quarta-feira, 30 de agosto de 2017

"OÁSIS" NO MUNDO?


Hoje, neste Portugal do século XXI, quando pegamos e desfolhamos um jornal diário - quando não logo na sua capa, em grandes caracteres… -, encontramos e horrorizamo-nos com as muitas notícias de assaltos, roubos, agressões, sequestros e até mortes de vitimas de tanta violência. (Ultimamente, pobres e indefesos idosos, isolados no interior do país, têm sido particular vitimas dessas violências, com algumas a resultar em crimes mortais enquanto os desgraçados agressores se satisfazem com o roubos de escassas meia dúzia de euros…)

Hoje, neste Portugal do Século XXI, assistimos mesmo à criação de programas de televisão nos mais diversos canais, com horas e horas de emissão, ligações em directo, entrevistas, reconstituições de cenas passadas – algumas delas eventualmente mais ou menos macabras… - e tudo serve para supostamente nos esclarecer, quando não alarmar.
E, na verdade, conscientemente, temos de reconhecer que, este Portugal do Século XXI, não é mais o Portugal calmo, ordeiro e pacífico que nos viu nascer e onde crescemos e vivemos nos tempos passados. 

Hoje, por via de muitos fenómenos, a que não é estranha certamente a abertura de fronteiras terrestres, marítimas e aéreas, o português comum, não só nas grandes urbes como mesmo nos pequenos povoados do interior, não vive mais descansado e em sossego, como no antigamente... Infelizmente.

Pensava nisto tudo quando descia uma rua de uma pequena aldeia beirã que visito regularmente e, constatando que estava num pequeno oásis neste mundo hostil de roubos e assaltos, via as chaves por fora nas portas em plena via pública que atravessa a povoação. 

Ali, para além da deliciosa broa de milho, que o padeiro diariamente ao romper da aurora deixa pendurada em saco porta a porta e onde ninguém mexe para além do seu destinatário, também as chaves ficam de fora, despreocupadas e livres. Ali, ao dispor de qualquer passante, forasteiro ou não, que resolva entrar. Para o bem e para o mal…

Com o objectivo de aqui as registar, resolvi fotografar três situações de habitações quase contíguas, de entre vários que é possível constatar e, quando na ocasião expressei a um residente da aldeia o meu desejo de escrever e mostrar no meu blogue a beleza livre destas cenas, logo fui alertado:
- Mas, vai referir o nome da nossa aldeia?
Sosseguei-o, como é bom de ver: 
- Claro que não, meu caro! Fique descansado.

Assim, ficará só para nós e para os demais residentes da povoação a manutenção deste autêntico “oásis”, deste verdadeiro paraíso.

No nosso Portugal do Século XXI.

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

RECORDAÇÃO DA GUERRA COLONIAL (1)




NUMA DATA E NUM AMBIENTE DE GUERRA...
A NATURALIDADE, A TERNURA, A PAZ!...

ANGOLA (Leste)

GUERRA COLONIAL / 1968

As tropas portuguesas tinham liquidado um guerrilheiro e levaram o cadáver (qual troféu de caça) para ser visto pela população que vivia junto ao nosso quartel.


Os nativos, curiosos, abeiraram-se para ver mas, eu, embevecido pela imagem que vislumbrei ali bem ao lado, decidi virar a objectiva e, em vez da macabra cena do cadáver, antes quis registar este momento de ternura, de vida e de paz. 


terça-feira, 22 de agosto de 2017

HABITUAÇÃO DE NETO


Vitima, pela 1ª vez na vida e já há uns bons pares de dias, desta danada “gota” que me atinge quase todo o lado esquerdo da “carcaça”, desde a mão e dedos até ao pé, com larga carga no joelho, muito dorido e inchado, desço lenta e pausadamente a difícil escada (os antepassados eram certamente gente de grandes pernas para construírem degraus tão altos!... ), descida que pelo interior da casa nos conduz até à sala de jogos.

Primeiro o pé esquerdo, cuja perna inchada não dobra e que me dói para caramba e, logo de seguida, o pé e perna direita no mesmo degrau. 

Assim, dorido e lentamente, desço degrau a degrau quando oiço o desafio do meu Rafael que, atrás de mim, amável e cortês, esperando pacientemente que eu avance, vai descendo também de vagar:

- Avô, que tal agora uma partidinha de matrecos?

- Está bem – aceitei, com paciência de avô… - mas, deixa-me descansar só um pouquinho porque o avô está doente.

- DOENTE??? – interroga-me, surpreso, de imediato – Olha, olha! Ainda nunca te vi doente!

- Pois não Rafael, mas é bom que te vás habituando. O “caruncho” está chegando…

Na realidade, felizmente, o netinho ainda não viu este avô de cama, internado ou em tratamento, cuidando de qualquer maleita mais complicada mas, em boa verdade, a coisa vai mudando…

E esta merda chegou tão depressa!...

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

QUASE, QUASE LOCUTOR!...

Grande apaixonado por tudo o que é comunicação social – comecei a escrever, ou melhor, a fazer “arremedos" de notícias relativas à minha terra, tinha os meus verdinhos 15 anos de idade – um dia sonhei e decidi tentar a possibilidade de entrar na rádio como locutor.

Porque tinha receio que as pessoas à minha volta considerassem demasiada presunção aquela ambição, não disse nada a ninguém e tratei de tudo no maior dos sigilos. Ainda hoje muito poucas pessoas do meu relacionamento conhecerão esta faceta da minha vida… Sé é que as há...

Entrei então em contacto com a Rádio Ribatejo que, a par da oficial Emissora Nacional, era na época a estação mais ouvida na região e foi marcada a prestação da necessária prova.

No dia aprazado, vestido com o habitual fatinho e gravata que, com os meus 21 anos sempre usava na época (era empregado de escritório na Fábrica de Papel de Ulme) e pedida aí a dispensa de trabalho usando uma qualquer mentira, saí de casa no Chouto sem contar nadinha à família e, montado na frágil motoreta que usava para me deslocar (nas subidas mais acentuadas, para vencer o percurso, tinha de a auxiliar com os pedais!...) avancei para Santarém que dista cerca de 40 kms.

Lembro-me que atravessavamos o Outono e o dia estava meio encoberto mas sem prometer chuva mas, aí tive logo uma má surpresa: a meio do trajecto, talvez por volta de Vale de Cavalos, largou-se mesmo a chover. Uma danada de uma chuva miudinha (a “molha-tolos”) e recordo-me que na Estrada do Campo, entre Alpiarça e a Tapada, tive mesmo que encostar e abrigar-me debaixo da copa de uma árvore. Mas eu tinha hora marcada para a entrevista/prova e tive mesmo de avançar à chuva para Santarém…

Cheguei junto aos estúdios da Rádio Ribatejo, que funcionavam numa avenida que dá acesso às Portas do Sol, que nem um pintainho saído de um lago…

Deixei a motoreta no passeio em frente (na época ninguém roubava nada!) e segui para a prova.

Fui recebido pelo Capitão Jaime Varela Santos, pessoa muito educada e cavalheira, que foi o fundador e era o corpo e a alma da Rádio Ribatejo na altura. Pedi-lhe desculpa pelo meu deplorável aspecto que ele bem entendeu e relevou.

Avançamos então para a prova conduzida por ele próprio. Lembro-me que consistiu na leitura de texto/noticiário feito em português, francês e inglês e também na leitura de um ou dois anúncios. Por fim seguiu-se uma entrevista, feita por ele, que envolvia assuntos de cultura geral e regional.

Terminada a minha prestação, ouvi com agrado o veredito do capº Varela Santos:
- Esteve bem e quero que volte. A sua voz é modelável.(Naquele tempo dava-se muito importância à voz, ao seu timbre, à sua colocação. Hoje, até já ouvimos e vemos gagos a fazer apresentações de programas na rádio e na televisão…)

- A sua voz é modelável.
Falou assim o capº., usando exactamente esta expressão que jamais esqueci e que me deixou feliz até mais não.

Bom, mas depois aconteceu que, nas curvas da vida, tudo se foi…

Dois meses passados sobre esta carta assentei praça, na tropa, claro, nas Caldas da Rainha porque, por azar, puseram-me em Infantaria. Se me tivessem dado Cavalaria estaria aqui um locutor… Assentaria praça em Santarém e a minha frequência/formação de rádio seria certamente uma realidade.

Mas o que aconteceu foi bem mais diferente: Depois de Caldas, Tavira e depois, durante mais ano e meio até embarcar para a guerra, estive colocado em Abrantes.

50 anos atrás, sem as facilidades de transporte, estradas e comunicações que hoje temos e passados quase 4 anos da tropa, com namoro, casamento e residência em Lisboa, esfumou-se todo o projecto e morreu o locutor. Que, na verdade, nem chegou a nascer...

Hoje sinto pena e reconheço que, avançando nele, teria vivido uma vida totalmente diferente da que vivi mas, em boa verdade, teria feito na vida o que sempre gostei e me apaixonou e apaixona ainda hoje: a comunicação social a rádio e a tv (e agora a net) mas, também muito a escrita, os jornais, as revistas, os livros.

Teria de certeza sido uma vida muito e muito diferente da vivida mas, nas encruzilhadas das vidas, muitas vezes seguimos pelos caminhos que menos esperamos e queremos.

Foi o que me aconteceu.

E, agora já é tarde para recomeçar…

NOTA - Nas minhas velharias, para além da cópia da carta que anexo, ainda não encontrei qualquer outro documento ou registo que me fale desta prova para locutor, pelo que é o único que aqui posso deixar. 
É uma cópia de uma carta que enviei ao Cap. Varela Santos de felicitações pela passagem do 15º aniversário da Rádio Ribatejo e onde faço alusão ao “meu grande desejo de iniciar a minha preparação para locutor”.

Enfim… as coisas que a gente sonha quando é jovem…