“É inaceitável, é inadmissível, já não em termos democráticos, mas em termos de sociedade, em termos de humanização, que haja cidadãos, sobretudo crianças, que não tenham direito àquilo que é fundamental”, nomeadamente o direito à alimentação, disse o antigo presidente da República Ramalho Eanes, à margem das comemorações do 37.º aniversário do 25 de novembro de 1975.”
Retirei da imprensa
estas acertadas palavras de quem tem toda a autoridade para as proferir e de
quem sempre se nos apresenta como uma reserva moral e séria do que deveriam ser
os políticos e os dirigentes que ao longo dos tempos dirigiram ou dirigem Portugal.
Ramalho Eanes tornou-se
conhecido dos portugueses aquando dos acontecimentos de 25 de Novembro de 1975,
data em que acabou a ”bagunça” então reinante nas forças armadas (chegou a
realizar-se “juramento de bandeira” de punho erguido…) e tudo voltou para os
quartéis de onde nunca deveriam ter saído para as tropelias que então se
verificavam. Sei que as hostes comunistas e esquerdistas mais radicais, que
então ambicionavam tomar o poder e bem estiveram perto disso, não estarão de
acordo com isto, no que estão do seu direito mas, essa será outra discussão…
Para colocar as forças
armadas e o país nos carris Eanes precisou politicamente do forte apoio do
então chamado “Grupo dos Nove”, com o falecido major Melo Antunes à cabeça e
necessitou ainda e logicamente da força, bem ordenada e potente dos Comandos da
Amadora, cujo Regimento era superiormente comandado pelo Coronel Jaime Neves,
homem de “barba rija” que vergou as forças mais renitentes e que assim muito
contribuiu para o êxito da missão. (Na foto vemos, numa cerimónia da época, o General Ramalho Eanes, o Coronel Jaime Neves e o então Capitão Vasco Lourenço, que também fazia parte do "Grupo dos Nove")
Por mero acaso vivi mais
ou menos de perto esses dias já que Jaime Neves era então meu vizinho e moravamos
no mesmo prédio, ali não muito longe do quartel e, por várias ocasiões fomos
companheiros de elevador, sobressaindo as vezes, naqueles dias quentes em que,
armado de metralhadora com um homem da sua escolta, igualmente de metralhadora
e camuflado, desciam para tomarem o jipe com militares armados que o aguardava
na rua. Eu descia também para ir para o emprego e ainda guardo na memória a 1ª
vez que entrei no elevador no meu piso e deparei com aquela cena de dois
militares de metralhadora ao ombro ali num prédio de civis. Na ocasião
desconhecia que o coronel Jaime Neves ali morava e dá para imaginar o susto que
apanhei quando o vi assim pela 1ª vez no elevador…Depois tornou-se vulgar, como
é obvio.
Com uma força muito bem
preparada e fortemente disciplinada Jaime Neves foi sem dúvida figura muito
importante no êxito do movimento militar que fez voltar a ordem e a disciplina
ao país!
Com o General Ramalho
Eanes só estive uma vez pessoalmente e guardo dele a memória do seu ar austero –
dele se dizia que não ria… - a sua fisionomia sisuda e fechada, não só por lhe
ser habitual mas também pelas circunstâncias do momento que vivíamos.
Tratava-se do velório do corpo do escritor e poeta Miguel Torga, em Coimbra.
Sendo um dos escritores cuja vida e obra mais admiro, forçoso era que, sabendo
da sua morte em Janeiro de 1995 ali me deslocasse para uma derradeira
homenagem. Torga era apoiante e admirador de Eanes e este também apreciava
muito o escritor e lógico seria que igualmente gostasse de o homenagear na sua derradeira
viajem. Foi assim, junto ao corpo do homem que ambos admirávamos, que conheci
pessoalmente Ramalho Eanes.
Foi num local insólito como
é evidente mas, para mim, também não deixou de ser gratificante por se tratar
de uma figura cujo comportamento apreciava e que, com o tempo até hoje
decorrido, mais tenho admirado e respeitado e disso já aqui dei conta algumas
vezes!
Tivesse Portugal muitos
homens honrados e sérios como Ramalho Eanes e teríamos forçosamente outro país,
outra terra e outra gente!
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