sábado, 23 de fevereiro de 2008

RICOS E POBRES


De acordo com a edição de “O Mirante” desta semana vejo que o Clube Agrícola Chamusquense está prestes a encerrar as suas portas facto que, não sendo propriamente uma surpresa, é a constatação de um desenlace há muito aguardado.

Na verdade, aquele que na Chamusca, nos seus tempos áureos, era conhecido por “Clube dos Ricos” sofreu uma forte machadada com as inerentes consequências do 25 de Abril e não mais conseguiu refazer-se e recuperar a actividade que antes desenvolvia.

E vem até a propósito referir e recordar que a vila da Chamusca, ali bem no coração do Ribatejo, para além desse Clube tinha mais algumas outras colectividades que proporcionavam que, de uma maneira absolutamente evidente e porventura chocante para os dias de hoje, verificássemos como as diversas classes sociais da vila se reuniam e conviviam, numa época – e estou a referir-me a meados do século passado - quando a televisão dava os primeiros passos e as pessoas se juntavam nas colectividades, ao serão, para assistir aos programas que, a preto-e-branco, lhes chegavam...

Na vila da Chamusca as classes sociais agrupavam-se assim com as respectivas famílias:

Clube Agrícola – Grandes proprietários agrícolas e pessoas abastadas da região.
Grupo Dramático – Empregados de escritório e pequenos comerciantes.
Benfica (Filial do Benfica) – Profissões Diversas (Carpinteiros, Pedreiros, etc.).
Sporting (Filial do Sporting) – Trabalhadores rurais.

A coisa estava assim estipulada e era assim que funcionava sem grandes atritos. A complicação só surgia quando alguém subia na vida e atingia um estatuto mais elevado. Aí a situação complicava-se um pouco, sobretudo quando o nível económico/social do chamusquense se aproximava do daqueles que, nomeadamente, frequentavam o Clube Agrícola. Lembro-me do caso de um funcionário bancário - no tempo em que ser funcionário bancário era um destacado estatuto – que foi subindo na carreira até Gerente de Agência e aí foi convidado a associar-se ao “Clube dos Ricos”. Aconteceu então que, enquanto alguns associados entendiam que o convite tinha toda a razão de ser, outros achavam que não, a coisa não tinha cabimento. Houve discussão mas o novel Gerente entrou mesmo para sócio.

Mas, como é fácil de imaginar, com o surgimento da Revolução do 25 de Abril a vida da colectividade passou dias difíceis que pelos visto culminam agora com o provável fecho do velho “Clube dos Ricos”. Sem dúvida consequências das convulsões sociais resultantes da Revolução dos Cravos.

E, a propósito disso, ocorre-me recordar aqui a opinião de alguém – o meu Tio Zé Pisco, lá na sua conservadora Beira Alta - que, vendo toda a agitação social que ocorria depois de 25 de Abril de 1974, com greves e manifestações todos os dias e a toda a hora, me dizia: “Victor, eles dizem e gritam que querem acabar com os ricos. Eu achava que era melhor acabar com os pobres...”

Sábias palavras do Tio Zé mas que, pelos vistos não surtiram efeito nos tempos que se seguiram... Parece-me...

Não sei se os ricos acabaram na Chamusca mas, o seu Clube Agrícola fecha e, todavia e nisso tenho a certeza, os pobres continuam pobres.

EM TEMPO: Nunca entrei no Clube Agrícola Chamusquense


2 comentários:

Raul Caldeira disse...

Tudo o que acima fica escrito é pura verdade. Eu, enquento estudante, com os meus 16, 17, 18 anos frequentava o Clube Agrícola, pois ali se reunia a malta da minha idade, embora já fosse sócio do Grupo Dramático Musical, pelas duas colectividades deambulava. Anos mais tarde, já sócio do CAC, fui director e promovi algumas actividades, nomeadamente torneios de Bilhar, King, Xadrez, bailes de carnaval.... Os tempos foram passando e alguns que diziam que o Clube era dos ricos e inclusivé quiserem rebentar à bomba aquela colectividade, começaram a lá ir. Eu a pouco e pouco, contestando a sua presença, comecei a afastar-me. Como eu, muitos outros. Os anos pasaram, o Clube fechou para obras ( na cave ) e deixei de lá ir e deixei também de pagar as quotas. Mais tarde vieram perguntar-me de queria fazer parte da nova direcção, se queria voltar a ser sócio. A minha resposta foi simplesmente NÃO! Fico triste com a situação pois ali passei bons momentos da minha juventude com bons amigos e amigas. Aliás, a Chamusca continua a ter ricos, mas o Clube, graças à revolução dos cravos, deixou de ser dos "ricos" para ser uma casa sem rei nem roque. A água volta sempre ao seu leito. O clube Agrícola deixou de ser a casa para a qual foi criada. O associativismo da Chamusca está perdido. As gentes da Chamusca já não se interessam pela sua Terra. Tudo está tornado aos dias em que nasceu. Triste realidade!

Victor Azevedo disse...

Raul,
Obrigado pela visita e pelo comentário e ainda pela narração de factos nuns casos para mim desconhecidos e, noutros, já esquecidos, como essa da bomba de que, francamente, já não me lembrava.
Apreciei e julgo que entendi o que está "escrito" nas entrelinhas do seu comentário e, não sei porquê -ou, se calhar até sei... - a sua narração do ocorrido com o Clube Agrícola Chamusquense fez-me recuar no tempo e lembrar o triste fim do nosso velho "Jornal da Chamusca"...