Esta imagem, agora copiada da net, traz-me recordações que desejo partilhar:
Meu falecido pai era um verdadeiro enfermeiro da aldeia e a ele recorriam muitos ou talvez mesmo todos os padecentes que necessitavam de alguns cuidados médicos. Era vulgar os doentes, indo à Chamusca ao médico dr. Cumbre ou à “farmácia do Joaquim Cabeça”, estes recomendarem que, depois na terra, procurassem o Zé Azevedo para lhes “dar” as injecções ou para lhes “mudar” os pensos, no caso de feridas. Muito vulgar e, diria mesmo: quase obrigatório.
(A propósito quero recordar aqui, porque me lembro muitíssimo bem que, na época – e falo das décadas de 40/50 do século passado – era muito fácil ocorrerem fortes e valentes rixas não só entre residentes na aldeia como, principalmente, entre habitantes do Chouto e forasteiros de localidades vizinhas. Acontecia com pessoas de Ulme mas, muito principalmente, com gente vinda da Parreira. Era rara a escaramuça que não resultava em murro, pontapé e pedrada e, lembro-me bem porque, sendo eu criança, as cenas sempre me impressionavam, o desenlace acabava por envolver e terminar também muitas vezes em fortes pauladas porque os cajados de pastores, boieiros e eventualmente até lavradores, na época frequentadores das tabernas, entravam em acção e, daí às cabeças partidas e muitas outras feridas, era coisa inevitável e de breves segundos.
Muitas destas sofridas vítimas iam parar às mãos do Zé Azevedo e é daí que guardo na memória essas imagens que então tanto me impressionavam e que, possivelmente, não mais esquecerei. Lembro-me de ver meu pai com uma “gilette” rapar um pouco o cabelo em redor de uma ferida aberta na cabeça de um sofredor que levara forte paulada, água oxigenada e mercúrio-cromo. E também usava, noutros casos um pó, algo de nome “sulfamida”, produto então muito utilizado para cicatrizar rapidamente as feridas.)
Bom, mas comecei a divagar para outro lado e esqueci-me da razão da publicação desta imagem agora apanhada na net…
O que vemos é concretamente uma caixa de seringas: a dita cuja e as suas agulhas com que se infiltravam os medicamentos. No recipiente maior eram colocadas a seringa e a respectiva agulha aconselhada para a injecção; ali se vertia um pouco de álcool e se lançava o fogo para as desinfectar. Extinto o fogo e desinfectadas as ditas, a agulha era aplicada na extremidade da seringa, aspirado o liquido do medicamento e infiltrado no doente, quase sempre numa nádega.
Meu pai “deu” seguramente muitos milhares de injecções a residentes na freguesia e lembro-me especialmente de um senhor de nome José Ferreira, marido de dona Maria Augusta, ambos já falecidos há muito e pais dos meus amigos (Fernando, Diamantino, Álvaro, etc.) ainda hoje felizmente vivos e gozando de boa saúde. O seu pai José Ferreira sofria e sofreu durante vários anos de tuberculose e as injecções eram obrigatórias para combater a contaminação de que sofria. Uma vida de sofrimento a dele e uma verdadeira militância de meu pai, neste e em muitos outros casos idênticos e até piores com doentes graves e em fase terminal de vida, de que bem guardo memória.
Vidas passadas de outro Chouto passado…
Alonguei-me – o habitual… - mas pode ser que alguém aprecie estas velharias…
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