Nas minhas já habituais e regulares incursões nas velharias de outros tempos que ao longo da vida fui preservando e que, agora, vou revisitando e finalmente agrupando e arquivando convenientemente e com algum método, coisa que nos tempos passados não fiz, estando ainda uma boa parte “a monte” e guardada sem qualquer critério ou organização, a que as sucessivas mudanças de casa mais baralharam e prejudicaram, encontrei agora uma interessante carta, de 1965, que aqui incluo com gosto num seu pequeno trecho e que, revendo-a, deveras mereceu o meu apreço por a ter guardado.
É redigida pelo velho e saudoso amigo Zé do Areal (Custódio Marques Montargil, de seu nome de baptismo) que adoptou esse pseudónimo nas muitas crónicas que ao longo dos anos escreveu sobre a sua Chamusca em particular e o Ribatejo em geral para diversos jornais e, sobretudo, para a então “Vida Ribatejana”, de Vila Franca de Xira, amigo com quem, para além de contactos pessoais em Lisboa onde residia, também troquei vária correspondência ao longo dos anos, sendo que nesta carta aborda aquele saudoso amigo o caso da Biblioteca Itinerante, da Fundação Calouste Gulbenkian, que noutros tempos consegui que servisse o meu Chouto natal.
Titulada “A carrinha da Gulbenkian”, já aqui escrevi uma crónica sobre o assunto, tendo-lhe anexado apenas o recorte do jornal da época onde inicialmente sugeria a visita da Biblioteca Itinerante ao Chouto e também o meu cartão de leitor mas onde faltava algo escrito que testemunhasse a minha diligência na deslocação da carrinha há minha terra, documento ou documentos que, face à “barafunda” que ainda tenho nas minhas velharias não consegui encontrar na ocasião da redacção da crónica, o que me fez confusão porque, recordo-me, naquela recuada data troquei sobre o caso alguma correspondência com a Gulbenkian no intuito de reforçar directamente o meu pedido uma vez que, provavelmente, o jornal não teria chegado à Fundação…
Nesta correspondência de Zé do Areal agora encontrada ele felicita-me pelo êxito da minha iniciativa, acrescentando mais umas palavras sobre o interesse da leitura e da instrução nas pessoas e do proveito que daí poderia advir para o povo choutense.
Escreve então Zé do Areal:
"Meu amigo. Recebi a sua carta que li com atenção. É evidente que, quanto à sua acção em prol da ida da B.I. (Biblioteca Itinerante) ao Chouto só me regozijo com o seu triunfo e faço sinceros votos para que os choutenses se apercebam que a maior fortuna que se pode possuir é a Instrução e através dela a educação. Isto sim valoriza e impõe o homem que se esforce e se disponha a ir tão longe quanto possível. Todo aquele que só disponha de fortuna monetária está sujeito, perdida ela, a sofrimentos insuportáveis. Portanto parabéns pelo êxito obtido."
Sábias palavras que agora releio com agrado e que aqui deixo como pequeno mas gratificante testemunho de uma face do laborioso trabalho que ao longo da vida venho executando sem o mínimo interesse material e com o único objectivo de ajudar o meu semelhante e assim também servir as gentes e a terra que me foi berço.
Um sermão que, conforme costumo dizer ninguém me encomendou mas que me dá satisfação e prazer e, porque nasci assim, assim continuo e… provavelmente assim desaparecerei.
Sem comentários:
Enviar um comentário