Éramos miúdos, passávamos pelos anos 40 e 50 do século passado e brincávamos na aldeia, sobretudo no largo fronteiro à minha residência, largo então de piso de terra batida e mesmo de alguma areia que, trazida pela chuva na rua de pequeno desnível, ficava depositada junto à sede da Junta de Freguesia.
Aí jogávamos à bola, com balizas formadas por duas pedras e bolas feitas de meias e trapos; aí brincávamos, com pequenos e modestos carrinhos construídos de madeira ou mesmo de canas das vedações da hortas vizinhas da aldeia; aí jogávamos à bugalha, sendo que os ricos “berlindes” dos meninos das distantes vilas e cidades, eram ali substituídos por pequenas bugalhas que arrancávamos das rastejantes “carvalheiras” que então abundavam nos matos circundantes do povoado.
Íamos à sua procura e, achadas, arrancávamo-las pelo pequeno pezinho cujo borboto era cortado e, alisado para que ficasse sem qualquer relevo e assim fossem lidadas e jogadas pelos nossos pequenos deditos polegar e maior, lisas, eficientes e bonitas.
Ora, era nessas deambulações pelos matos circundantes do meu Chouto natal que chegávamos às hoje para mim saudosas pútegas, umas pequenas plantas que nasciam, se a memória não me falha, debaixo do mato e sobretudo dessas “carvalheiras” baixinhas. Nasciam e eram colhidas por alturas das primeiras chuvas e no Inverno e brotavam, no terreno húmido, debaixo dos arbustos rasteiros.
Arrancada a pútega com cuidado, era depois sugado o pequeno e tenro pé e recordo-me que era particularmente saboroso e bem agradável ao paladar. E… como bem me recordo desse belo sabor!...
Chegaram-me hoje imagens dessas saudosas pútegas e, aí, foi um desfilar de recordações que me passaram pela memória relativas aos felizes dias vividos na minha meninice na aldeia, na companhia de outros vizinhos e amigos ainda hoje felizmente na nossa convivência.
O António Rainha, o Fernando e o Manuel Carvalho, o Diamantino e o Álvaro Carloto, o João “da Calistra”, o Artur e o Alfredo “Paneiro”, o José Augusto “Montefato”, o Adriano Cruz “Ervilha”, o Armando Jorge, o José “Torres”, o Manuel João (já falecido) e o Tomé Dinis, o Manuel Espadinha e… eu sei lá quantos mais, numa relação de gente bonita e amiga em que temo esquecer alguém…
Corríamos e saltávamos ligeiros que nem pardalitos, despreocupados, livres e felizes pelos montes e vales circundantes do Chouto e não precisávamos de ginásios e horas de ginástica, comíamos e bebíamos tudo o que nos surgia nos matos, nas hortas, nas ruas, sem preocupações de infecções ou males-estar, sem medo de drogas ou assaltos, sem saber o que eram sequestros ou raptos.
E… como éramos felizes sem sabermos!...
3 comentários:
Eram bons tempos...!!
Onde todos com tão pouca eram tão felizes.
A evolução dos tempos acaba por nos destruir.
Parabéns
Excelente texto, era mesmo assim.
Muito obrigado!
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