vizinha Helena, de alcunha “Calistra”.

Maria leva o menino para casa e passadas algumas horas começa a notar no menino  melhorias  de ânimo e aspecto. Aguarda mais um dia e perante uma noite bem descansada da criança, avança lesta e sorridente para casa de Henriqueta, anunciando-lhe feliz:

- Mana, o menino está melhor! Passou bem a noite e ao acordar pediu papa que logo lhe dei, nem lhe digo como, de tão feliz!

Henriqueta, como o irmão sempre descrente e discordante de “mesinhas”, abriu a boca de espanto e, feliz, abraçou-se à cunhada!

- Que bom, mana! Que alegria! Mas tenho de lhe  dizer uma coisa…

- O quê? - pergunta a ansiosa Maria, imaginando algo de menos bom que viesse toldar aquela hora feliz.

- A cadela da “Calistra” morreu! A Ti Helena, pesarosa, veio há pouco aqui dizer-me “Dª Henriqueta, estou muito triste, a minha cadela morreu!”

Maria ia caindo para o lado de espanto mas logo se refez quando Henriqueta lhe lembrou:

- Mana, mas o segredo é só nosso, está bem? Que nem a Ti Helena nem ninguém saiba que demos à cadela a sobra da “mesinha”!

Maria acedeu de bom grado e a “mesinha” foi silenciada durante vários anos para tudo, para todos e também para o marido e, só muito mais tarde no tempo, quando em casa se falava na cura do Victor, entretanto já bem crescido, José ficou a conhecer a “travessura” das mulheres e, aí, contrapôs de imediato:

- Balelas! Crendices! Ignorâncias! O menino curou-se com os remédios do dr. Cumbre, que logo avisou que a cura seria demorada.

Maria e Henriqueta sorriam.

Remédio da farmácia na cura? “Mesinha”? A cada um sua verdade...

Como verdade foi o Victor curar-se!

E, a morte da pobre cadela? De que morreu a cadela da Ti “Calistra”?… 

A cada um sua verdade...


NOTA FINAL – Junto ao texto 4 fotos: Uma do casamento de José e Maria à saída da cerimónia na Igreja Matriz da Chamusca; outra do 2º dia do casamento, com alguns convidados, a madrinha Ricardina sentada na frente, o pai da noiva, as irmãs e alguns namorados destas; uma 3ª de José, em 1950, exibindo as máquinas de costura de que era vendedor; e uma última foto do pequeno Victor, provavelmente com 1 ano de vida, entre as tias maternas Domingas e Luísa.