quinta-feira, 28 de outubro de 2021

ANTIGO COMBATENTE - CHEGOU O CARTÃO!


Diz o nosso povo que “vale mais tarde que nunca” e nisso penso e concordo a propósito da emissão do “Cartão de Antigo Combatente” - “Titulo de Reconhecimento da Nação” (que recebi há 2 dias) e das (poucas) regalias que o mesmo proporciona aos que, como eu, combateram forçados nas danadas das guerras de África.

Depois de há meia dúzia de anos atrás os governantes atribuírem a cada antigo combatente um Subsídio Anual de 150€, agora, com o cartão, surgem mais uma pequenas benesses em que a mais significativa é sem dúvida a gratuitidade de alguns transportes públicos.

Sendo de juntar a isto o não pagamento de Taxas Moderadoras nos serviços de saúde e igual dispensa de pagamento nas visitas a museus, vê-se como envergonhadas são as pequeninas regalias mas que, mesmo assim, devo confessar, aprecio e agradeço.

Pena que só agora, meio século passado sobre tão horrível período da nossa história elas surjam porque, entretanto, muitos foram os ex-combatentes que partiram e delas não beneficiaram…

Mas, enfim, tarde mas é um pequenina recompensa para quem, forçadamente, perdeu os melhores anos da sua mocidade, para além e sobretudo de ter arriscado a própria existência.

No meu caso – e depois de ano e meio por cá como militar antes da mobilização – foram 26 meses de muito esforço e sacrifício para além do risco vivido dia a dia naquelas paragens.

Escolhi duas imagens para melhor descrever e ilustrar esse difícil tempo de fome, sede, frio e medo. Medo sim porque, em certas circunstâncias só não sentiria medo quem fosse inconsciente ou irresponsável... Na 1ª, à direita, temos a ementa da pobre Ração de Combate que, durante 14 meses em muitas ocasiões me matou a fome no inóspito e longínquo leste angolano. À excepção do Leite com Chocolate, nada daquilo era comestível, pelo menos para o meu paladar. Mas comi quase sempre porque a fome apertava e, em alternativa, fora do quartel, como andei vários meses, só o... capim…

A imagem, à esquerda, diz-nos como foi diferente a estadia de mais 12 meses finais a uma centena de kms a Norte de Luanda. Aí, para além permanecermos em guarda a instalações (culturas e fabricas transformadoras) de grandes fazendas (cana de açúcar, bananas e palma) continuámos a sair e a fazer escoltas e patrulhamentos mas, sobretudo no caso das primeiras, feitas de Unimog e sempre em estradas asfaltadas, afastando-nos assim muito do perigo das minas. Mas, tanto numa zona, como noutra, a inseparável e fiel G3, jamais era esquecida ou ficava distante… E, em ambas as áreas ela passava a noite à beirinha da cama… A zona era muito menos perigosa do que a do leste mas, mesmo assim, havia que não facilitar...

Enfim, passou-se e, se no meu caso, felizmente aqui estou para recordar e eventualmente beneficiar algo das pequenas benesses agora anunciadas, outros infelizmente essa sorte não tiveram…

E, desses, pouco ou nada reza a história...


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