segunda-feira, 5 de junho de 2006

40 ANOS DEPOIS !...

Nas curvas da nossa vida deparam-se-nos por vezes situações bem curiosas e gratificantes.

Será o caso da que hoje aqui apresento...

Por motivos totalmente “a leste” desta história, conheci em tempos José Maria, “Maioral dos Touros” de uma conceituada ganadaria alentejana que visito com frequência, por outro motivo que não os touros e, por ele, aí fiquei  sabedor que era meu conterrâneo, natural do Casal do Marmeleiro, na minha freguesia natal do Chouto – Chamusca.

José Maria, Maioral

Meses depois, em convívio na terra natal com outros conterrâneos, fui informado que José Maria era filho de um cego, à data (anos 60) ali muito conhecido face à maneira como encarava e vivia o seu dia-a-dia (andava de bicicleta, guardava gado, pescava, fazia construções e casara mesmo, aguardando naquela data o nascimento de um filho...) Isso foi como que um alerta que fez soar como que uma campainha na minha memória...

Recordei então que, naquela distante data - Fevereiro de 1967 - sabedor da existência desse meu conterrâneo invisual e famoso, residente num distante Monte, bem no interior da charneca ribatejana, contratei um fotógrafo profissional e realizei uma reportagem – um pequeno trabalho, ilustrado com fotos – que fiz publicar no “Diário de Notícias” (jornal de que era correspondente na minha aldeia), onde ele surgia andando de bicicleta por aqueles caminhos e onde construía uma barraca de colmo, fazendo ainda no texto referência ao seu recente casamento e ao facto da esposa aguardar a chegada de um rebento, destacando a muito difícil situação económica do pobre casal...

Deixo, aí ao lado, o trabalho publicado no DN.

Fui à procura do recorte do jornal de há quase quatro décadas (“coca-bichinhos”, guardo tudo...) e, este localizado, surgiu em mim o desejo de oferecer uma cópia ao Maioral, José Maria, afinal a criança que germinava, naquele distante ano de 67, no ventre da jovem esposa do famoso cego do Marmeleiro, quando fiz a reportagem para o diário...

Foi o que fiz, em deslocação que voltei a realizar ao Alentejo, sendo para mim muito gratificante comprovar a surpresa do agora homem quarentão - que felizmente não tem qualquer deficiência na vista, como o seu famoso progenitor, entretanto falecido - e a forma como os seus olhos se humedeceram quando, posto ao corrente desta história, olhou para as cópias dos recortes do “Diário de Notícias” de 1967, onde surgia a imagem do seu pai!...

Assim, nas curvas da minha vida, uma situação bem gostosa e gratificante que, naquela data, jamais poderia imaginar que hoje aconteceria.

Então, em 1967, dei a conhecer ao país - na época, o "Diário de Notícias" era o jornal mais lido em Portugal! - a gravidez da jovem esposa do cego pobre do Marmeleiro e logo surgiu, do Minho ao Algarve - e até dos Açores! -, pelo correio, montes de ofertas de fraldas e enxovais para o bebé que iria nascer e, agora, quase 40 anos depois, como que por artes mágicas, conheço no interior alentejano o então bebé, hoje “Maioral dos Touros”, José Maria, filho do famoso cego do Marmeleiro, que se emocionou a ver o velho recorte de jornal !...

E, francamente, também eu me emocionei.

Nas curvas da vida...

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Victor,

Mais uma história, mais um partilhar. Para quando o desafio que lhe lancei?
Não estou a brincar, falo muito a sério. Uma vez mais adorei ler este relato, bem escrito e o mais importante! sentido.
É bom que continue a ser "coca-bichinhos", pois será o garante das memórias que um dia mais tarde, outro "coca-bichinhos", queira ter o trabalho e a paciência, perdão; o prazer, que o Vitor tem nisto.
FORÇA AMIGO, não tenha medo, se até o Jardel escreveu um livro. O seu poderá não ganhar nenhum prémio Pulitzer, mas certamente será bem mais interessante.
Um Abraço
Paulo

Victor Azevedo disse...

Meu caro Paulo, por incrível que pareça só agora encontrei o teu amável comentário... O hospedeiro do blogue não me avisa dos comentários surgidos e daí a passagem em falso de um ou outro. Desculpa!
Um dia vou pensar nessa tua anterior sugestão, agora reforçada, de reunir em livro estas crónicas...
Pode ser que um dia aconteça....
Vamos ver...
Um abraço!